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quarta-feira, 14 de julho de 2021

AÇÃO DE GRAÇAS, EM TEMPOS DE CORONAVIRUS

 FREI ALOÍSIO FRAGOSO


(10/07/2021)

 

     "Por tudo, dai graças a Deus" 1Ts.5,18.

       Esta manhã uma andorinha pousou no parapeito da minha janela e fez o que não devia ter feito, o que tinha o universo inteiro pra fazer, a saber, sujou minha camisa branca, recém lavada e exposta ao sol. Pela vida da andorinha, dei graças a Deus, mas, pelo seu procedimento, soltei um palavrão que decerto ela não entendeu, mas entendem os leitores: "droga!". Se este exemplo é pequeno demais para o tamanho do tema sugerido,  reportemo-nos a um acontecimento próximo e recente: as chuvas intermitentes, intermináveis que inundaram a cidade e frustraram os planos de passeios, pique-niques, viagens de férias, visita a parentes distantes. Estas mesmas chuvas também banharam e fertlizaram as terras do campo, que fornecerão alimento para uns e outros. Os primeiros encontraram motivo de maldizer o "mau tempo", enquanto os outros  louvaram ao Criador pelas chuvas benfazejas.

     O que responder a S.Paulo, que nos recomenda "por tudo dai graças a Deus"?

      Duas enormes catástrofes se abateram sobre o nosso país. A pandemia do coronavirus, com seu séquito de mais de 500.000 mortes rápidas e brutais. E a outra tragédia, maior e mais mortífera: a chegada ao poder supremo da nação daqueles que agora ocupam o Planalto. O que daí resultou foram milhões  de filhos e filhas da pátria condenados a uma morte lenta, previsível e camuflada, causada pelo virus cotidiano da fome.

 

         Resultaram também impactos na Fé de muitas pessoas. Seria uma saída sacrílega anular todas as dúvidas com uma confissão de fé do tipo: "seja feita a vontade de Deus".

      Sobre isso a Bíblia traz um exemplo clássico, na pessoa de Jó. Ele reage à notícia de que suas propriedades foram violentamente devastadas, com uma confissão de fé incondicional: "O Senhor me deu, o Senhor me tirou. Bendito seja o nome do Senhor". Mas, com a sequência de outras tragédias, violentando sua família e seu próprio corpo, Jó muda de tom, e extravaza suas emoções em forma de protesto. Primeiro, maldiz o seu nascimento: "por que não pereci nos joelhos de minha mãe,?". A seguir, confronta os amigos: "deixem-me sozinho, vocês não entendem a dor de um homem ferido pelas flechas do Altíssimo!". E por fim interpela Deus: "o Senhor vai destruir a obra de suas mãos?". Depois de muitas inúteis imprecações, ele se humilha: "oh Deus, até hoje eu te conhecera por ouvir dizer, mas agora te reconheço com os meus próprios olhos. Perdoa!"

     De que Jó se arrepende? De sua revolta? De suas imprecações? Não. Ele não confessa que estava errado, mas sim que se deixou cegar pela dor. Demorou a perceber que Deus já tinha entrado em campo, já o armara de novas e suficientes forças, que sua vida passada tinha de ser mudada em vida futura.

     Nestes 15 meses longos e sombrios de pandemia, somos testemunhas do grande aumento numérico de pessoas voltadas para Deus, em busca de respostas, não respostas morais, doutrinárias, mas sim existenciais, vitalizadoras. Descartada a blasfêmia de ver intenção punitiva de Deus nessa catástrofe, não cessemos de dar-lhe graças pelas lições havidas e aprendidas:

     Mais uma vez seus filhos e filhas provaram que jamais se rendem a uma grave ameaça contra seu destino. E provaram também que, a despeito das aparências e do ceticismo da maioria, há neles mais a admirar do que a desdenhar. Mostraram ainda como há milhões de anjos da bondade agindo no silêncio e na surdina, ao contrátio dos demônios, que precisam de palco e publicidade. E assim ficou patenteado que, no duelo entre o medo da morte e dom da vida, esta última está ganhando bonito, graças a Deus, para a sua glória e o bem do seu povo. Amém!

     (Com esta matéria dou por encerrada essa série

 de reflexões e passo a contatar a gráfica para iniciar a elaboração  do segundo volume de "A Fé em Tempos de Coronavirus". Rendo graças a Deus pelo dom que me inspirou e pelos amigos e amigas que acolheram generosamente suas inspirações.)

-Frei Aloísio Fragoso é frade franciscano, coordenador da Tenda da Fé e escritor

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