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terça-feira, 19 de junho de 2018

FESTAS JUNINAS E PROFECIA





Por Marcelo Barros

Por todo o Nordeste, principalmente no interior, o mês de junho é marcado pelas festas juninas. No entanto, em todas as regiões do Brasil, a festa de São João Batista ultrapassa os limites da celebração religiosa para se tornar festejos da natureza, com fogueiras, fogos de artifício e danças características da época. Na cordilheira dos Andes, no solstício do inverno, ou seja, por volta do 21 de junho, a festa do Inti Rami, o renascimento do Sol, manifesta a vitalidade das culturas indígenas e a união de diversos povos originários em defesa da natureza ameaçada.

As festas juninas pedem organização, ensaios e disciplina. Muitas de suas brincadeiras, como o casamento caipira e a quadrilha, envolvem críticas à sociedade desigual em que vivemos. Figuras como juiz e padre são ridicularizadas por seu apego ao dinheiro e às aparências sociais. Esses costumes unem o povo em expressões de igualdade e liberdade, que, mesmo de modo espontâneo, podem ser sinais antecipadores da festa da liberdade social e política que o Brasil precisa.

No Brasil do Catolicismo popular, mesmo sem saber, as pessoas que vivem as festas juninas cumprem a profecia que, segundo o evangelho,  Zacarias, pai de João Batista, recebeu do anjo a respeito do nascimento do seu filho: "Por seu nascimento, muitos se alegrarão".

Na época de Jesus, há tempos, o povo esperava um profeta que viesse anunciar um tempo novo de justiça e de graça divina. De acordo com o evangelho, o nascimento de João Batista revelou que esse tempo novo teve sinais muito claros. Isabel, uma mulher velha e estéril, engravidou e deu a luz. O pai Zacarias que tinha ficado mudo, assim que o menino nasceu, se pôs a falar e a cantar a bondade divina. Esses fatos maravilhosos provocaram em todos alegria porque serviram como sinais de que, em todos os tempos, Deus é sempre capaz de tornar fecundo o útero estéril das sociedades humanas e não apenas das pessoas. Isso significa que o amor divino pode renovar o que, em nosso modo de ser e nas nossas vidas, ainda é envelhecido e estéril. Ele nos faz superar a mudez e a apatia para proclamar o seu projeto de libertação.

Atualmente, no Brasil, em meio à crise social e política que vivemos, não deixa de ser profecia de esperança e de resistência ver as pessoas superarem os muitos e justificados motivos de tristeza e colocarem suas melhores energias na festa que, nesses dias, organizam e vivem de forma tão comunitária e criativa.

Quem tem fé aprende a valorizar esses costumes populares e pode neles vislumbrar sinais de um tempo novo. Conforme os evangelhos, João Batista propôs a todos uma renovação de vida baseada na justiça e na relação com a Terra e as águas. O seu batismo era um rito inspirado na cultura e na religião popular do seu tempo e significava uma ruptura com uma sociedade injusta e desigual, legitimada por uma religião que tinha se tornado, quase somente cultual e baseada em normas legalistas. João Batista propõe uma espiritualidade não apenas baseada no culto e sim na Ética e na pratica da solidariedade (Lucas 3).

Ao ser batizado por João no rio Jordão, Jesus se revelou discípulo de João profeta e começou sua missão profética.  Assim também, podemos esperar que as pessoas que participam dos festejos que lembram São João, homens e mulheres de várias Igrejas cristãs, assumam a missão de profetas e profetizas de Deus que nos pede para construirmos uma sociedade irmanada em uma humanidade renovada e renovadora.
 Marcelo Barros, monge beneditino e escritor, autor de 26 livros dos quais o mais recente é "O Espírito vem pelas Águas", Ed. Rede-Loyola, 2003. Email: mostecum@cultura.com.

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