Prof. Martinho Condini
O cantor, compositor, instrumentista e poeta Dorival Caymmi (1914-2008) certa vez contou em uma de suas belas músicas que “a Bahia tem trezentas e sessenta e cinco igrejas, e que na primeira ele foi batizado, na segunda crismado e na terceira ele se casaria com a mulher que ele quer bem”. Com essa letra ele faz alusão de que é possível a cada dia do ano entrar em uma igreja diferente na Bahia. Ele estava certo, mas há um detalhe, apenas na cidade de Salvador há trezentas e setenta e duas igrejas.
Esses números demonstram a relação das famílias pertencentes à elite colonial baiana com a coroa portuguesa e o cristianismo católico.
O motivo da lembrança desse número de igrejas em Salvador me ocorreu porque dia desses, passando pelos canais das emissoras de TV conectadas na minha televisão, constatei a existência de aproximadamente dezesseis programas religiosos. Todos transmitidos num mesmo horário. É difícil acreditar que haja algum outro lugar nesse mundo que ocorra um despropósito semelhante.
Em sua maioria esses programas fazem apologia a “teologia da prosperidade” e a “auto-ajuda”, sempre de uma maneira apelativa e piegas.
Os religiosos que apresentam os programas, em algum momento, relacionam o nome de Deus com a agência e conta bancária da igreja, e é claro, descaradamente pedem aos fiéis que realizem as suas doações. Dessa maneira alcançarão suas graças, garantirão seu pedacinho no paraíso e atingirão a prosperidade material que tanto almejam nesse mundo tão desigual do “capetalismo”.
Será que há tantas igrejas falando coisas tão diferentes e importantes, para que tenhamos tantos programas religiosos assim? Ou é uma maneira de algumas pessoas acumularem riqueza sem trabalhar? E aproveitar-se da boa fé dos fiéis?
O que é preciso para abrir uma igreja no Brasil? Pelo que me consta, é necessário uma pessoa que receba o comissionamento e autorização de Deus, um espaço físico, algumas cadeiras de plástico ou bancos de madeira, pessoas dispostas a ouvi-la, um CNPJ e um estatuto. Pronto! A empresa da fé e do lucro fácil está montada.
Acredito que há uma analogia entre a abertura dessas igrejas com a criação de alguns partidos políticos em nosso país. No Brasil são aproximadamente trinta partidos. Para serem abertos precisam cumprir algumas regras estabelecidas pela justiça eleitoral, que agora não vêm ao caso. A questão principal é: será que temos tantas ideologias assim a serem propagadas e defendidas? Ou o interesse está apenas no fundo partidário? Outra maneira de acumular riqueza sem trabalhar.
Me parece que abrir igrejas e criar partidos políticos de aluguel no Brasil pode se tornar um bom negócio.
Aí está, igrejas e partidos políticos, uma interessada no dízimo e o outro almejando o fundo partidário e apoio a qualquer liderança que esteja no poder para conceder cargos a esses partidos nanicos e às vezes não tão nanicos assim.
Quero deixar bem claro que essa constatação não significa a minha defesa da extinção das igrejas e muito menos das representações partidárias, congresso nacional e a tão valiosa democracia. Mas sim, a extinção de igrejas que possuem “lideranças religiosas” que são na verdade “picaretas da fé” e o impedimento da criação de partidecos politiqueiros liderados por “coronéis” sem nenhum comprometimento ideológico.
Acredito que devemos estar atentos sim, aos embusteiros líderes dessas igrejas e aos lacaios fundadores de partidos de aluguel. Ambos, embusteiros e lacaios, são prejudiciais e nocivos a nossa sociedade. A história está nos provando isso! E como já dizia o poeta: “a história é um carro alegre, cheio de um povo contente, que atropela indiferente todo aquele que a negue”.
As igrejas e os partidos políticos tornam-se o ópio da sociedade a partir do momento em que as pessoas se deixam levar por instituições inescrupulosas.
É preciso refletir dialeticamente sobre o que ouvimos, e perceber de verdade o que está por detrás das mensagens. As sociedades se organizam e se movimentam por meio das ideologias e da política, isso é inexorável. Por isso, o momento exige cautela, reflexão, diálogo e ação para sairmos dessa condição abjeta da nossa história. “Ninguém solta a mão de ninguém”, para que construamos um Brasil para todos.
* O Prof. Martinho Condini é historiador, mestre em Ciências da Religião e doutor em Educação. Pesquisador da vida e obra de Dom Helder Camara e Paulo Freire. Publicou pela Paulus Editora os livros 'Dom Helder Camara um modelo de esperança', 'Helder Camara, um nordestino cidadão do mundo', 'Fundamentos para uma Educação Libertadora: Dom Helder Camara e Paulo Freire' e o DVD ' Educar como Prática da Liberdade: Dom Helder Camara e Paulo Freire. Pela Pablo Editorial publicou o livro 'Monsenhor Helder Camara um ejemplo de esperanza'. Contato profcondini@gmail.com
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sábado, 31 de julho de 2021
IGREJAS E PARTIDOS
sexta-feira, 30 de julho de 2021
O PIOR ESTÁ AINDA POR CHEGAR
Leonardo Boff
As grandes enchentes ocorridas na Alemanha e na
Bélgica em julho. mês do verão europeu, causando centenas de vítimas,
associadas a um aquecimento abrupto que chegou em alguns lugares a mais de 50
graus, nos obriga a pensar e a tomar decisões em vista do equilíbrio da Terra.
