Por Frei Betto



      O papa João Paulo II criou, a 27 de novembro de 1986, o Dia Mundial de Oração pela Paz. Naquela data, ele reuniu, em Assis, terra de São Francisco, 160 representantes de 32 confissões cristãs e 11 denominações não cristãs – hinduísmo, sikhismo, budismo, judaísmo, islamismo, xintoísmo, zoroastrismo, fé bahá’í e tradições de origem africana.
      O papa Francisco repetiu a iniciativa no último 20 de setembro, porém mantendo a convocatória mundial para a data de 27 de outubro. 

      Neste ano, há motivos especiais para orarmos pela paz. Pela primeira vez na história, uma nação votou democraticamente pela continuação de uma guerra que já dura cinquenta anos – o conflito, na Colômbia, entre as tropas do governo e a guerrilha das FARC. Espera-se que o Prêmio Nobel da Paz concedido, este mês, ao presidente colombiano, Juan Manuel Santos, fortaleça o acordo de paz entre as forças beligerantes.

      Segundo a ONU, as guerras do século XX ceifaram a vida de 109,700 milhões de pessoas. A Primeira Grande Guerra (1914-1918) deixou o lastro de 15 milhões de mortos. Na Segunda (1939-1945) 50 milhões perderam a vida, dos quais 62% eram civis.

      No século XXI, a guerra do Iraque eliminou, em sete anos, cerca de 100 mil pessoas, das quais 4 mil soldados estadunidenses. A da Síria, iniciada em 2011, já sacrificou 300 mil vidas, das quais um terço de civis, além de obrigar 11 milhões de pessoas a abandonarem suas casas. 

      Não sejamos ingênuos. A guerra não é apenas “a continuação da política por outros meios”, como declarou Clausewitz. É, hoje em dia, sobretudo um meio sórdido de se obter lucro fácil, através da indústria bélica, que fatura US$ 400 bilhões por ano, e do contrabando de armas. São as nações ricas do hemisfério Norte, que tanto falam em paz, que fabricam artefatos de guerra e promovem intervenções militares em nações periféricas. Praticam o preceito do “armai-vos uns aos outros”.

      Orar pela paz é se comprometer a lutar por justiça. Foi o profeta Isaías o primeiro a nos alertar que a paz não resulta do equilíbrio de armas, como julgam os governantes atuais envolvidos no conflito da Síria, e sim da promoção da justiça.

      Nenhum animal mata o seu semelhante, exceto para se alimentar. Somente nós, seres humanos, criaturas de Deus, carregamos essa perversidade de matar por vingança, ira, preconceito ou ambição de poder. 

      Orar pela paz é praticar o “amai-vos uns aos outros”, ou seja, a tolerância, e extirpar do coração essas energias negativas que nos induzem a desencadear pequenas guerras cotidianas que usam como arma a linguagem ofensiva e as posturas exclusivas.

      No coração de cada um de nós vicejam guerras que equivocadamente têm como alvo aqueles que discordam de nossas ideias, opiniões e iniciativas. Ora, há que mirar no alvo certo: as desigualdades sociais que são a origem de tantos conflitos, e a pretensão de impor aos demais, a ferro e fogo, o modo pessoal de pensar e agir.

      Orar pela paz é erradicar a intolerância e combater as causas das injustiças. São elas as fontes de todas as desavenças.

Frei Betto é escritor, autor de “Calendário do poder” (Rocco), entre outros livros.


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