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quinta-feira, 30 de maio de 2019

FUNDAMENTALISMOS





Por Frei Betto

        O fundamentalismo sempre existiu nas tradições religiosas. Consiste em interpretar literalmente o texto sagrado, sem contextualizá-lo, e extrair deduções alegóricas e subjetivas como única verdade universalmente válida. Para o fundamentalista, a letra da lei vale mais que o Espírito de Deus. E a doutrina religiosa está acima do amor. 

       Escolas do sul dos EUA, e também algumas no Brasil, rejeitam os avanços científicos resultantes das pesquisas de Darwin e ensinam que o homem e a mulher foram criados diretamente por Deus. Tal visão fundamentalista nem sequer reconhece que Adão, em hebraico, significa “terra”, e Eva, “vida”. Como os autores do Primeiro Testamento não raciocinavam com categorias abstratas, à semelhança da gente simples do povo, o conceito ganhou plasticidade no “causo” de Adão e Eva.

       Todo fundamentalista é um “altruísta”. Está tão convencido de que só ele enxerga a verdade que trata de forçar os demais a aceitar o seu ponto de vista... “para o bem deles”!

       Há muitos fundamentalismos em voga, desde o religioso, que confessionaliza a política, ao líder político que se julga revestido de missão divina. Eles geram fanáticos e intolerantes. 

       Uma das melhores conquistas da modernidade é a separação entre a Igreja e o Estado. Nada de papas coroando reis, como na Idade Média, ou presidentes consagrando a nação ao Imaculado Coração de Maria, como fez Bolsonaro no Planato dia 21 de maio.

       Certa vez perguntei a Fidel por que em Cuba o Estado e o Partido eram confessionais. Ele estranhou: “Como confessionais?” “Sim, expliquei, pois são oficialmente ateus. E negar a existência de Deus é tão confessional como afirmá-la.” Mais tarde, o Estado e o Partido Comunista cubanos tornaram-se laicos, assim como todos os estados e partidos modernos.

       Reger a vida política a partir de preceitos religiosos é um desrespeito a quem professa outra religião ou nenhuma. Isso não significa que um cristão deva abrir mão de suas convicções e dos valores evangélicos. Mas ele não deve esperar que todos reconheçam a natureza religiosa de sua ética. E nem queira impor a sua fé como paradigma político.

       Há que cuidar também para evitar o fundamentalismo laicista, de quem julga que religião é uma questão privada, sem dimensão social e política. Afinal, todos os cristãos são discípulos de um prisioneiro político. E a prática da fé implica em defesa intransigente da vida, especialmente dos vulneráveis e excluídos.

       O fundamentalismo laicista, que sempre relegou a religião à esfera da superstição, é danoso por estimular o preconceito e não reconhecer que milhões de pessoas têm em sua fé o paradigma de suas convicções e práticas. Corre-se o risco de repetir o erro dos antigos partidos comunistas, que exigiam dos novos militantes profissão de fé no ateísmo.

       Reforçam o fundamentalismo cristão todos os que são indiferentes ao diálogo inter-religioso e consideram a sua Igreja como a única verdadeira intérprete dos mandamentos e da vontade divinos. Por isso, é importante estabelecer os critérios éticos que propiciam a base sobre a qual as diferentes Igrejas e religiões devem dialogar e somar esforços. São eles: a ética da libertação em um mundo dominando por múltiplas opressões; a ética da justiça nessa realidade estruturalmente injusta; a ética da gratuidade nessa cultura mercantilista onde imperam o interesse e o negócio; a ética da compaixão num mundo marcado pela dor de tantas vítimas; a ética da acolhida, já que há tantas exclusões à nossa volta; a ética da solidariedade nessa sociedade fortemente competitiva; a ética da vida frente a tantos sinais de morte que ameaçam a natureza e os pobres.

       O fundamentalismo é irmão gêmeo do moralismo. E o moralista é capaz de ver o mosquito no olho alheio, como observou Jesus, sem atinar para a trava no próprio olho. No caso de certos políticos, quem sabe a solução para a paz seja considerar a guerra um atentado ao pudor...

Frei Betto é escritor, autor do romance “Minas do ouro” (Rocco), entre outros livros.

