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sábado, 1 de outubro de 2022

A Mulher Guerreira, o Santo Rebelde, o Educador dos Oprimidos e o Operário Presidente

 Prof. Martinho Condini  


 

Em 1934, 1909, 1921 e 1945, nos estados da Paraíba, Ceará e Pernambuco nasceram quatro crianças em famílias humildes, e enfrentaram os problemas típicos das famílias brasileiras: esforço para a sobrevivência e o sustento da família, criação e formação escolar dos filhos.

A jovem e os três rapazes seguiram seus caminhos a partir de suas realidades sociais, histórias de vida e lugares de fala.

A história da Mulher Guerreira, do Santo Rebelde, do Educador dos Oprimidos e do Operário Presidente nos serve de exemplo, primeiro pela dificuldade de serem compreendidos pela sociedade brasileira, principalmente a elite. Segundo pela perseguição que enfrentaram dos seus opositores, no campo social, religioso, educacional, sindical e político. E terceiro pelo legado que nos deixaram a partir de seus feitos em benefício do povo brasileiro.

O mais incrível é que as pessoas que discordam das ideias e práticas de um dos quatro,   consequentemente não aceitam também as dos outros três. E as pessoas que admiram um deles, isso se repete com os outros três, isso reforça a similaridade que existe entre esses quatro personagens e protagonistas da história brasileira e mundial no século XX e XXI, principalmente em se tratando da história da sociedade brasileira. 

 

A Mulher Guerreira

Essa Mulher Guerreira representa a força e coragem das mulheres brancas, afrodescendentes, quilombolas, indígenas, oprimidas e excluídas da nossa sociedade.

Quando criança trabalhava vendendo os deliciosos bolos feitos por sua mãe, em sua cidade natal Uiraúna, na Paraíba. Em sua cidade na década de 1940 não havia 6ª série na escola, então ela foi obrigada a fazer a 5ª série duas vezes porque não queria parar de estudar. 

Por meio da sua militância na igreja católica progressista na década de 1950, ainda jovem, tornou-se diretora de Educação e Cultura da prefeitura de Campina Grande, na Paraíba. E em 1964 (ano do golpe militar) foi nomeada Secretária da Educação da mesma cidade.

Ela se formou em Serviço Social na UFPB em 1967 e na década de 1970 foi uma das principais colaboradoras na fundação da Faculdade de Serviço Social em Campina Grande.  

Na década de 1970, teve uma atuante militância na Pastoral da Terra, sendo uma ferrenha opositora da ditadura militar nos “Anos de Chumbo”. Naquela época a participação da mulher na política era muito pequena, mas ela estava lá, destemida, enfrentando os militares, o fim das torturas, da censura e pela retomada da democracia e comprimento dos direitos humanos em nosso país.

Mudou-se em 1971 para a cidade de São Paulo, onde iniciou uma carreira como assistente social e uma incansável luta ao lado dos movimentos populares periféricos da metrópole paulistana por melhores condições de saúde, moradia e educação.

A sua garra, caráter, força e sensibilidade feminina a transformaram numa liderança política; uma voz das periferias por justiça social e condições dignas para todas e todos os cidadãos e cidadãs da paulicéia desvairada.

A sua atuação incisiva nas políticas públicas em prol das populações mais carentes levou-a a vereança na década de 1980 e posteriormente à assembleia legislativa.

Mas foi em 1988 que brilhantemente ela surpreendeu a elite conservadora paulistana, numa virada histórica, derrotando o principal líder e representante político da direita em São Paulo na época, nas eleições municipais, tornando-se a primeira mulher prefeita da maior cidade da Latina América.

 A participação popular por meio dos conselhos municipais foi a marca do seu governo. Durante todo o seu mandato sofreu uma forte oposição, mas sempre firme e segura em suas decisões, deixou legados incontestes, principalmente na assistência social, na saúde, na moradia, na educação e no transporte público da cidade de São Paulo.

Com brilho no olhar azul, carisma, sinceridade, vivacidade, brio e decência, essa arretada e arrochada nordestina realizou a mais democrática e competente administração da cidade de São Paulo.

Após o mandato de prefeita, ela foi ministra de Estado e parlamentar federal com mandatos consecutivos. Atualmente tê-la no congresso nacional é a garantia que os pequeninos, oprimidos e excluídos do nosso Brasil jamais serão esquecidos, abandonados e desassistidos.

Mulher Guerreira, nordestina e socialista! Uma estrela imprescindível na constelação da nação brasileira!