Alguns analistas chegaram a dizer: a Terra não se aqueceu; ela se tornou, em
alguns lugares, uma fornalha.
Isso significa que dezenas de organismos vivos não
conseguem se adaptar e acabam morrendo. Atualmente com o atual aquecimento que
no último século cresceu em mais de um grau Celsius, e se chegar, como
previsto, a dois graus cerca de um milhão de espécies vivas estarão à borda de
seu desaparecimento depois de milhões de anos vivendo neste planeta.
Entendemos a resignação e o ceticismo de muitos
meteórologos e cosmólogos que afirmam termos chegado tarde demais no combate ao
aquecimento global. Não estamos indo ao encontro dele. Estamos gravemente
dentro dele. Argumentam, desolados, temos pouco que fazer, pois o dióxido de
carbono já está excessivamente acumulado, pois, permanece na atmosfera entre
100 a 120 anos, agravado pelo metano,20 vezes mais tóxico, embora fique por pouco
tempo no ar. Por surpresa geral, ele irrompeu, devido ao degelo das
calotas polares e do parmafrost que vai do Canadá e atravessa toda a Sibéria.E
fez crescer o aquecimento global.
A intrusão do Covid-19, por ser planetário. nos
obriga a pensar e a agir de modo diferente. É notório que a pandemia é
consequência do antropoceno, quer dizer, do excessivo avanço agressivo do
sistema imperante, baseado no lucro ilimitado. Ele ultrapassou os limites
suportáveis pela Terra. Pelo desmatamento à la Ricardo Salles/Bolsonaro, pelo
cultivo de monoculturas e pela geral poluição do meio ambiente, chegou-se
a destruir o habitat dos vírus. Sem saber para onde ir, saltaram para outros
animais, imunes dos vírus e deles passaram a nós que não possuímos esta imunidade.
Vale pensar o que significa o fato de que o inteiro
planeta foi afetado, por um lado igualando a todos, e por outro aumentando as
desigualdades porque a grande maioria não consegue viver o isolamento social,
evitar as conglomerações, especialmente, no transporte coletivo e nas lojas.
Não afetou os demais seres vivos, nossos animais domésticos.
Devemos reconhecer: os visados fomos nós humanos. A
Mãe Terra,desde os anos 70 do século passado,. reconhecida como um organismo
vivo, Gaia, e pela ONU (no dia 22 de abril de 2009) aprovada verdadeiramente
como Mãe-Terra, nos enviou um sinal e uma advertência: “parem de agredir todos
os ecossistemas que me compõem; já não me concedem o tempo suficiente para
repor o que me tiram durante um ano e de me regenerar”.
Como o paradigma vigente considera a Terra ainda
como um mero meio de produção, num sentido utilitarista, não estão prestando
atenção a suas advertências. Ela, como super-orgnismo vivo, nos dá sinais
inequívocos, como agora,, com as grandes enchentes na Europa, o excessivo frio
no hemisfério sul e a gama de vírus já enviados (zica, ebola, chikungunya e
outros).
Como somos cabeças duras e vige uma clamorosa
ausência de consciência ecológica, podemos ir ao encontro de um caminho sem
retorno.
Curiosamente, como já foi comentado por outros, “os
profetas do neoliberalismo estão se transformando em promotores da economia
social porque concebem, diante da catástrofe atual, que já não será
possível fazer o mesmo que antes e que será necessário voltar aos imperativos
sociais”. O pior que nos poderia acontecer é voltar ao antes, cheio de
contradições perversas, inimigo da vida da natureza e indiferente ao destino
das grandes maioria pobres e se armando até os dentes com armas de destruição
em massa, absolutamente inúteis face aos vírus.
Temos que forçosamente mudar, superar os velhos
soberanismos que tornava os outros países até hostis ou submetidos à
feroz competição. O vírus mostrou que não contam para nada os limites das
nações. O que, realmente, conta é a solidariedade entre todos e o cuidado de
uns com os outros e para com a natureza, para que, preservada, não nos envie
vírus ainda piores. Agora é da nova era da Casa Comum dentro da qual estão as
nações.
David Quamen, o grande especialista em vírus,
deixou esta advertência: ou mudamos nossa relação para com a natureza sendo
respeitosos, sinergéticos e cuidadosos, caso contrário ela nos enviará outros
vírus, quem sabe um tão letal que nossas vacinas não poderão ataca-los e
levarão grande parte da humanidade.
Ao não determos o aquecimento global e ao não
mudarmos de paradigma para com a natureza, conheceremos dias piores. Se não
podemos mais deter o aumento do aquecimento global, com a ciência e a técnica
que possuímos, podemos pelo menos mitigar seus efeitos deletérios e salvar o
máximo da imensa biodiversidade do planeta.
Como nunca antes na história, o destino comum está
em nossas mãos: devemos escolher entre seguir a mesma rota que nos leva a um
abismo ou mudar forçosamente e garantir um futuro para todos, mais frugal, mais
solidário e mais cuidadoso para com a natureza e a Casa Comum.
Já há 30 anos repito esta lição e sinto-me um
profeta no deserto. Mas cumpro o meu dever que é de todos os que despertaram um
dia.Devemos falar e agora já gritar.