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terça-feira, 28 de maio de 2019

MARTÍRIO DE TODO UM POVO




Por Marcelo Barros

Há poucos dias, na 4ª feira, 15 de maio, o Brasil foi sacudido por uma das maiores manifestações públicas dos anos mais recentes. Em mais de 240 cidades brasileiras, estudantes, professores, funcionários públicos e a população, em geral, foram às ruas e praças para manifestar o seu desagrado pelas medidas propostas pelo atual governo contra a educação e no desrespeito à autonomia das Universidades públicas.
No início de maio, os bispos brasileiros, reunidos em Aparecida, em sua “mensagem ao povo brasileiro” denunciaram “a opção por um liberalismo exacerbado e perverso que vai contra as políticas sociais e favorece mais ainda as desigualdades”. Denunciaram que as reformas propostas pelo governo e já em andamento, como a trabalhista e a da previdência, têm aumentado o desemprego, (13 milhões de desempregados e 29 em trabalhos precários). Denunciaram as ameaças que pesam sobre os povos indígenas e o agravamento da crise ética, política e econômica. Claro que pensaram também na grave crise ecológica e na realidade da Amazônia. Diante dessa situação, é incrível constatar como os pobres resistem e teimam em lutar pela vida. As organizações sociais, apesar de perseguidas, se fortalecem e se unem na luta.
Desde algumas décadas, a caminhada da libertação tem se fortalecido com o testemunho de irmãos e irmãs que deram a vida nessa luta. Muitos desses/as mártires eram cristãos/ãs e morreram pela sua consagração à missão no meio dos mais pobres e à fidelidade ao evangelho, vivida em situação de conflito. Deram a sua vida pelos irmãos sofredores. Outros desses homens e mulheres, assassinados na luta pela justiça, embora não estivessem ligados a nenhuma Igreja ou religião são mártires, ou seja, testemunhas do projeto divino da justiça e da libertação. Como afirmou Jesus no evangelho: são bem-aventurados/as porque foram perseguidos/as por causa da justiça (Mt 5, 1- 12).
Nesse mês de maio, celebramos a memória de vários irmãos e irmãs que deram a vida na causa da justiça. Entre outros/as que deram a vida pela causa da justiça, as comunidades cristãs recordam dois, cuja memória é muito cara a todos nós. No dia 10 de maio de 1986, em Imperatriz (MA), era assassinado o padre Josimo Tavares, comprometido com a luta dos lavradores. Nesse domingo, 26, completaram-se 50 anos do martírio do padre Antônio Henrique Pereira Neto, coordenador de jovens da arquidiocese de Olinda e Recife. Aos 28 anos, foi barbaramente assassinado por paramilitares que, ao matá-lo,  queriam atingir o arcebispo Dom Helder Camara. Quem, como eu, teve o privilégio de conviver com esses dois irmãos sabe que ambos eram movidos pelo Evangelho e se sacrificaram para ser fieis à missão que Deus lhes deu.
No Brasil e em vários países do continente, além dos/das mártires da luta pela terra, da luta dos índios pela sua libertação, da defesa da natureza e direitos humanos, as comunidades têm convivido diariamente com assassinatos de jovens nas periferias, com a droga e o tráfico que traz tantos sofrimentos, riscos, violências... Cada vez mais, os mártires não são mais apenas essa ou aquela pessoa e sim povos inteiros crucificados.
De acordo com a fé cristã, Jesus morreu na cruz para que ninguém mais seja crucificado. Quem crê em Jesus deve se comprometer em fazer tudo para baixar da cruz os povos crucificados. Isso significa concretamente apoiar projetos políticos comprometidos com o povo mais pobre e mais críticos com relação ao Capitalismo dominante que, como diz o papa Francisco, “esse sistema mata”.
Nos anos 80, no Chile, Ronaldo Muñoz escrevia: “Toda injustiça e opressão violenta ocorrem porque Deus não pode evitar. (...) Assumindo ele mesmo, por amor, o mal e a injustiça ali onde mais doem, o Deus que se deixa crucificar com o Crucificado e os crucificados de hoje, é ele que nos interpela se estamos fazendo o máximo e o possível para transformar essa realidade. (...) Crer juntos com os sofredores e oprimidos no Deus de Jesus Cristo dá sentido e força para juntos viver e lutar”.

segunda-feira, 27 de maio de 2019

UMA NOVA DÉCADA



   por Maria Clara Lucchetti Bingemer

            Quando se celebra um novo ano de vida, é costume haver parabéns, bolos e velas.  Mais se faz necessário quando a nova data inaugura uma década. Assim sinto-me eu agora, quando entro nos 70 anos.  Nem em minhas mais longínquas e graves profecias exercitadas sobre mim mesma cheguei a pensar concretamente nisso. E, no entanto, chegou.  Tenho 70 anos.

            O que dizer diante disso?  Primeiro que não me sinto com essa idade toda.  Ou melhor, sinto-me e ao mesmo tempo não.  Sim, porque olhando para os lados e para trás vejo quanto já foi vivido e quantas testemunhas existem que podem atestar de minha vida com eles e elas compartilhada em todos esses anos. Igualmente quantas testemunhas já se foram. e me olham e esperam do outro lado da vida. 

