por Marcelo Barros
Para muita gente, a divisão entre as Igrejas cristãs e os
conflitos entre as religiões são assuntos internos do clero e não dizem
respeito ao mundo. No entanto, há alguns anos, Le Monde des Réligions,
revista francesa, publicou que no mundo atual existem 36 guerras ou conflitos
de caráter internacional ou de maior repercussão. Desses, mais de dois terços
têm como motivo principal, ou pretexto, fatores religiosos. Judeus contra muçulmanos
(palestinos) em Israel, hindus contra muçulmanos no sul da Índia, muçulmanos
contra cristãos em algumas regiões do Egito e mesmo protestantes contra
católicos na Irlanda do Norte, muçulmanos e cristãos ortodoxos na antiga
Tchecoslováquia.
Mesmo em países como
o Brasil, onde não existem guerras e conflitos abertos entre religiões,
diariamente, em alguma parte do Brasil, há notícias de discriminação e
violências da parte de cristãos fundamentalistas contra pessoas ou grupos das
religiões afrodescendentes. E esses atos de ódio e intolerância são cometidos
em nome de Jesus que nunca discriminou ninguém e, ao contrário, elogiou a fé de
uma mulher da religião cananeia, de um oficial romano e tomou um samaritano
(herege) como modelo para uma de suas principais parábolas.
Essa realidade de conflitos interculturais e
inter-religiosos confirma o que dizia o
teólogo Hans Kung: “O mundo não terá paz se as religiões não se entenderem e,
por motivos históricos e culturais, o diálogo entre as religiões não ocorrerá, se
as Igrejas cristãs não se unirem”. Por isso, o movimento pela unidade das
Igrejas e pelo diálogo e cooperação das religiões a serviço da paz e da justiça
diz respeito a todas as pessoas de boa vontade que querem um mundo mais justo e
fraterno.
Como está organizado no mundo, o movimento pela unidade dos
cristãos tem pouco mais de cem anos. Como os cristãos acreditam que a unidade é
um dom divino, a primeira ação para se viver o diálogo e a unidade é a oração.
Por isso, uma das iniciativas mais importantes da pastoral ecumênica é a
“Semana de oração pela Unidade dos Cristãos”. No Brasil, ela é celebrada sempre
em preparação à festa de Pentecostes. Neste ano, ela ocorre nesta semana, de 02
a 08 de junho. É preparada e coordenada pelo Conselho Nacional de Igrejas
Cristãs (CONIC), com o apoio da conferência dos bispos católicos (CNBB). Nesse
ano, os subsídios preparatórios para as celebrações e cultos ecumênicos foram
preparados por cristãos de várias Igrejas do Canadá. Eles têm como tema a
palavra provocatória do apóstolo Paulo na carta aos coríntios: “Estará o Cristo
dividido?” (1 Cor 1, 1- 13).
De fato, a Bíblia ensina que todos os discípulos/as de Jesus
formam o Corpo de Cristo do qual Jesus é a cabeça e todos os cristãos formam o
corpo. Assim sendo, ao se dividirem, as Igrejas dão um testemunho de que o
próprio Cristo, embora não esteja, parece ao mundo como dividido.
Há 50 anos, na Igreja Católica, o Concílio Vaticano II
promulgava o Decreto sobre a unidade dos cristãos. Esse documento começava
dando os principais motivos pelos quais todo cristão tem de considerar
prioritário e essencial o esforço para a unidade visível das Igrejas:
1o – a divisão é contrária à vontade de Deus.
2o - é um escândalo para o mundo (os cristãos
pregarem o amor e eles mesmos serem divididos).
3o – Por isso mesmo, a
divisão é um obstáculo para a missão. (Jesus orou ao Pai: “Faze que todos os
meus discípulos sejam Um para que o mundo creia!”(Jo 17, 19 – 21).
No século III, Cipriano, pastor da
Igreja de Cartago, ensinava: “A unidade abole a divisão, mas respeita as
diferenças”. A unidade dos cristãos não visa a uniformidade de uma só
instituição eclesiástica, mas a diversidade reconciliada de Igrejas irmãs, como
um ensaio de um mundo de diálogo e de paz. São Paulo
escreveu aos efésios: “Há um só Senhor, uma só fé, um mesmo e único batismo (em
todas as Igrejas). Nós cristãos, somos todos chamados a uma única esperança”
(Ef 4, 1- 4).
Marcelo
Barros, monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e
assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades
eclesiais de base e de movimentos populares. É coordenador latino-americano da
ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45
livros publicados no Brasil e em outros países.
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