Marcelo
Barros
As religiões,
instituições civis e até partidos políticos pedem a seus adeptos disciplina
comunitária e capacidade de obedecer às normas vigentes. Na família, os pais e
na escola, os/as professores/as esperam obediência de seus educandos. De fato, obedecer
é uma virtude e tem valor, mas não significa submeter-se à vontade alheia, nem
menos ainda, executar mecânica ou irresponsavelmente aquilo que é ordenado.
Depois da segunda guerra, nenhum tribunal internacional aceitou absolver algum
oficial nazista por foi este alegar que cumpria ordens. Ninguém deve obedecer a
ordens que sejam contra a sua consciência. Obedecer vem do verbo latino obaudire que significa “escutar
interiormente”. Então, a verdadeira obediência é a capacidade de escutar a
palavra do outro, levá-la a sério, mas, depois, agir de acordo com a sua
consciência.
Por isso, desde algumas
décadas, a própria Organização das Nações Unidas (ONU) consagra o 15 de maio
como “o dia mundial da objeção de consciência”. Assim, fica claro que toda pessoa tem o
direito de desobedecer, quando a ordem dada se opõe à sua consciência. Em
Israel, jovens recrutados ao serviço militar invocam a objeção de consciência
para se negar a combater palestinos ou queimar casa de pessoas pobres, ato
comum perpretado pelas tropas de ocupação israelita. Nos Estados Unidos, por
objeção de consciência, muitos jovens se negam a invadir outros países. E
diante do Congresso, militantes pacifistas foram presos por rasgarem publicamente
o documento de incorporação militar.
A sociedade
considera “objeção de consciência” a atitude de quem, por convicção religiosa,
social ou política, se nega a pegar em armas e a participar de guerras e atos
violentos. Objetar é opor-se a cumprir uma lei que fere a nossa consciência. A
violência, seja cometida por uma pessoa individual, seja institucional, ou
cometida pelo Estado, nunca construirá um mundo de paz e justiça. Nos mais
diversos continentes, grupos religiosos e civis se negam a pegar em armas e exigem
substituir treinamentos militares por ações pacíficas. Fazem serviço civil no
lugar do serviço militar obrigatório e a lei reconhece esse direito.
Em alguns países,
cidadãos exigem saber a destinação exata do pagamento de seus impostos. E não
aceitam pagar impostos se o dinheiro for aplicado em sociedades que fabricam
armas ou investem em negócios anti-éticos. Em todo o mundo, há consumidores que
não compram carne de fazendas que destroem florestas e dizimam a natureza.
De fato, no
decorrer da história, a humanidade têm progredido mais pela ação de pessoas que
ousam desafiar as leis e inovar os costumes, do que através daquelas que
simplesmente seguem os caminhos convencionais. Líderes espirituais romperam com
o sistema e desobedeceram às autoridades constituídas. Homens e mulheres,
admirados no mundo inteiro, alguns até premiados com o Nobel da Paz, durante
muito tempo, foram considerados como rebeldes e desobedientes em seus
países. No passado, Gandhi e Martin Luther King foram
presos e condenados como desobedientes às leis oficiais. Na África do Sul,
Nelson Mandela passou 20 anos na prisão como subversivo e desobediente às leis
do país. Para os budistas tibetanos, o Dalai Lama, é a 14a
reencarnação do Buda da Compaixão. No entanto, para o governo chinês, é um
dissidente, desobediente às leis. Na América Latina, o prêmio Nobel da Paz foi
dado a Rigoberta Menchu, índia maya que, durante anos, viveu exilada da Guatemala e a Adolfo
Perez Esquivel, advogado que, por muito tempo, era constantemente ameaçado de
prisão na Argentina. No tempo da ditadura militar, o arcebispo Dom Hélder
Câmara, escutado no mundo inteiro, era censurado e considerado subversivo m nosso
país.
A Constituição brasileira
garante aos jovens o direito da objeção de consciência. Ninguém pode ser
obrigado a fazer serviço militar ou, como policial usar violência contra outra
pessoa. Entretanto, as leis complementares até agora ainda não foram
sancionadas. Por isso, esse direito ainda não pode ser verdadeiramente exercido.
A ONU consagra essa semana para divulgar essa informação e tornar conhecido o direito
que toda pessoa tem de se negar a pegar em armas, ou cometer algum ato violento
contra alguém.
Mais do que
qualquer poder social e político, as religiões e Igrejas deveriam reconhecer o direito
à dissidência e à objeção de consciência diante de um poder religioso
autoritário ou, por qualquer razão, injusto. Conforme a Bíblia, quando as
autoridades de Jerusalém proibiram os apóstolos a falar no nome de Jesus, estes
responderam: “Entre obedecer a Deus e aos homens, é melhor obedecer a Deus. Por
isso, nós desobedecemos a vocês”(At 5, 29).
Marcelo Barros,
monge beneditino e autor de 45 livros, entre os quais "A Festa do Pastor", romance sobre
o Pentecostalismo. (Ed Rede- Goiás).
Nenhum comentário:
Postar um comentário