            Porém, não me sinto configurada pelo estereótipo de uma mulher – ou seja uma senhora – de 70 anos.  Quando olhava para minha avó, em sua sétima década de vida, via uma senhora já bem avançada em anos, recolhida ao recinto do lar. Minha mãe, ao entrar nos 70, era mais ativa que minha avó, mas mesmo assim deixava ver pelo branco dos cabelos e pela postura corporal que o tempo avançava sobre seu corpo.

            Não me sinto com 70 porque minha vida tem mudado pouco em relação a anos anteriores.  E acontece hoje como quando tinha 50 ou 60.  A não ser um cansaço mais fácil e uma paciência escassa, trabalho e me movimento tanto ou mais do que antes.  Faço planos, curto a vida, tenho expectativas e acho uma delícia fazer programa com pessoas mais ou mesmo muito mais jovens.  Dentre estes últimos, os preferidos são meus netos Carol, Maria Antônia, Cadu, Lucas e Vicky.  Eles me mantêm acesa e maravilhada, brigam comigo devido a minhas ignorâncias tecnológicas, me contam casos e me fazem perguntas, tantas perguntas, às quais adoro me esforçar por responder.

            Por tudo isso e porque permaneço nessa tensão escatológica entre já me sentir com 70, mas ainda não me experimentar velha, esse aniversário é sobretudo o tempo da gratidão.  Há muito que agradecer, muito mais do que lamentar.  É um rosário de agradecimentos que devem ser verbalizados hoje, do lado de cá da fronteira que ultrapassei.
            E o primeiro é dirigido a Deus, fonte da vida, meu princípio e fundamento, o Senhor da história e das surpresas.  Ele que deu uma reviravolta em minha vida quando me fez assumir uma profissão que ninguém entendia quando eu pronunciava: teologia. Perguntavam: biologia?  E como você vai ganhar a vida com isso?  Aqui estou, aos 70 anos, trabalhando exclusivamente nisso e vivendo.  Aquele que me chamou e me enviou sabe por que o fez.  Eu teria lhe sugerido melhores escolhas, mas parece que ele tem seus critérios independentes dos nossos.  E cá estou, disponível como no primeiro dia.
            O segundo é para a minha família.  Órfã de pai aos 9 anos, filha única, tive uma infância e juventude um tanto “despovoadas” de pessoas, crianças, companheiros.  Agradecidíssima sinto-me por ter podido formar a família que é a minha, com meu marido há 50 anos.  Igualmente por meus três filhos, Lalá, Carlos e Candida, que habitaram meu corpo e dele saíram para serem pessoas, únicas, amadas e encantadoras.  Cada um com seu perfil e sua particularidade, são três graças maiores dessa vida já longa. E obviamente meus netos, crianças que me devolveram um sabor vital que já andava esquecido pelos anos de maternidade e o ninho vazio dos filhos adultos.  Poder ver e ouvir vocês, rir junto e viver esse amor sem ansiedade, repousado e pleno, é algo inestimável.

            Em seguida, vêm meus alunos.  Creio que elas e eles são os grandes responsáveis pelo fato de o envelhecimento ser por mim sentido de forma amena. Sua juventude, seus progressos, seus sucessos e êxitos acadêmicos me enchem de orgulho e me fazem vibrar intensamente.  Como é bom vê-los descobrindo veios e explorando-os; lendo obras de autores difíceis e fazendo suas próprias interpretações, diferentes da minha!  Como é bom vê-los criar, pensar, entender enfim conhecer!  Nessa aventura do conhecimento eles são não apenas aprendizes, mas companheiros em perpétuo e prazeroso diálogo.  Assim também meus colegas pesquisadores.  Vejo-me em grupos de pesquisa e de trabalho onde muitas vezes sou a mais velha.  E é muito estimulante ser assim, matriarca, decana, rejuvenescida pelas jovens e novas mentes que se somam à minha a fim de produzir o saber. 

            Por último, mas não em último lugar, vêm os amigos.  Amigos, como vocês sempre foram importantes em minha vida!  Mas como o são sobretudo agora. Porque os filhos vão voar seus próprios voos, sonhar seus próprios sonhos.  Os alunos se formam e se tornam colegas.  Ficam os amigos.  São elas e eles que estão aí, presentes e ativos, ensinando e aprendendo essa derradeira e bela forma de amor que é a amizade.  Com elas e eles posso recordar momentos que só nós compreendemos. Posso fazer memória de pessoas que já se foram e chorá-las em conjunto.  Posso rir a bandeiras despregadas com situações das quais só nós temos os códigos.  Amigos, poderia viver sem tudo, menos sem vocês. Merecem todos os agradecimentos do mundo. 