Leonardo Boff ecofilósofo e escreveu Habitar a Terra: a via para a fraternidade universal a
sair pela Vozes dentro de pouco; Covid-19, a Mãe Terra
contra-ataque a Humanidade, Vozes 2020.
quinta-feira, 29 de julho de 2021
IMPLICAÇÕES PSICOSSOCIAIS DA TEOLOGIA MORAL
Frei Betto
Nos últimos anos, a psicologia e as demais ciências que tratam da mente e do espírito humanos passaram a ter influência decisiva na noção de pecado. Podemos considerá‑lo como um ato livre e consciente, praticado por uma pessoa responsável, em ofensa a Deus e ao próximo. Ou mesmo à natureza.A concepção de pecado atrelada a uma visão individualista, aliada a um moralismo desencarnado e a uma casuística policialesca, foi objeto da mais severa repulsa de Jesus. Os escribas e fariseus pagavam religiosamente os impostos previstos. Não tocavam nos objetos considerados impuros. Prescreviam a pena de morte para a mulher adúltera. No entanto, transgrediam os pontos mais importantes da lei: a justiça, a misericórdia e a fidelidade (Mateus 23, 23).Por sua atitude amorosa, Jesus desafiava todos os falsos moralismos. Para os judeus, a mulher era um ser inferior ao homem, os samaritanos eram tidos como hereges e as prostitutas, apedrejadas em público. Mas, à beira do poço de Jacó, Jesus se abriu em longa conversa com uma mulher samaritana que já havia vivido com cinco maridos! (João 4, 1‑42).Na tentativa de fugir a essa casuística que, por tanto tempo, perturbou mentes delicadas e escrupulosas, os tratados de moral passaram a abordar a questão do pecado segundo a concepção conhecida por "ética de situação". Os atos da pessoa deixam de ser tomados isoladamente. Considera‑se agora o contexto em que ela vive, sua história pessoal, os fatores que a induziram a fazer isto ou aquilo, as consequências para si e para os outros. Um mesmo ato pode ser praticado por diferentes pessoas sem que, necessariamente, tenha o mesmo peso moral. Não se parte do ato em si, como se objetivamente ele fosse "bom" ou "mau", mas da situação concreta em que a pessoa foi levada a praticá‑lo.Nos últimos anos, a psicologia e as demais ciências que tratam da mente e do espírito humanos passaram a ter influência decisiva na noção de pecado. Podemos considerá‑lo como um ato livre e consciente, praticado por uma pessoa responsável, em ofensa a Deus e ao próximo. Ou mesmo à natureza.Mas, quem é essa pessoa? A liberdade não é algo que a pessoa conquista ao completar 7, 14 ou 21 anos. Nenhuma idade, nem a da razão, determina o momento a partir do qual a pessoa se torna um ser plenamente responsável por todos os seus atos. A vida é um aprendizado de liberdade. É sempre inacabado, pois a pessoa vive também presa aos mecanismos de seu inconsciente, aos fatores biogenéticos de seu desenvolvimento, aos determinismos fisiológicos, psicológicos e sociais, dos quais nem tem consciência, porém moldam a sua maneira de pensar e viver.As ciências que têm por objeto a psique humana vieram em socorro da teologia moral apontar, lá no fundo do nosso inconsciente, a complexidade do ser humano. Essa complexidade não pode, contudo, ser justificada, em última instância, por fatores meramente psicológicos.Experiências realizadas em hospitais psiquiátricos revelam que muitos desequilíbrios biopsíquicos têm sua origem nos desequilíbrios da própria ordem social. Quando um sistema social determina a discriminação entre os seus membros, fundada no antagonismo entre as classes, cria‑se um consenso ‑ para o qual não faltam "bases científicas" ‑ de que certos elementos são irremediavelmente desajustados e irrecuperáveis: os criminosos, os psicopatas, os homossexuais, os esquizofrênicos, as prostitutas, os neuróticos, os agressivos, os depressivos, enfim, todo o conjunto de "loucos" condenados a viver marginalizados e desprezados.Isso ocorre em menor escala, mas na mesma proporção discriminatória, entre os membros de uma família ou de um grupo específico que avaliam o comportamento de seus integrantes segundo o modelo ideologicamente padronizado adotado. Qualquer um que não se enquadre nesse modelo corre o risco de ser obrigado a suportá‑lo ao preço de graves conflitos internos e de tornar‑se suspeito de, no mínimo, estar doente. Assim, será convidado a submeter‑se a um tratamento para curar‑se de seus "desequilíbrios" e de suas "neuroses", a fim de readaptar‑se ao modelo que dita as regras de convívio e relacionamento entre os demais.Mas para Jesus essa gente “diferente” são os filhos e filhas preferidos de Deus. E devem ser amados assim como são amados por Deus.Frei Betto é escritor, autor do romance policial “Por uma educação crítica e participativa” (Rocco), entre outros livros. Livraria virtual:freibetto.org
Frei Betto é autor de 69 livros, editados no Brasil e no exterior. Você poderá adquiri-los com desconto na Livraria Virtual – www.freibetto.org Ali os encontrará a preços mais baratos e os receberá em casa pelo correio.
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terça-feira, 27 de julho de 2021
CUBA SOB ATAQUE DA GUERRA HÍBRIDA
Marcelo Barros
A primeira coisa de Cuba que qualquer visitante que
chega ao país pelo aeroporto José Martí de Havana pode ver é um imenso cartaz,
no qual está escrito: “Benvindos a Cuba,
primeiro território livre das Américas”.
