Por Marcelo
Barros
Por todo o
Nordeste, principalmente no interior, o mês de junho é marcado pelas festas
juninas. No entanto, em todas as regiões do Brasil, a festa de São João Batista
ultrapassa os limites da celebração religiosa para se tornar festejos da
natureza, com fogueiras, fogos de artifício e danças características da época.
Na cordilheira dos Andes, no solstício do inverno, ou seja, por volta do 21 de
junho, a festa do Inti Rami, o renascimento do Sol, manifesta a vitalidade das
culturas indígenas e a união de diversos povos originários em defesa da
natureza ameaçada.
As festas
juninas pedem organização, ensaios e disciplina. Muitas de suas brincadeiras,
como o casamento caipira e a quadrilha, envolvem críticas à sociedade desigual
em que vivemos. Figuras como juiz e padre são ridicularizadas por seu apego ao
dinheiro e às aparências sociais. Esses costumes unem o povo em expressões de
igualdade e liberdade, que, mesmo de modo espontâneo, podem ser sinais
antecipadores da festa da liberdade social e política que o Brasil precisa.
No Brasil
do Catolicismo popular, mesmo sem saber, as pessoas que vivem as festas juninas
cumprem a profecia que, segundo o evangelho,
Zacarias, pai de João Batista, recebeu do anjo a respeito do nascimento
do seu filho: "Por seu nascimento, muitos se alegrarão".
Na época de
Jesus, há tempos, o povo esperava um profeta que viesse anunciar um tempo novo
de justiça e de graça divina. De acordo com o evangelho, o nascimento de João
Batista revelou que esse tempo novo teve sinais muito claros. Isabel, uma
mulher velha e estéril, engravidou e deu a luz. O pai Zacarias que tinha ficado
mudo, assim que o menino nasceu, se pôs a falar e a cantar a bondade divina.
Esses fatos maravilhosos provocaram em todos alegria porque serviram como
sinais de que, em todos os tempos, Deus é sempre capaz de tornar fecundo o
útero estéril das sociedades humanas e não apenas das pessoas. Isso significa
que o amor divino pode renovar o que, em nosso modo de ser e nas nossas vidas,
ainda é envelhecido e estéril. Ele nos faz superar a mudez e a apatia para
proclamar o seu projeto de libertação.
Atualmente,
no Brasil, em meio à crise social e política que vivemos, não deixa de ser profecia
de esperança e de resistência ver as pessoas superarem os muitos e justificados
motivos de tristeza e colocarem suas melhores energias na festa que, nesses
dias, organizam e vivem de forma tão comunitária e criativa.
Quem tem fé
aprende a valorizar esses costumes populares e pode neles vislumbrar sinais de
um tempo novo. Conforme os evangelhos, João Batista propôs a todos uma
renovação de vida baseada na justiça e na relação com a Terra e as águas. O seu
batismo era um rito inspirado na cultura e na religião popular do seu tempo e
significava uma ruptura com uma sociedade injusta e desigual, legitimada por
uma religião que tinha se tornado, quase somente cultual e baseada em normas
legalistas. João Batista propõe uma espiritualidade não apenas baseada no culto
e sim na Ética e na pratica da solidariedade (Lucas 3).
Ao ser
batizado por João no rio Jordão, Jesus se revelou discípulo de João profeta e
começou sua missão profética. Assim
também, podemos esperar que as pessoas que participam dos festejos que lembram
São João, homens e mulheres de várias Igrejas cristãs, assumam a missão de profetas
e profetizas de Deus que nos pede para construirmos uma sociedade irmanada em
uma humanidade renovada e renovadora.
Marcelo Barros, monge beneditino e escritor,
autor de 26 livros dos quais o mais recente é "O Espírito vem pelas
Águas", Ed. Rede-Loyola, 2003. Email: mostecum@cultura.com.
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