            Sem medo, mas com certa expectativa, olho para a frente.  O que me reservará a vida nesses próximos tempos? Não sei nem posso saber, porém me é permitido esperar.  Que seja o que é: vida.  Com mais experiência, mais maturidade e ainda uma certa juventude de espírito que espero jamais perder. Melhor idade?  Pode ser.  Apesar dos pesares e com todas as alegrias. 

       Maria Clara Bingemer é teóloga, professora do Departamento de Teologia da PUC-Rio e autora de “Simone Weil – Testemunha da paixão e da compaixão" (Edusc).
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sexta-feira, 24 de maio de 2019

SOB O IMPÉRIO DO GROSSEIRO E DO OBSCENO



por leonardo boff

Se há algo a lamentar profundamente hoje em dia nas redes sociais de nosso país é o império da grosseria e da obscenidade.
Essa metáfora já foi usada por outros: parece que as portas e as janelas do inferno se abriram de par em par. Daí saíram os demônios das ofensas pessoais, das injúrias, dos fake news, das mentiras, das calúnias e de toda sorte de palavras de baixíssimo calão. Nem precisaria Freud ter chamado a atenção ao fato de que há pessoas com fixação anal, usando palavras escatológicas e metáforas ligadas a perversões sexuais, pois as encontramos frequentemente nos twitters, nos facebooks, nos youtubes e em outros canais.
A grosseria demonstra a falta de educação, de civilidade, de cortesia e de polidez no trato para com as pessoas. A grosseria transforma a pessoa em vulgar. O linguajar vulgar usa expressões que ferem a sensibilidade dos outros ao seu redor. A vulgaridade contumaz deixa as pessoas inseguras, pois, nunca sabem quais gestos, palavrões ou metáforas de mau gosto podem sair de gente grosseira. O grosseiro casa o mau gosto com o desrespeito.
Especialmente, embora não exclusivamente, é o homem mais vulgar em sua linguagem. A mulher, não exclusivamente, pode ser vulgar no modo de se expor. Não se trata apenas no modo de se vestir, tornando-a explicitamente sensual e sedutora, mas no comportamento inadequado de se portar. Se a isso ainda se somam palavras obscenas e grosseiras faz-se mais vulgar e grotesca.
Especialmente grave é quando os portadores de poder como um presidente, um juiz da corte suprema, um ministro de Estado ou senador entre outros, esquecem o caráter simbólico de seu cargo e usam expressões vulgares e até obscenas. Espera-se que expressem privada e publicamente os valores que representam para todos. Quando falta esta coerência, a sociedade e os cidadãos se sentem traídos e até enganados. Aqueles que usam excessivamente expressões indignas de sua alta função são os menos indicadas para exercê-las.
Infelizmente é o que verificamos quase diariamente no linguajar daquele que ocupa o cargo mais alto da nação. Seu linguajar, não raro, é tosco, ofensivo, quando não escatológico e quase sempre burlesco.
Se é grave alguém ser grosseiro, mais grave ainda é o ser obsceno. Pois, este, o obsceno, rompe o limite natural daquilo que implica respeito e o sentido bom da vergonha. Já Aristóteles em sua Ética anotava que nos damos conta da falta de ética quando se perdeu o sentido da vergonha. Sem ela, tudo é possível, pois, não haverá nada que imponha algum limite. Até a Shoah, o extermínio em massa de judeus pelo nazismo, se tornou terrível realidade.
Nem tudo vale neste mundo. Houve Alguém que foi sentenciado à morte na cruz por testemunhar que nem tudo vale e que é digno entregar a própria vida por aquilo que deve ser incondicionalmente intocável e respeitável: a reverência ao Sagrado e a sacralidade do pobre e do que injustamente sofre.
Houve no Ocidente uma figura que se transformou em arquétipo da cortesia e da finura de espírito, daquilo que Pascal chamava de “esprit de finesse” contraposto ao “esprit de géométrie”; aquele, cheio de cuidado e de delicadeza e este outro, marcado pela frieza do cálculo e pela vontade de poder.
Um franciscano francês, Eloi Leclerc, sobrevivente do campo nazista de extermínio de Dachau e Birkenau, traduziu assim a cortesia de Francisco de Assis: “ter um coração leve” sem nenhum espírito de violência e de vingança, o reverso o de ter um coração pesado como o nosso, cheio de grosserias e de obscenidades. Aí ele faz o Poverello de Assis dizer:
“Ter um coração leve é escutar o pássaro cantando no jardim. Não o perturbes. Faze-te o mais silencioso possível. Escuta-o. Seu canto é o canto de seu Criador.”
“Rosas desabrocham no jardim. Deixa que possam florir. Não estendas a mão para colhê-las. Elas são o sorriso do Criador”.
“E se encontrares um miserável, alguém que está sofrendo desesperado, cala-te, escuta-o. Enche teus olhos com a presença dele, com a vida dele até que ele possa descobrir em teu olhar que tu és seu irmão. Então tu o fizeste existir.Tu foste Deus para teu irmão” (O Sol nasce em Assis, Vozes 2000 p.127).
Releva dizer: somos seres duplos, grosseiros e obscenos, mas também podemos e devemos ser gentis e corteses. Destes precisamos muitos, nos dias atuais, em nosso país. Para isso importa educar o coração (sim, dar valor à educação) para que seja leve e totalmente distante de toda a grosseria e de toda a obscenidade, tão vigentes entre nós.
Leonardo Boff é teólogo, filósofo, ex-frade mas conservando o espírito franciscano de Assis.