De fato, antes da pandemia, milhões de visitantes e
turistas passavam por Cuba para aproveitar a beleza da natureza, o calor das
águas do Caribe e, principalmente, o encanto de um povo que, para nós, lembra
em muitos aspectos a simpatia do povo baiano.
Quem visita o país se delicia com o jeito de ser
cubano. Percebe o o nível de vida extremamente sóbrio e até pobre das pessoas.
No entanto, ninguém encontra uma só criança de rua. Verifica a eficiência do
atendimento de saúde gratuito e de alta qualidade, assim como o acesso à
educação gratuita em todos os níveis; o que faz dos cubanos um dos povos mais
cultos do mundo.
Isso não significa que o país seja um paraíso e não
tenha problemas ou que o governo não tenha deficiências. São frequentes
críticas à burocracia das instituições. Escritores e artistas sempre exigem
maior liberdade de criação. Em tempos mais recentes, ao menos em parte, essas
questões parecem mais superadas. Quem lê os romances do brilhante escritor
Leonardo Padura e segue as aventuras do detetive Mario Conde, vê uma descrição ácida
e crítica do funcionamento das instituições no país. E Padura não parece ter
nenhum contratempo por criticar as estruturas do seu país.
A liberdade coletiva e a qualidade de vida dos cubanos
têm preço pesado: o mais poderoso império do mundo não se conforma em, durante
mais de sessenta anos, ser vencido pelo heroísmo de um povo pequeno e pobre.
Desde 1960, sucessivos governos dos Estados Unidos
fizeram tudo para impedir o povo cubano manter o governo que melhor lhe convém.
No início dos anos 1960, a invasão militar fracassou. O bloqueio econômico
assassino, imposto por Washington e diversas vezes condenado pela ONU, dura
mais de 60 anos. No entanto, não fez o povo se render. Desde o começo da
pandemia, o bloqueio não permite que remédios básicos para a população desembarquem
em Cuba e na Venezuela. Apesar disso, Cuba desenvolveu vacinas e não só tem
cuidado do seu povo, como faz missões de solidariedade por todo o mundo.
Nesse momento, a chamada Guerra Híbrida torna tudo
mais fácil para os inimigos da humanidade. Pagam-se mercenários cubanos para
provocar agitações e se garante a imprensa para noticiar o levante popular.
No domingo, 11 de julho, houve um primeiro ensaio. E
propagou-se saldo de pessoas mortas, feridas e, quem sabe, desaparecidas. As
manifestações foram todas combinadas para explodirem na mesma hora em diversas
cidades. Não conseguiram nenhuma fotografia de pessoas sendo espancadas por
soldados. Ninguém apareceu com rosto sangrando. O presidente da República se
locomoveu pelo país em diálogos diretos com os grupos manifestantes. Reconheceu
a precariedade dos serviços elétricos que penaliza a todos. Falou das
dificuldades econômicas pelas quais passa o país, sem o turismo que tinha antes
da pandemia e sob o peso feroz do bloqueio internacional que tenta
permanentemente estrangular a economia.
Como em todos os anos, neste 26 de julho, o povo
cubano recorda o ataque do jovem Fidel Castro e seus companheiros ao quartel de
Moncada, em 1953; fato que deu início à revolução libertadora.
Hoje, para toda a América Latina, a resistência de
Cuba é mais heroica e cada dia mais importante. Atualmente o império é mais
mortífero e bárbaro do que todos os quarteis de Moncada que a cada dia se
recriam.
Para as
pessoas que unem sua fé à vida e ao projeto de um mundo mais justo, a
solidariedade ao povo cubano, ao povo venezuelano e a todos os povos do mundo
sob ataque do império é questão de espiritualidade e caminho de fé.
Marcelo Barros, monge beneditino e escritor, autor de 57 livros dos quais o mais recente é "Teologias da Libertação para os nossos dias", Ed. Vozes, 2019. Email: irmarcelobarros@uol.com.br
domingo, 25 de julho de 2021
Pe JOSÉ OSCAR BEOZZO: CINCO PÃES E DOIS PEIXES
Nesse 17º Domingo do Tempo Comum, o evangelho lido nas comunidades católicas é João 6, 1 a 15, onde Jesus partilha os cinco pães e os dois peixes oferecidos por um menino.
Vamos ouvir o que Pe. José Oscar Beozzo tem a nos dizer sobre esse belíssimo trecho do evangelho de João?
MULHER NEGRA DE ONDE VEM?
Shirley Pinheiro
Vem das lutas pela
igualdade,
das guerrilhas pela paridade.
Das lágrimas contidas em busca de preservar sua vida.
Vem das fábricas, vem das
lavouras, dos balcões, vem das escolas, das Universidades também.
Vem desbravando
preconceito,
nunca teve outro jeito!
Não é teu
cabelo que te define,
Muito menos a cor escura
da pele.
É tua alma sonhadora,
Ferrenha lutadora.
Buscando com unhas,
dentes e garras,
O espaço que lhe
é de direito.
Direito sim ,porque não!
Afinal antes de ser
negra.
Você e eu
,somos seres humanos.
Criado do mesmo barro e
pelo mesmo Criador.
Viemos a este espaço terrestre,
Pra ser feliz e,não sentir dor.
No entanto vivemos na
guerra insana e desumana,
Criado por aqueles que se acham senhor.
