Por FREI ALOÍSIO FRAGOSO
Nossa reflexão hoje coincide com a décima
segunda estação da Via Sacra: "JESUS MORRE NA CRUZ".
Faz algum tempo, tive oportunidade de
conhecer uma Via-Sacra de grande beleza artística e admirável originalidade.
Cada uma de suas 15 estações me impressionou e me convidou a ficar ali,
contemplando uma por uma, horas seguidas. No entanto, uma delas me chamou a
atenção especialmente; foi a décima segunda. Nela o braço levantado e o rosto
sereno do Cristo Crucificado irradiavam dor e paz, sofrimento e ternura. Jesus
sorria na direção de uma criancinha, recém nascida, assentada em um dos braços
da Cruz e chorando desconsoladamente. Era uma cena carregada de contradição:
quem morre está sorrindo, quem nasce está chorando.Na verdade, ali estava bem
representado o grande Mistério da Redenção. Na morte de Jesus já está contida a
ressurreição (e Ele sorri), enquanto a vida nova da criancinha já está dando o
primeiro passo na direção da morte (e ela chora). E ali, na Cruz, os dois
mistérios se encontram e se unificam em um só: o AMOR. Deste amor brota a Vida,
seja do útero da mãe, seja do túmulo sepulcral.
Este Mistério também nos faz compreender
uma das verdades fundamentais da nossa Fé. Somos pecadores, sim, mas pecadores
agraciados, redimidos, amados. "Cristo se manifestou uma vez por todas,
abolindo o pecado pelo sacrifício de si mesmo" Heb. 9, 26. Isso não quer
dizer que foi necessário o sangue de Jesus para que o Pai nos perdoasse, como
se houvesse uma troca de sangue por perdão, perdão por sangue. Se assim fosse,
seríamos pecadores neuróticos, deprimidos, "matamos um Deus".
O que aconteceu foi uma prova suprema de
fidelidade. Jesus foi fiel à sua missão,
à vontade do Pai, até às últimas
consequências, e isso provocou a sua morte, pois aos olhos dos seus
adversários, ou morria Ele ou perecia a
nação inteira ("é preciso que Ele morra para que não pereça toda a
nação" Jo.11, 50.
Portanto, os sofrimentos de Jesus devem ser
entendidos com a prova máxima do Amor.
Como não ver estes antigos acontecimentos
reproduzidos nos dias de hoje! Como não enxergar a figura dos antigos doutores
da lei, com o seu argumento de que "um só tem que ser
sacrificado..." perpetuando-se em
certos grupos das elites sociais, que foram às ruas, em seus veículos blindados
e carregando símbolos patrióticos! Eles fizeram um strip-tease ideológico. O
Capitalismo ficou nu e mostrou suas ocultas intenções: exigir dos governos o
direito de continuar explorando a massa dos trabalhadores. Milhões morrerão?
Tudo bem, isso está previsto dentro das regras do jogo capitalista. Há um
exército de outros esperando na fila para substituí-los. Não é o Brasil que não
pode parar, mas sim esta máquina de moer gente, chamada Capitalismo, onde são
produzidos os excedentes para engordar os depósitos bancários dos patrões na
Suíça ou seja onde for.
No entanto, hoje é Sexta-Feira Santa, dia
da Cruz e do Crucificado. Não vale para todos a súplica de Jesus: "Pai,
perdoai, eles não sabem o que fazem"? Certamente. Ninguém deve ser
excluído do perdão. Mas há uma diferença entre perdoar e desculpar. Jesus nunca
retirou a culpa do pecador, nem deixou de condicionar o perdão à penitência
("Não tornes a pecar"). Estes grupos mencionados sabem bem o que
estão fazendo e porque estão fazendo. O
perdão será inútil se não gerar neles o arrependimento e a conversão. Com
certeza esta mudança estrutural faz parte do sonho dos que dizem: "o mundo
nunca mais será o mesmo".
Que o sangue de Jesus, jorrando com o
sangue de todos os mártires da Justiça e do Amor e o sangue das vítimas do
coronavirus, chegue a Deus, com a nossa dolorosa súplica: "Ó Pai do Céu,
vinde em nosso socorro!". Amém.
FREI ALOÍSIO FRAGOSO é frade
franciscano, coordenador da Tenda da Fé e escritor.
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