quinta-feira, 23 de maio de 2019

DA MÍDIA DE CONSENSO À DE CONFLITO




Por Frei Betto

      Definha o interesse por notícias impressas ou televisivas. Pesquisas revelam que o público prefere notícias online.

      Nos séculos XIX e XX, o modo de pensar da sociedade tendia a ser moldado pelos grandes meios de comunicação: mídia impressa, rádio e TV. Tudo indica que termina aquela era. Trump se elegeu atacando a grande mídia dos EUA. Só a Fox o apoiou. Os principais veículos da mídia britânica se opuseram ao Brexit. Ainda assim a maioria dos eleitores votou a favor dele. Bolsonaro fez campanha presidencial quase ausente da grande mídia. Criticou os principais veículos, e ainda assim se elegeu. O que acontece de novo?

      O novo são as redes digitais, as novas tecnologias ao alcance da mão. Elas deslocam a notícia dos grandes veículos para computadores e smartphones. Têm o mérito de democratizar a informação, rompendo a barreira ideológica que evitava opiniões contrárias à orientação editorial do veículo.

Contudo, pulverizam a notícia. O que é manchete na TV não merece destaque na comunicação interpersonalizada na internet. O receptor corre o risco de perder ou não adquirir critérios de valoração das notícias. Pode ser que lhe seja mais importante ficar ciente de que seu colega tem nova namorada do que inteirado do golpe de estado no país vizinho ou da nova lei que regula o trânsito em seu bairro.

      Essa informação individualizada, embora mais cômoda, prêt-à-porter, tende a evitar o contraditório. Cada interessado se isola no interior de sua tribo no Whatsapp, no Twitter, no Facebook, no Instagram, no YouTube, no Telegram, nos serviços de mensagens no Google e do Periscope. Não há interação dialógica. Não interessa o que dizem as tribos vizinhas, potenciais inimigas. O que transmitem não merece crédito. A única verdade é a que circula na tribo com a qual o internauta se identifica. Ainda que essa “verdade” seja fake news, mentira deslavada, farsa. Apenas um dialeto faz sentido para o internauta. Desprovido de visão conjuntural, ele se agarra ao que propagam seus parceiros como quem acolhe oráculos divinos.

Querer mudar-lhe o foco é como se alguém tentasse convencer os astecas contemporâneos de Cortés de que o sol haveria de despontar no horizonte ainda que eles não despertassem de madrugada para celebrar os ritos capazes de acendê-lo. Com certeza não ousariam correr o risco de ver o dia inundado de escuridão.

      Eis a privatização da notícia. Essa seletividade individualizada faz com que o internauta se encerre com a sua tribo na fortaleza virtual dotada de agressivas armas de defesa e ataque. Se a versão emitida pela tribo inimiga chegar a ele, será imediatamente repelida, deletada ou respondida por uma bateria de impropérios e ofensas. É dever de sua tribo disseminar em larga escala a única verdade admissível, ainda que careça de fundamento, como a teoria do terraplanismo.

      Os efeitos dessa atomização das comunicações virtuais são deletérios: perda da visão de conjunto; descrédito dos métodos científicos; indiferença ao conhecimento historicamente acumulado; e, sobretudo, total desprezo por princípios éticos. Qualquer um que se expresse em linguagem que não coincida com a da tribo merece ser atacado, injuriado, difamado e ridicularizado.

      O que fazer frente a essa nova situação? Desconectar-se? Ora, isso seria bancar a tartaruga que recolhe a cabeça para dentro do casco e, assim, se julga invisível. A saída deve ser ética. O que implica tolerância e não revidar no mesmo tom. Como sugere Jesus, “não atirar pérolas aos porcos” (Mateus 7,6). Deixar que chafurdem na lama sem, no entanto, ofendê-los.