A luta será continua,
não nos deixaremos ser vitimas,
Nem permitiremos ter a vida ceifada.
Pois além de sermos mulher,
e ter a pele negra, carregamos
nas nossas entranhas, a herança das nossas ancestrais.
As negras, que nunca se
deixaram morrer,
Lutaram para continuar a
viver.
Através de nós
através de você.
Mulher negra!
Shirley Pinheiro 25/07/2019
Em homenagem a
Mulher Negra e Caribenha através de Tereza de Benguela.
*Arte Lana Furtado
sábado, 24 de julho de 2021
PLIM-PLIM: O GAY E O HOMOFÓBICO
Prof. Martinho Condini
O governador do Rio Grande do Sul, o senhor Eduardo Leite, “saiu do armário” ao assumir a sua homossexualidade (apesar de todo o Brasil, Uruguai e Argentina já saberem) no país que mais assassinatos cometem no mundo à comunidade LGBTTI (lésbicas, gays, bissexuais, transsexuais, travestis, trangêneros e intersexuais) e onde o mandatário maior da nação já se declarou HOMOFÓBICO.
O senhor Eduardo Leite estratégica e maquiavelicamente preparou essa declaração e a deu em um programa de rede nacional “Conversa com Bial”. O senhor Eduardo Leite e a “Plim-Plim”, acreditam que a sociedade brasileira seja idiota?
Nós não nos esquecemos que em 2018, mais precisamente no segundo turno das eleições presidenciais o senhor Eduardo Leite apoiou e continua apoiando o candidato: misógino, sexista, negacionista, miliciano e genocida, hoje presidente.
O senhor Eduardo Leite, governante de direita, apóia a agenda ultra neoliberal do ministro da economia e exerce papel de “capacho” desse presidente sevandija, que tem como baluartes a TORTURA e a HOMOFOBIA.
Senhor Eduardo Leite, me lembrei da história do lobo e o cordeiro. Com quais das peles o senhor estará vestido?
A agenda identitária do seu governo, senhor Eduardo Leite até agora foi assumir a sua homossexualidade a um ano das prévias eleitorais para presidente. Faça-me um favor? Será que o senhor está duvidando da capacidade intelectual das comunidades LGBTTI? A quem o senhor quer convencer da sua “boa fé”?
Senhor Eduardo Leite sua postura libertária diante da escolha sexual é legítima, mas a sua postura ética e moral em relação à classe em que está inserido é deplorável, repugnante e inaceitável.
Por outro lado, a “Plim-Plim” e demais grandes empresas de comunicação de massa que se deram muito mal em apoiar a política ultra neoliberal desse governo, começam uma incessante busca de um candidato a presidência para “chamar de seu”. Querem uma terceira força, de preferência do campo de centro direita. Para eles a questão de gênero ou etnia não importa desde que essa terceira força defenda os seus interesses está tudo certo, tanto é que apoiaram quem apoiaram.
Não admitem a vitória de um governante de centro esquerda e muito menos de esquerda.
Eles querem urgentemente encontrar alguém que derrote Lula!
Poder ser Datena, Luciano Huck, Ratinho...ou qualquer outra coisa que possa surgir.
Diante deste contexto, o que nos resta é lutar para restabelecer um Estado de direito laico democrático que nos garanta não só a liberdade de expressão, mas a dignidade de vivermos em um país que volte a valorizar a educação, a ciência, a arte e a cultura.
Só assim voltaremos a ser um país soberano.
Por isso, em 2022 precisamos eleger sim, um presidente do campo progressista, democrático e popular que conheça as necessidades do povo brasileiro. E tenha como prioridade uma agenda desenvolvimentista a fim de acabar com a brutal desigualdade social, fruto da histórica e estruturante supremacia branca, capitalista, judaico-cristã e racista que predomina em nosso país há mais de quinhentos anos. É preciso dar um basta nessa injusta co-relação de forças.
Não é possível continuarmos vivendo em um país em que o lucro se sobreponha a melhoria nas condições de vida do nosso povo. Enquanto não tivermos a maioria da população vivendo em condições dignas no que tange a moradia, educação, saúde, trabalho e laser, corremos o risco de reeleger o presidente desse desgoverno que tem como símbolo o “gesto de arminha com as mãos”, a cloroquina e o mais de meio milhão de mortos causados pela pandemia e como bordão a frase “Brasil acima de tudo e Deus acima de todos”. O resultado esta aí!!!!!
* O Prof. Martinho Condini é historiador, mestre em Ciências da Religião e doutor em Educação. Pesquisador da vida e obra de Dom Helder Camara e Paulo Freire. Publicou pela Paulus Editora os livros 'Dom Helder Camara um modelo de esperança', 'Helder Camara, um nordestino cidadão do mundo', 'Fundamentos para uma Educação Libertadora: Dom Helder Camara e Paulo Freire' e o DVD ' Educar como Prática da Liberdade: Dom Helder Camara e Paulo Freire. Pela Pablo Editorial publicou o livro 'Monsenhor Helder Camara um ejemplo de esperanza'. Contato profcondini@gmail.com
quinta-feira, 22 de julho de 2021
DEMOCRACIA CULTURAL
Frei Betto
(...) A
queda dos governos dos países socialistas do Leste europeu assinala, não o fim
do socialismo, como propaga a mídia capitalista, mas sim da absolutização de
sistemas ideológicos.
