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terça-feira, 1 de dezembro de 2020

O ADVENTO DA ECONOMIA DE FRANCISCO E CLARA


 


Marcelo Barros

 

Neste domingo, as Igrejas antigas iniciaram um novo ano litúrgico com o tempo do Advento. Tradicionalmente, o objetivo destas quatro semanas que nos preparam à festa de Natal é fortalecer a esperança na realização do projeto divino e celebrar o Natal de cada ano como sinal de renovação em nossas vidas e na forma de organizar o mundo.

Há uma semana, aconteceu em Assis, na Itália, o encontro do papa Francisco com mais de 2000 jovens economistas do mundo inteiro. O objetivo era pensar juntos novo modelo econômico que una sustentabilidade ecoplanetária, justiça social e viabilidade para as ciências e novas técnicas que se abrem para o futuro. O papa propôs uma economia que parta das necessidades dos empobrecidos do mundo e garanta a todos e todas as necessidades básicas como terra, trabalho e teto.

A primeira vitória deste encontro foi ter provado a falsidade do dogma neoliberal. Sempre se repetia que não há alternativas e o mundo tem de ser assim mesmo. O encontro da juventude em Assis sobre economia mostrou o contrário: há diversas alternativas. Outra grande vitória é que provavelmente é a primeira vez no mundo em que um encontro internacional deste porte não se concentra em ouvir os cientistas mais renomados. Os protagonistas do encontro foram rapazes e moças com menos de 35 anos de idade. O encontro foi exemplo de diálogo intergeracional.

No Brasil, por mais de um ano, este encontro da juventude com o papa sobre Economia foi preparado e discutido. Concretamente, deste processo de preparação, surgiram algumas propostas. Eis algumas:

1) retomar o esforço de um grande mutirão de educação popular, baseado na participação de todos, no diálogo e na consciência dos desafios a serem enfrentados por toda a sociedade.

2) compreender que a economia de tal forma é essencial a todos os seres humanos que não pode ser deixada apenas à responsabilidade dos técnicos e especialistas.

3) desenvolver e aprofundar os projetos de economia solidária.

4) assegurar uma renda básica universal,  como direito de todos os cidadãos e cidadãs de cada país.

5) ajudar todas as pessoas a perceberem que esta nova forma de organizar a economia é expressão de uma espiritualidade  ecumênica e humana. Isso vai além das religiões e possibilita a integração maior do ser humano com todos os seres vivos do planeta.

Para compreendermos melhor: A renda básica é totalmente viável desde que se crie um fundo específico que pode ser alimentado com recursos oriundos de impostos progressivos e da taxação de grandes lucros e fortunas.

Não se trata de uma solução mágica e total, mas pode eliminar a pobreza extrema. Liberta as pessoas de trabalhos aviltantes e ajuda a que os salários não sejam sempre puxados para baixo.

Sobre a economia solidária: Trata-se  de um conjunto de iniciativas que abrange cooperativas, empresas recuperadas,  ou em reabilitação de processos falimentares. Nela cabem pequenos empreendimentos associativos, bancos comunitários e associações locais de troca de mercadorias e serviços. Muitas destas iniciativas desenvolvem moeda própria. Este tipo de economia, baseada na autogestão, é fundamental no processo de verdadeira democratização da sociedade.

 O orçamento participativo foi experiência nas primeiras gestões do PT no Brasil. Reúne as populações de bairro em plenárias para discutir e deliberar sobre a destinação de recursos orçamentários. Trata-se de um exercício de democracia participativa. Exige vontade política dos gestores e certa organização popular para se exercer o diálogo social e político.

Considerar a economia como dimensão importante da espiritualidade é levar em conta que não se pode dividir a vida em departamentos separados. A economia não se restringe aos bens duráveis e de consumo, além de serviços. Há fatores espirituais, próprios da condição humana que devem ser levados em conta e aprofundados. A economia deve ajudar as pessoas a serem solidárias e a construir um mundo baseado no cuidado mútuo e na comunhão com a natureza.

Assim, a economia de Francisco e Clara se torna elemento fundamental de uma abertura da sociedade internacional e de cada povo à realização mesmo sempre em processo e parcial de um programa que as diversas tradições espirituais creem ser divino: possibilitar o natal de uma humanidade nova.

 Marcelo Barros, monge beneditino e escritor, autor de 57 livros dos quais o mais recente é "Teologias da Libertação para os nossos dias", Ed. Vozes, 2019. Email: irmarcelobarros@uol.com.br

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