 

O Santo Rebelde

O Santo Rebelde, miúdo de gestos largos e fala forte e incisiva, fez da sua vida uma luta em favor dos pequeninos, como gostava de chamar os excluídos e oprimidos da nossa sociedade.

 Na década de 1920, na cidade de Fortaleza criou o primeiro sindicato de trabalhadoras mulheres (empregadas domésticas) do Brasil.

Na cidade do Rio de Janeiro, entre às décadas de 1940 e 1950, idealizou e fundou a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e também teve participação direta na criação da Conferência Episcopal Latino Americana (CELAM). Foi a principal voz latino americana e brasileira no Concílio Vaticano II (1962-1965), uma das principais vozes na Conferência Episcopal Latino Americana de Medellín (1968), um dos precursores da criação da “Igreja do Pobres”, das “Comunidades Eclesiais de Base” (CEBs), da corrente teológica “Teologia da Libertação”. Criou a Cruzada São Sebastião, conjunto habitacional com 10 prédios, que na época abrigou os moradores da favela Praia do Pinto e Morro Azul, no bairro do Leblon. Fundou a Cáritas brasileira, criou o Banco e a Feira da Providência, a Comunidade de Emaús e participou da organização do Movimento de Educação de Base (MEB).

Em 1964, enquanto ocorria o golpe militar, o Santo Rebelde foi transferido para Pernambuco, como arcebispo de Olinda e Recife, onde permaneceu até o seu falecimento em 1999.   

Em Recife, foi o idealizador e fundador do “Movimento Esperança”, uma ação orquestrada por ele para ajudar as pessoas mais necessitadas e excluídas de Recife, grande Recife e posteriormente expandiu-se para outras regiões do estado de Pernambuco.  

O Santo Rebelde se tornou a mais importante voz contra o regime ditatorial no Brasil. Foi o primeiro brasileiro a falar no exterior que no Brasil havia censura, tortura e morte. Foi calado por quase dez anos; os militares impediram que os órgãos de imprensa o entrevistassem ou mencionassem o seu nome. Sua voz foi calada no Brasil, mas ecoou mundo a fora, tornando-se “a voz de quem não tem voz”. A igreja onde morava foi metralhada por várias vezes. E ele não foi assassinado pela ditadura porque era uma liderança conhecida nacional e mundialmente pela sua incansável luta por justiça social e pelos direitos humanos. Por quatro vezes seguidas, por intervenção do Itamarati, não recebeu o “Prêmio Nobel da Paz”.   

O Santo Rebelde foi a principal liderança da igreja católica progressista no Brasil e na América Latina na segunda metade do século XX.

O Educador dos Oprimidos

O Educador dos Oprimidos, sensível às causas sociais, principalmente no que se refere à educação e alfabetização de jovens e adultos; no final da década de 1950, por meio de sua  práxis pedagógica realizou com outros educadores um processo de alfabetização de adultos na cidade de Angicos, no Rio Grande do Norte. Esse processo criado e coordenado pelo Educador dos Oprimidos foi revolucionário, sendo até hoje pesquisado e praticado por muitas educadoras e  educadores no Brasil e outros países.   

         O processo de alfabetização criado pelo Educador dos Oprimidos tem como base uma educação libertadora, onde a leitura de mundo das crianças, jovens e adultos os levam a compreensão de sua realidade e a partir daí eles podem modificá-las e sair da condição de oprimidos e excluídos da sociedade, assumindo seus papéis de agentes da  história.

         Por isso, o governo brasileiro, entre os anos de 1963 e 1964, convidou o Educador a coordenar e implantar o Programa Nacional de Alfabetização (PNA), com o intuito de alfabetizar milhões de brasileiros.

         Mas, assim que ocorreu o golpe militar em 1964, e instaurada a ditadura, o programa de alfabetização foi abortado e o Educador dos Oprimidos foi exilado do Brasil, retornando apenas em 1980. Neste período de dezesseis anos trabalhou no Chile, Estados Unidos, Suíça e vários países da África, aplicando a sua práxis alfabetizadora.

         Neste período escreveu vários livros. Um deles se tornou o esteio de sua filosofia e prática educacional, Pedagogia do Oprimido,  sendo o terceiro livro mais lido no mundo na área das ciências humanas.

         Após o seu retorno ao Brasil, construiu um legado a partir da sua prática como educador, professor universitário, pensador da educação e escritor. A sua maneira sempre muito amorosa, sincera e cativante de lidar com as pessoas foi algo peculiar.

         Hoje, o Educador dos Oprimidos é reconhecido mundialmente. Vários países adotam suas práticas educacionais para formar as suas crianças, jovens e adultos. Mesmo após o seu falecimento em 1997, ele inspira milhares de educadoras e educadores do Brasil e do mundo. Atualmente é o patrono da educação brasileira e indiscutivelmente foi o mais importante educador da história do Brasil e um dos mais importantes do mundo.  