O homem e
a mulher são os únicos seres vivos que se contrapõem à natureza. Os demais, das
abelhas arquitetas aos macacos africanos que protegem seus recursos de
sobrevivência, são todos determinados pela natureza. Esse distanciamento humano
frente ao mundo natural faz a realidade revestir-se de simbolismo e produz a
emergência transcendental do imaginário.
Do interesse pelo
fogo produzido pelo relâmpago nasce o conhecimento que desperta a consciência.
Voltada sobre si mesma, a consciência humana sabe que sabe, enquanto os animais
sabem, mas ignoram a reflexão. Através do símbolo e do significado, o ser
humano se relaciona com a natureza, consigo mesmo, com os semelhantes e com
Deus.
Nasce a
cultura, o toque humano que faz do natural, arte. A vida social ganha contornos
definidos e explicações categóricas. Do domínio das forças arbitrárias da
natureza chega-se às armas que permitem a imposição de um grupo cultural sobre
o outro. Porém, cultura é identidade e, portanto, resistência. Mesmo assim, a
absolutização de sistemas ideológicos oferece o paraíso, induzindo o dominado a
sentir-se excluído por não pensar pela cabeça alheia.
No Brasil colônia,
os métodos de catequese cristã introduziam entre os indígenas o vírus da
desagregação e, hoje, os donos dos garimpos, das madeireiras e o governo
perguntam perplexos por que os povos indígenas necessitam de tanta terra se
nada produzem. Os neopentecostais atacam os umbandistas e certos setores da
Igreja cristã olham com solene desprezo o candomblé, como se seus fiéis ainda
estivessem naquele estágio primitivo da consciência religiosa que não lhes
permite desfrutar a beleza do canto gregoriano ou a ortodoxia teológica dos
livros de Ratzinger.
A queda
dos governos dos países socialistas do Leste europeu assinala, não o fim do
socialismo, como propaga a mídia capitalista, mas sim da absolutização de
sistemas ideológicos. Desabam com a herança estalinista todas as estratégias de
hegemonização da cultura, e a própria ideia de "evolução cultural".
Não há culturas superiores, há culturas distintas, social e historicamente
complementares. Agonizam as versões totalizadoras em todos os terrenos da
produção de sentido - político, econômico e religioso.
Quem pretender
ignorar os sinais dos tempos terá de apelar ao autoritarismo para infundir
temor e terror. Sabemos agora que mesmo na América Latina não há uma cultura
única, mas uma multiplicidade de culturas - indígena, negra, branca, sincrética
- que se explicam por seus próprios fatores internos. Essa polissemia de
sistemas de sentido é uma riqueza, embora ameace o poder daqueles que
imaginavam restaurar a uniformização medieval.
A mais de
500 anos da chegada de Colombo às Américas - uma invasão genocida que alguns
chamam de "encontro de culturas" - convém relembrar esses conceitos
antropológicos. E agora a democracia impregna também a cultura. Cada homem e
mulher, grupo étnico ou racial, descobre que pode ser produtor do próprio
sentido de sua vida. O difícil é respeitar isso como valor, sobretudo nós,
cristãos, que ainda não sabemos distinguir Jesus Cristo do arcabouço judaico e
greco-romano que o reveste e tanto favorece o eurocentrismo eclesiástico.
Felizmente, o
próprio Jesus nos ensina a diferença entre imposição e revelação. Impõe-se
pervertendo a natureza do poder (Mateus 23, 1-12). Mas revelação
significa "tirar o véu": ser capaz de captar os fragmentos culturais
de cada povo e reconhecer as primícias evangélicas aí contidas, como afirmou o Concílio
Vaticano II.
Aliás,
Deus não fala latim. Prefere a linguagem do amor e da justiça. E esse dialeto
toda cultura incorpora e entende.
Frei Betto é escritor, autor de “Diário de Fernando
– nos cárceres da ditadura militar brasileira” (Rocco), entre outros livros.
Livraria virtual: freibetto.org
Frei
Betto é autor de 69 livros, editados no Brasil e no exterior. Você poderá
adquiri-los com desconto na Livraria Virtual – www.freibetto.org Ali
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quarta-feira, 21 de julho de 2021
33º CONGRESSO DA SOTER DEBATE SOBRE A RESPONSABILIDADE DAS RELIGIÕES NA DEFESA DA LAICIDADE, DEMOCRACIA E DIREITOS HUMANOS
*Matéria postada REVISTA IHU ON-LINE
A Sociedade de Teologia e Ciências da Religião
(SOTER) celebrou de 12 a 16 de julho seu 33º
Congresso Internacional, que teve como tema “Religião,
Laicidade e Democracia: cenários e perspectivas”. Com cerca de 800
pessoas inscritas, conferencistas nacionais e internacionais e mais de 440
apresentações acadêmicas, o congresso tem sido um momento importante na
reflexão sobre uma questão que cada vez cobra maior destaque na realidade
brasileira e mundial.
Segundo Cesar Kuzma,
presidente da SOTER, “tentamos trabalhar as urgências do
nosso tempo no âmbito social, no âmbito político-democrático, na
responsabilidade que toca às Igrejas cristãs e às religiões em geral da defesa
da laicidade, na defesa da democracia, na defesa dos direitos humanos,
apontando caminhos, apontando horizontes, apontando novas perspectivas”.
