por Marcelo Barros
É o lema da Telesur, proposta
venezuelana de uma televisão dirigida aos países latino-americanos de língua
espanhola. De fato, enquanto as emissoras de televisão convencionais
privilegiam o olhar das agências de notícias norte-americanas e o interesse dos
senhores do mundo, a Telesur olha o mundo a partir do sul e da vida de nossos
povos. Com essa mesma proposta, já nos anos 70, o pensador francês Roger
Garaudy escreveu “O Ocidente é um acidente”, livro no qual ele propunha olhar o
mundo e a história a partir das civilizações do Oriente e das culturas do Sul.
Isso
soa estranho para quem se habituou a celebrar o Natal em pleno verão com neve
feita de algodão e a festejar ano novo no 1º de janeiro, em regiões nas quais o
solstício do inverno acontece em
junho. Não se trata só de uma mudança de visão cultural.
Hoje, isso significa também uma transformação social e política: olhar o mundo
a partir dos empobrecidos, reler a história não do ponto de vista oficial dos
vencedores, mas da resistência das vítimas e elas são os povos indígenas, as
comunidades afro-descendentes e os movimentos populares. Nessa linha, a cada
ano, na noite de 24 de junho, na fortaleza de Sacsayahuamán, a dois quilômetros
de Cuzco (Peru), os índios celebram o Inti
Raymi, em quétchua, “festa do sol”. Em outros lugares da cordilheira, o ano
novo andino é festejado durante essa semana. No Brasil, não se fala de ano novo
em junho, mas em várias regiões do país, os festejos juninos são os mais
importantes de todo o ano e, com suas fogueiras e danças, se constituem como
uma espécie de recriação do mundo.
Nesses dias, as atenções de toda
humanidade convergem para o Rio de Janeiro. Ali acontecem a conferência da ONU
sobre desenvolvimento sustentável (Rio 92+ 20) e a Cúpula dos Povos, evento que
reúne as organizações civis e os movimentos populares em defesa do planeta
Terra e da sustentabilidade. A conferência da ONU deveria anunciar ao mundo um
novo acordo em defesa da sustentabilidade planetária. Entretanto, há meses,
todos sabem que isso não vai acontecer. Apesar de estarem presentes no Rio mais
de cem chefes de Estado, as soluções propostas serão vagas e frágeis. Infelizmente,
cada vez mais os governos dependem das grandes corporações econômicas. Essas se
opõem a qualquer tipo de acordo que contrarie seus interesses de lucros sem
limites. A crise econômica que assola a Europa e os Estados Unidos deveria provocar
a busca de alternativas diferentes ao atual modelo de desenvolvimento social e
econômico. Entretanto, a elite dessa sociedade não aceita pensar outro caminho
econômico, nem outro modo de lidar com a natureza. Por isso, os governantes dos
países ricos não vêm à conferência da ONU e os funcionários por eles enviados
não têm autoridade para engajar seus países em um novo pacto mundial de defesa
da Terra, da água e do clima.
A esperança da humanidade se
alimenta do encontro da sociedade civil internacional na chamada “Cúpula dos
povos”. Nesse ciclo de diálogo, uma referência fundamental é justamente o bom
viver indígena, (sumak kwasay ou sumak kamana), conceito que significa a
plenitude da vida que todo ser humano busca na convivência uns com os outros e
na comunhão com a natureza.
Quem crê em Deus sabe que o seu
projeto é vida plena para todos. É essa vitória da vida sobre o desamor e a
injustiça eco-social que buscamos como nova bússola. No lugar de apontar sempre
para o norte, como fazem as bússolas convencionais, a esperança de uma nova
comunhão com a terra, a água e todos os seres vivos nos orienta para o sul como
horizonte de autonomia de nossos povos e se realiza a partir do projeto de integração
de todo continente latino-americano.
Nenhum comentário:
Postar um comentário