      A vida é muito curta para que o tempo seja gasto em guerras virtuais. Quanto a mim, prefiro ignorar ataques e atuar propositivamente. Sobretudo, não trocar a sociabilidade real pela conflituosidade virtual. E muito menos livros por memes e zapps que nada acrescentam à minha cultura e à minha espiritualidade.

Frei Betto é escritor, autor de “Fé e afeto – espiritualidade em tempos de crise” (Vozes), entre outros livros.
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terça-feira, 21 de maio de 2019

DEUS NO TRIBUNAL DO MUNDO



Por Marcelo Barros

Mesmo quem não é advogado, não pode ficar indiferente ao ver alguém a quem se ama ser tão mal falado. Em tempos de fake-news, as pessoas cujo nome é envolvido em notícias falsas correm para desmascarar a mentira. No entanto, há um nome usado impunemente e não há como impedir. Muito antes de existir internet e guerras de quarta geração nas quais as armas são os meios de comunicação, já o nome de Deus era usado para legitimar ditaduras, justificar colonialismos, provocar violências, guerras e massacres. Na América Latina, ditadores militares tomaram o poder a serviço do império norte-americano e, para garantir os privilégios da elite econômica, usavam o nome de Deus. Nas eleições presidenciais que o Brasil viveu em 2018, a maioria das pessoas religiosas optou não apenas por um caminho conservador e indiferente à causa dos mais pobres. Mais do que isso: votou na extrema-direita, enquanto a maioria dos ateus e das pessoas sem religião votou na democracia. 

Grupos evangélicos e pentecostais, com seus pastores, assim como católicos com padres e até bispos votaram conscientemente na proposta da violência, da discriminação e do ódio como caminho político. Já em 1968, o pastor secretário geral do Conselho Mundial de Igrejas que reúne mais de 300 Igrejas evangélicas e ortodoxas, declarou: “Os cristãos que negam a sua responsabilidade social com os empobrecidos do mundo cometem pecado contra a fé tão grande quanto os que negam a ressurreição de Jesus”. Quem de fora analisa essa realidade só pode dar razão ao cineasta norte-americano Woody Allen quando declara: “Deus deve ser um cara bom, mas os amigos dele, eu não recomendaria”.   

O uso do nome de Deus para legitimar o mal é antigo. Tão antigo que, na Bíblia, a primeira palavra que Deus dá quando, no monte Sinai, faz aliança com os hebreus que tinham saído da escravidão, é a ordem: “Não pronuncies o nome divino”. A tradição católica traduziu isso no mandamento: “Não usar o nome de Deus em vão”... Mas quem garante quando o uso do nome divino é em vão ou é justo?”. Durante séculos, em nome de Deus, papas, bispos, padres e pastores justificaram o direito dos impérios europeus colonizarem os povos do sul. Legitimaram guerras e crueldades humanas. Não foi somente na Idade Média que as cruzadas tinham como lema: Deus vult! Deus quer!

Atualmente, o presidente do Brasil repete como bandeira eleitoral a mesma afirmação de Hitler na Alemanha nazista: Deus acima de todos! E uma de suas ministras afirma ter visto Jesus em uma goiabeira. E tanta devoção unida a uma política contra os direitos dos mais pobres e favorável a todo tipo de preconceito só pode gerar em qualquer pessoa crítica um horror a esse deus mesquinho, cruel e discriminador.

No tempo do nazismo, Martin Buber, espiritual judeu, afirmava: “Nenhuma palavra tem sido tão mal usada e massacrada na história do que o nome de Deus. No entanto, exatamente por isso, não podemos deixa-la assim suja e mal falada. Temos de resgatá-la e devolvê-la ao seu uso correto como expressão de amor gratuito e solidário”.  

Paul Tillich, um dos maiores teólogos evangélicos do século XX afirmava: “O nome da profundidade e do fundo infinito, inesgotável de todo ser é Deus. Esta profundidade é o próprio sentido da palavra Deus. Se vocês virem o que há de mais importante e profundo na cultura e na vida de alguém ou de um povo, vocês estão tocando no mistério da presença de Deus”. 


MARCELO BARROS é monge beneditino e escritor. Tem 44 livros publicados, dos quais  “O Espírito vem pelas Águas", Ed. Rede da Paz e Loyola. Email: irmarcelobarros@uol.com.br

quinta-feira, 16 de maio de 2019

ESCALADA CONTRA A DEMOCRACIA




Frei Betto

       Não faço parte do time das pitonisas. Prefiro guardar o pessimismo para dias melhores. Contudo, prevejo tempos difíceis para o Brasil, a menos que a nossa indignação se transforme em mobilização. Pelo andar da carruagem, nossa frágil democracia se encontra ameaçada, e nossa liberdade de expressão, amordaçada. 

