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terça-feira, 5 de setembro de 2017

O GRITO DOS EXCLUÍDOS E A ESPIRITUALIDADE


Por Marcelo Barros

No dia 7 de setembro, quando o Brasil comemora o aniversário da proclamação da sua independência, as organizações e movimentos populares se juntam para promover o Grito do/as Excluídos/as. Criado por iniciativa da Igreja Católica, o Grito é um contraponto ao ufanismo da parada militar e civil do Dia da Pátria e já está em sua 23ª edição. Com criatividade, bom humor e senso crítico, ele vem mostrar a realidade brasileira vista pelo avesso – a realidade da população mais pobre, cada vez mais marginalizada  excluída dos privilégios que a elite desfruta.
 O Brasil continua sendo, no mundo, um dos países campeões de desigualdade social. Atualmente, o governo e o Congresso brasileiro mexem impunemente na Constituição do país e retiram direitos assegurados dos índios, trabalhadores e aposentados. Tomam várias medidas que isolam o Brasil da comunidade das nações latino-americanas e entregam o petróleo e as riquezas do país às empresas multinacionais. Recentemente, o presidente da República comprou publicamente os congressistas para que esses fechassem os olhos às denúncias de crime e desvio de conduta ética do chefe do governo.
Mesmo se as pesquisas revelam que o presidente detém uma taxa de aceitação mínima por parte da população, não se veem grandes manifestações. Na internet, grupos espiritualistas afirmam: "Pare de reclamar. Valorize o que há de positivo e seja agradecido com o pouco". Essa mensagem não está de acordo com as antigas e mais profundas tradições espirituais. Na Bíblia, os profetas protestaram contra as injustiças e Jesus foi morto por ter denunciado as opressões do poder político e também do religioso. Em seu tempo, o profeta Isaías gritava: "Ai das pessoas que  chamam o mal de bem e consideram o bem como mal" (Is 5, 20).  Eticamente, não se pode aceitar o sofrimento de qualquer ser humano (e também dos outros seres vivos). É especialmente terrível o sofrimento causado pelas escolhas políticas que fazem os ditos representantes do povo. Cada vez mais, as políticas dependem da economia. Absolutizam o mercado e o lucro. Nos últimos tempos, os responsáveis por essas políticas perderam a vergonha. Tranquilamente provocam situações que criam refugiados, órfãos e uma multidão de excluídos. Apregoam como inevitável uma política sacrificial, que para garantir os privilégios de uma pequena elite condenam à morte milhões de pessoas. Zingmunt Bauman, pensador polonês, amigo do papa Francisco, afirmava que, assim como a segurança de um viaduto depende da solidez da viga mais frágil que o sustenta, também a saúde de uma sociedade depende de como está sua parte mais frágil, ou seja, a parcela mais empobrecida da população. A intuição dos movimentos sociais é que essa população tem de se organizar e lutar por seus direitos. Em todo o Brasil, as pessoas já falam nas eleições presidenciais e do Congresso que devem ocorrer no próximo ano. Recentemente, Frei Betto escreveu em um de seus artigos: "É  um erro jogar nas eleições todas as fichas da nossa esperança em um Brasil melhor. O mais importante é investir no empoderamento popular. Reforçar os movimentos sociais e sindicais, intensificar o trabalho de formação política e consciência crítica, dilatar os espaços de pressão, reivindicação e mobilização. Só conseguiremos mudanças significativas se vierem de baixo para cima".
É responsabilidade de toda pessoa comprometida com a paz e a justiça, apoiar e participar dessas manifestações de cidadania. Nesse 07 de setembro, o 23º Grito dos/as Excluídos/as tem como tema “Vida em primeiro lugar!” e como lema “Por direitos e democracia, a luta é todo dia”. Assumir, hoje, esse caminho de Jesus significa participar das lutas pacíficas e das manifestações dos movimentos sociais, organizados por um mundo mais justo e mais irmão.


Marcelo Barros, monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades eclesiais de base e de movimentos populares. É coordenador latino-americano da ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45 livros publicados no Brasil e em outros países 

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