A reportagem é
de Luis Miguel Modino.
O congresso
partiu dos diferentes cenários em que a sociedade brasileira se encontra, agora
marcados também “pela pandemia, pela destruição do estado democrático de
direito, pela fragilidade nas nossas democracias, pela perda de direitos
sociais e também humanos, pelo desmonte das políticas públicas e pelo grande
desastre que vem ocorrendo também em nível ambiental”, segundo o presidente
da SOTER.
Dentro dessa
pluralidade de cenários, o 33º Congresso da SOTER foi um momento para
refletir, que partiu da abordagem de Pedro Ribeiro de Oliveira,
que buscou “apresentar-nos uma visão panorâmica no qual nós estamos inseridos”,
segundo Kuzma. A palestra de Boaventura de
Sousa Santos, que trabalhou a questão da laicidade e da democracia,
mostrou a diferença entre os diferentes espaços, valorizando “a importância da
Teologia da Libertação na América Latina, na luta histórica que ela teve na
defesa da própria democracia”, afirma Kuzma.
Na leitura sobre
os diferentes momentos, o teólogo fala sobre os aportes de Frei
Betto e Jucimeri Isolda Silveira,
destacando os direitos humanos, “que se tornam cada vez mais frágeis na atual
conjuntura social que nós vivemos”. Ele destaca a celebração que aconteceu
pelos 50 anos da Teologia da
Libertação, que considera um momento brilhante, afirmando
que a SOTER segue essa linha, e “tem na opção pelos
pobres o grande enfoque da sua proposta e de seus objetivos”, insistindo em que
“a linha libertadora faz parte da natureza da própria SOTER”,
algo que foi feito de forma coletiva. Com a presença de diferentes instituições
foi, segundo o presidente da SOTER, “um momento marcante,
brilhante, que emocionou a todos”.
A professora
italiana Serena Noceti abordou a questão da
responsabilidade das Igrejas cristãs na defesa do estado democrático, desde
elementos da Fratelli tutti e
o Conselho Mundial de Igrejas. Desde os aportes do Papa
Francisco, foi refletido sobre a economia, com a presença de Ladislau
Dowbor, e a ecologia, com a reflexão de Afonso Murad,
perspectivas que segundo Kuzma, “se somam à questão da
democracia, da laicidade, do direito, do bem comum, ou da Casa Comum, que é uma
expressão que acabou fazendo parte dos nossos discursos”.
O Congresso
da SOTER foi momento para reconhecer com o prêmio
João Batista Libânio, a trajetória da teóloga Ivone
Gebara, valorizando, segundo o presidente da SOTER “uma caminhada de
luta que não se faz sozinha, se faz de modo coletivo, se faz com outras
pessoas”. Seguindo o tema do congresso, Cesar Kuzma insiste
em que “dar o prêmio a Ivone, com a história que ela tem,
com a dinâmica de espiritualidade com a qual ela vive, e na ternura de sua voz
e pelo fato de ser mulher, isso foi algo muito emocionante e muito bonito”.
O congresso foi
encerrado na sexta-feira com a palestra de Ivone Guevara,
onde abordou a questão da responsabilidade das religiões no estado, para a
defesa da laicidade a da democracia. A teóloga colocou a importância de as religiões
caminhar em conjunto com a sociedade. Finalmente, Maria Isabel
Varanda e Rudolf von Sinner, apontaram
pistas, horizontes, fazendo uma releitura do evento e apontando possíveis
caminhos, “sem a intenção de nos oferecer, mas convidando a um caminhar
continuo, coletivo, em busca de novos horizontes, de novas perguntas, de novos
espaços”, segundo o professor Kuzma.
Segundo o
presidente da SOTER, “o congresso superou todas as expectativas”, inclusive em
número de participantes. Ele destaca que o fato de ser virtual permitiu o
acesso de pessoas de varias partes do Brasil, da América Latina e de outros
países. Mesmo virtualmente, “conseguimos espaços onde a afetividade, a ternura,
a humanidade, se fizesse presente”, afirmou Cesar Kuzma.
Teve momentos para homenagear as vítimas da Covid-19 e
a diretoria da SOTER emitiu uma nota por ocasião do Encerramento do 33º
Congresso.
A nota manifesta
“a nossa preocupação e o nosso repúdio em relação à deterioração da democracia
no Brasil, que se traduz não só no ataque contínuo às Instituições Democráticas
e ao Estado de Direito, mas também no aumento da repressão e da violência
policial, no aprofundamento da desigualdade social e da fome, na destruição
ambiental, na agressão aos povos indígenas, seus direitos e vidas, nos atos
sistemáticos de racismo que revelam a condição do racismo estrutural presente
em nossa sociedade, na afirmação do sexismo e no crescimento do feminicídio”.
Desde a SOTER é
denunciado que “o negacionismo foi e
é responsável por grande parte do número de mortos pela atual pandemia da
COVID-19, que já ceifou mais de 530 mil vidas no Brasil”. Ao mesmo tempo, a
nota insiste em que “este mesmo negacionismo agravou a crise econômica, levando
a um enorme contingente de pessoas desempregadas e ao aumento da fome e da
miséria”.
O texto condena
que “neste contexto, as Religiões, sobretudo certas expressões do Cristianismo,
nem sempre têm tido um papel profético, crítico e libertador”, denunciando que
“ao contrário, alguns grupos têm instrumentalizado a Religião, negado o caráter
laico do Estado e promovido, ou reforçado, a deterioração de nossa democracia
em nome de Deus, inclusive afirmando e praticando a intolerância religiosa”.