       Os sinais não são promissores. Nada indica que a economia brasileira sairá em breve do atoleiro em que se encontra. O número de desempregados passa de 13 milhões. As previsões do PIB 2019 encolhem a cada novo balanço. No início do atual governo acreditava-se que cresceria 2,2%. Agora, se prevê 1,7%.  O Brasil retrocede.

       Ainda que alguma reforma da Previdência seja aprovada (sem afetar os privilégios do andar de cima, é claro), nada indica vir do exterior investimentos substanciais. Nosso país está desacreditado. Quem se aventura a embarcar em um navio avariado? E há outras opções mundo afora para os investidores. Preferem multiplicar seu capital em economias robustas e confiáveis. 

       Como se sentir seguro sob um governo que a cada dia se desdiz? Em menos de cinco meses desacreditou as próprias promessas de campanha. O corporativismo e o viés ideológico falam mais alto que a competência. Ministro que se preze deve vestir a farda de recruta e engolir a seco as ordens do comandante. Não se admite o contraditório, o pluralismo, o debate democrático.

       Dança-se ao ritmo leninista: um passo à frente, dois atrás. A embaixada brasileira transferida para Jerusalém permanece em Tel Aviv. A soberania do país se dobra à suspensão unilateral de vistos para estadunidenses. A cultura é sufocada pela falta de recursos. As ações da Petrobras e do Banco do Brasil despencam, porque o governo “não intervencionista” veta o aumento do diesel e a publicidade do banco. 

       A grileiros, desmatadores e invasores de terras indígenas é concedida licença para matar. Aos milicianos se faz vista grossa. Aos corruptos amigos da família, silêncio. O que ao pai, movido a arroubos, não convém manifestar, ao filho é transferida a tarefa, ainda que ofensas ao general eleito vice do capitão. 

       O desmonte é geral. Conselhos federais são extintos; não há médicos em muitas localidades antes atendidas por cubanos; disciplinas que ensinam a pensar, como filosofia e sociologia, são riscadas dos currículos; milícias são toleradas; índios são recebidos em Brasília, não por autoridades abertas ao diálogo, mas pela Força Nacional, como se um bando de feras evadidas da selva ameaçasse avançar sobre o Planalto.

       O clima é de repúdio à democracia. Até quando o STF e o Congresso Nacional serão tolerados? E a liberdade de imprensa? Oitenta tiros do Exército assassinaram dois cidadãos inocentes e o fato é considerado irrelevante. 

       Pelos corredores do governo disseminam o medo e a insegurança. O ministro da Economia fala em obter R$ 1 trilhão com as reformas, e horas depois o presidente reduz para R$ 800 bilhões. O secretário da Receita Federal acenou com novos impostos e foi desautorizado no dia seguinte de sua entrevista. A lei do silêncio impera. Quem pretende se agarrar à sua boquinha no governo que trate de fechar a própria. O atual governo sabe destruir, mas não sabe construir.

       As pesquisas comprovam que a aprovação ao Planalto despenca a cada mês? Ora, puro “fake”, clama o governo. Ele garante que a aprovação, como ótimo, é 98%! Exceto para 2% de gente envenenada pelo marxismo cultural. Gente que não respeita a família, ainda que o acusador tenha tido três. Gente que é a favor dos direitos dos homossexuais e contra a liberação da posse e do porte de armas.

       O rei está nu. Mas não convém admitir isso em público. Cada cidadão que cubra seus olhos indignados com as cores vivas dessa policromia ministerial em 22 tons de cinza.

Frei Betto é escritor, autor de “Calendário do poder” (Rocco), entre outros livros.
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terça-feira, 14 de maio de 2019