 

O Operário Presidente

O Operário Presidente teve a mesma história de milhões de nordestinos. Ainda criança vem com sua mãe e irmãos, de pau de arara, para São Paulo. Na infância pobre, ajudou no sustento da família, trabalhou como vendedor de amendoim, laranja, auxiliar de tinturaria, telefonista e bicos como engraxate. Adolescente, faz um curso de torneiro mecânico e torna-se operário da indústria na grande São Paulo.  E assim foi seguindo a sua vida, constituindo família, criando filhos e sempre na luta pela sobrevivência.

Ao final da década de 1960, despolitizado, ingressou na diretoria do sindicato da sua categoria profissional.  Mas no decorrer dos anos foi compreendendo a relação de exploração entre o capital e o trabalho. 

Em 1975, em plena ditadura militar se torna presidente do sindicato e junto com outros companheiros constrói um “novo sindicalismo”. Um sindicalismo de luta em defesa da classe trabalhadora.

Ao final da década de 1970 e começo da década de 1980, o Operário Presidente lidera as maiores greves de trabalhadores da história do Brasil na região do ABC na grande São Paulo, assembléias com mais de 150 mil trabalhadores, em um período em que greves de trabalhadores eram proibidas pela ditadura militar.

A truculência do governo militar lhe custou várias prisões, mas isso não o fez esmorecer, e a sua luta pela melhoria das condições de trabalho refletiu em outras categorias profissionais. O Operário Presidente tornou-se uma liderança nacional para as trabalhadoras e trabalhadores deste país. 

No início da década de 1980, o Operário Presidente percebe que a sua luta não era mais apenas ao lado da sua categoria profissional, mas uma luta a favor dos oprimidos e excluídos da sociedade brasileira. Então funda um partido político, o Partido dos Trabalhadores (hoje o maior partido progressista de esquerda do mundo), com o apoio de operários, camponeses, sindicalistas, intelectuais, representantes da igreja progressista, militantes de esquerda e de movimentos populares.

O Operário Presidente se tornou a principal liderança política do Brasil dos últimos 40 anos em nosso país. Após quatro eleições presidenciais, tornou-se presidente da república por dois mandatos seguidos; em 2002 eleito com mais de 52 milhões de votos e em 2006 com mais de 58 milhões votos. Em seu governo, o Brasil, que era a 13ª potência econômica do mundo, tornou-se a 6ª, segundo o banco mundial. Também, em seu governo foi instituída a maior política de inclusão social da história desse país, possibilitando a milhões de pessoas ter um emprego, tomar café da manhã, almoçar e jantar com suas famílias. Além disso, fez com que mais de 36 milhões de pessoas saíssem da condição de miseráveis e milhares de jovens ingressassem no ensino superior e conquistassem melhores empregos e condições de vida.

O Operário Presidente com seu carisma, sua sensibilidade e inteligência, tornou-se o mais popular e melhor presidente da história da nossa república.

Em 2018, o Operário Presidente foi injustamente preso pela Operação Lava Jato, assim foi impedido de disputar as eleições. Após 580 dias na prisão, foi solto e seus processos foram anulados pelo STF, que alegou abuso de poder da Operação Lava Jato.

E hoje o Operário Presidente está liderando as pesquisas eleitorais e quem sabe tornar-se  pela terceira vez presidente do Brasil. 

 

Quatro por quatro

Estou convencido que este quarteto dignifica a história do nosso país: a Mulher Guerreira, Luiza Erundina; o Santo Rebelde, Dom Helder Camara; o Educador dos Oprimidos, Paulo Freire e o Operário Presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, oriundos de uma mesma raiz, irmanados pela mesma nordestinidade caracterizam-se pela coragem, valentia, caráter e perseverança.

A busca de cada um, ao seu modo pela justiça social, pelos direitos humanos, pelo respeito ao outro e pela dignidade para todos os pequeninos, oprimidos e excluídos, brasileiros e latino americanos, sintetiza o primor desses quatro arrochados e arretados personagens da nossa história.

Enfim, Luiza, Helder, Paulo e Lula carregam consigo a verdadeira brasilidade e o esperançar na construção de um Brasil genuinamente brasileiro. Protagonistas na história da igreja, da educação, do sindicalismo e da política brasileira, eles merecem todo o nosso respeito. Viva a liberdade, a democracia e as brasileiras e brasileiros comprometidos com o nosso povo!

        

           

 

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