Por isso,
consideram urgente “reafirmar que as Religiões devem estar a serviço da vida e
não da morte”. Nesse sentido, a diretoria da SOTER destaca
que “o Cristianismo possui uma longa trajetória e, em nosso país, foi
fundamental, juntamente com outras Tradições Religiosas, na luta pelos direitos
humanos e pela redemocratização do Estado e da Sociedade”. Finalmente,
conclamam “todas as lideranças religiosas a se colocarem na defesa
incondicional da plena democracia, dos direitos humanos e da justiça social”.
*FONTE:http://www.ihu.unisinos.br/maisnoticias/noticias/78-noticias/611188-33-congresso-da-soter-debate-sobre-a-responsabilidade-das-religioes-na-defesa-da-laicidade-democracia-e-direitos-humanos
terça-feira, 20 de julho de 2021
FALAR EM NOME DA VIDA
Marcelo Barros
A vida é o que há de mais sagrado e está acima seja
dos interesses econômicos, seja mesmo dos preceitos religiosos.
Após quase um ano e meio da
Covid-19, já está evidente que Bolsonaro e seu governo colocaram a população
brasileira para se contaminar pelo coronavírus e fizeram isso de propósito,
cientes do risco à vida das pessoas. Durante meses e meses com o Brasil
mergulhado na pandemia, Bolsonaro boicotou a estratégia nacional de vacinação.
Apostou na infundada imunidade de rebanho por contágio. Nestes dias mais
recentes, ainda em meio a toda a tragédia desta pandemia, sem usar máscara, o presidente do Brasil passeia e promove “motociatas”
com seus apoiadores por algumas capitais do país.
A consciência da dignidade e
da igualdade de todos os seres humanos, assim como a compreensão de uma
cidadania universal é, de certa forma, recente. Para que tais conquistas possam
ter ocorrido, foi importante uma evolução da cultura. Hegel dizia que nós não
somos donos das nossas ideias. São as ideias que entram em nós e, então, têm um
poder transformador. A luta pelas ideias está na base das grandes lutas
emancipatórias da sociedade.
Uma das tragédias atuais é
ver que muitas vezes, as pautas mais retrógradas e claramente contrárias ao
interesse dos pobres chegam a ser apoiadas e defendidas até por parcelas mais
pobres da população. Ao se deixar orientar por meios de comunicação, controlados
pela elite, os pobres tendem a ser conservadores. Nos tempos antigos, as massas
defendiam a escravidão e o racismo. Hoje, muitos brasileiros apoiam governos
neofascistas. Revelam-se favoráveis à pena de morte, ao uso livre de armas de
fogo e à violência policial contra pobres e negros.
Esta realidade só mudará
quando a sociedade conseguir se organizar por grupos e comunidades que busquem
compreender com mais profundidade a realidade social. Movimentos sociais e
comunidades humanas de base são grupos que ajudam o povo a se tornar mais
consciente de ser povo como conjunto unido. No mundo romano antigo, o latim
fazia a distinção entre plebs (massa)
e populus (povo organizado). O
Concílio Vaticano II define que a Igreja é uma porção do povo de Deus (populus Dei) e não massa de fieis.
Infelizmente, na história,
muitas vezes, Igrejas e religiões foram contrárias aos grandes movimentos de
libertação e promoção humana. Nos séculos passados, muitos pastores e ministros
cristãos defenderam a monarquia contra a república. Consideravam a
superioridade masculina sobre as mulheres como vinda do próprio Deus. Eram contra
a igualdade de gêneros e contra a liberdade de expressão e de religião. Atualmente,
em todo o mundo, pastores e ministros ainda organizam cruzadas contra o direito
das pessoas à diversidade sexual. Acima de tudo, acham que religião deve estar
sempre ligada à direita política. Nos Estados Unidos, um presidente promove
golpes agitações sociais em outro país, mantém um bloqueio contra Cuba que já
dura mais de sessenta anos e decide o grau de tensão em países da Ásia. Se esse
presidente se pronunciar contra o aborto e contra a união gay contará com o
apoio explícito de muitos bispos, padres católicos e pastores evangélicos.
No Brasil, cristãos católicos
e evangélicos continuam dando apoio apoio político ao presidente da República,
em troca de benesses para as suas Igrejas. No evangelho, falou Jesus dos
escribas e fariseus: vestem roupas
religiosas, fazem longas orações, enquanto exploram as viúvas pobres (Mc 12,
39- 40). Hoje, esses doutores da
religião nem precisam explorar diretamente pobres e viúvas. Podem se
beneficiar de verbas que vêm diretamente da exploração dos pobres. Para eles,
mais vale uma boa reza do que a ética humana e social.
Precisamos com urgência
voltar ao evangelho de Jesus que afirmou: “O
sábado foi feito para o ser humano e não o ser humano para o sábado”. Mesmo
as leis mais sagradas devem servir à vida e à felicidade das pessoas. Ao
afirmar isso, Jesus enfrenta a tensão entre pessoa e sociedade. Claramente,
optou pelas pessoas. Revelou o amor divino aos pecadores públicos que eram
discriminados. Paulo escreveu: “Onde está
o Espírito Divino, aí há liberdade” (2 Cor 3, 17).