O DEVER DE DESOBEDECER




Por Marcelo Barros

A Organização das Nações Unidas (ONU) consagra o 15 de maio como “o dia mundial da objeção de consciência”. Infelizmente poucas pessoas sabem do que se trata. Objeção de consciência é a atitude de quem, por convicção religiosa, social ou política, se nega a pegar em armas e a participar de guerras e praticar atos violentos. Supõe desobediência a leis que ferem a consciência da pessoa ou a ética de um grupo.
O Direito internacional ensina que toda pessoa tem o direito e o dever de desobedecer, quando a ordem dada se opõe à sua consciência. Pelo fato de seguir ordens, ninguém deixa de ser responsável pelo que faz. Os tribunais internacionais condenaram soldados nazistas que, cumprindo ordens de oficiais superiores, torturaram ou mataram pessoas.
Obedecer vem do verbo latino obaudire que significa “escutar interiormente”. Então, a verdadeira obediência é a capacidade de escutar a palavra do outro, levá-la a sério, mas, depois, agir de acordo com a sua consciência. Ninguém deve cumprir ordens iníquas.
Em Israel, jovens recrutados ao serviço militar invocam a objeção de consciência para se negar a combater palestinos ou a queimar casa de pessoas pobres, ato comum perpretado pelas tropas de ocupação israelita. Nos Estados Unidos, por objeção de consciência, muitos jovens se negam a invadir outros países e a agredir nas ruas negros e migrantes pobres. Diante do Congresso, militantes pacifistas foram presos por rasgarem publicamente o documento de incorporação militar.
Em alguns países, cidadãos exigem saber a destinação exata do pagamento de seus impostos. E não aceitam pagar impostos se o dinheiro for aplicado em sociedades que fabricam armas ou investem em negócios antiéticos. Em todo o mundo, há consumidores que não compram carne de fazendas que destroem florestas e dizimam a natureza.
De fato, no decorrer da história, a humanidade têm progredido mais pela ação de pessoas que desafiaram as leis do que através daquelas que simplesmente seguem os caminhos convencionais. Por muito tempo, homens e mulheres, admirados no mundo inteiro e premiados com o Nobel da Paz, em seus países eram considerados como rebeldes e desobedientes. No passado, Gandhi e Martin Luther King foram presos e condenados como desobedientes às leis. Na África do Sul, Nelson Mandela passou 20 anos na prisão como subversivo. Para os budistas tibetanos, o Dalai Lama, é a reencarnação do Buda da Compaixão. No entanto, para o governo chinês, é um dissidente, desobediente às leis. Na América Latina, o prêmio Nobel da Paz foi dado a Rigoberta Menchu, índia que, durante  anos, viveu exilada do seu país e a Adolfo Perez Esquivel, advogado que, por muito tempo, foi ameaçado de prisão na Argentina. No Brasil dos tempos da ditadura, o arcebispo Dom Hélder Câmara, escutado no mundo inteiro, era censurado e considerado subversivo.
Em 1980, em El Salvador, Monsenhor Romero, canonizado como santo pelo papa Francisco, poucos dias antes de ser assassinado pela ditadura militar do seu país, pregava do alto do seu púlpito: “Peço aos soldados que desobedeçam e parem a violência, Não matem. Não torturem. Não cometam injustiças”.
Atualmente, de tal modo, o modelo democrático está em crise que, em países como os Estados Unidos, a Itália, Argentina e Brasil, o governo é ocupado por pessoas que se revelam sem escrúpulos. Não disfarçam o ódio, a discriminação a pessoas e grupos diferentes e sua admiração à violência. O presidente da República propõe que todas as pessoas possam ter armas, pais ensinem crianças a atirar e policiais tenham direito de matar  quem lhes pareça suspeito. Por todo o país, se espalham atos de racismo, de violência contra a mulher e contra minorias sexuais. O ministério da educação pretende proibir o ensino da Filosofia e da Sociologia nas universidades. Nesse contexto, em nome da humanidade, todo cidadão tem obrigação de se posicionar contrário a que esses projetos perversos se concretizem. Não basta ser contra. É preciso lutar contra a loucura dessa farsa produzida pela Globo e outros grandes meios de comunicação que nos roubaram a democracia e nos conduziram à barbárie.  
A violência, cometida por uma pessoa individual, ou pelo Estado, nunca construirá um mundo de paz e justiça. Nos mais diversos continentes, grupos religiosos e civis se negam a pegar em armas e exigem substituir treinamentos militares por ações pacíficas. Fazem serviço civil no lugar do serviço militar obrigatório e a lei reconhece esse direito.
A Constituição brasileira garante aos jovens o direito da objeção de consciência. Ninguém pode ser obrigado a fazer serviço militar ou, se é policial praticar violência contra outra pessoa. A ONU consagra essa semana para divulgar essa informação e tornar conhecido o direito que toda pessoa tem de se negar a obedecer a ordens injustas e iníquas.  
Mais do que qualquer poder social e político, religiões e Igrejas deveriam reconhecer o direito à dissidência e à objeção de consciência diante de um poder religioso autoritário ou, por qualquer razão, injusto. Conforme a Bíblia, quando as autoridades de Jerusalém proibiram os apóstolos a falar no nome de Jesus, estes responderam: “Entre obedecer a Deus e aos homens, é melhor obedecer a Deus. Por isso, nós desobedecemos a vocês”(At 5, 29).    


MARCELO BARROS é monge beneditino e escritor. Tem 44 livros publicados, dos quais  “O Espírito vem pelas Águas", Ed. Rede da Paz e Loyola. Email: irmarcelobarros@uol.com.br