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domingo, 9 de agosto de 2020

CIRANDA DO PROFETA HOMENAGEM A DOM PEDRO CASALDÁLIGA


Frei Aloísio Fragoso

 

    Partiu para a eternidade D. Pedro Casaldáliga. Viveu mais tempo do que é comum aos grandes profetas, 92 anos. Se me perguntarem quem foi ele, não duvidarei em responder: um dos maiores bispos da Igreja Católica em todos os tempos. Pastor e poeta, armado de um fé indomável e de uma bravura à toda prova.

     Santo Agostinho, bispo de Hipona, no século V, escreveu uma vez  aos seus fiéis: "para vocês sou o bispo, com vocês, sou um cristão".

    D. Casaldáliga foi para nós e conosco pastor, cristão, cidadão, irmão, profeta e mártir. Enfrentou todas as tensões dos anos de chumbo da ditadura. Houve um momento em que sentiu que a Cúria Romana poderia ceder às pressões dos ditadores, querendo afastá-lo do Brasil; ele antecipou-se, e declarou que não abandonaria seu rebanho. Se não pudesse ficar como bispo, ficaria como padre, se não lhe fosse permitido ficar como padre, ficaria como leigo. E ficou.

    No entanto, o melhor de sua Fé e de suas forças ele reservou para a defesa dos pobres e humilhados. Hoje acredito no que estou imaginando: D. Pedro encontrando-se com seu xará na portaria do céu, e ouvindo dele estas palavras: "bem-aventurados os que tem fome e sede de Justiça, porque deles é o Reino de Deus".

     Certa vez, passando pelo Recife, aceitou humildemente um convite do "Movimento de Mulheres Contra o Desemprego"  fazer uma palestra, no pátio do Convento de Santo Antônio. Aí cantamos e dançamos esta ciranda, que reproduzimos em sua homenagem.

 

CIRANDA DO PROFETA

 

Dom Casaldáliga,

Nosso amigo e companheiro,

Espanhol por nascimento,

Por direito, brasileiro.

Humilde e magro,

Pequenino pelo porte,

A verdadeira grandeza

"Conquistou com braço forte."

 

Bispo do povo,

Recusou todo adereço,

E vestiu a veste humilde

Que tem da pobreza o preço.

Pastor dos pobres,

Dos mais pobres fez-se amante,

E lhe deu a sua voz

E "seu brado retumbante".

 

Dos humilhados

Defensor, bravo guerreiro,

Nas campinas do Araguaia,

Do Brasil, do mundo inteiro.

O tempo passa,

Passa a vida, passa a idade,

Só não passa a luz que brilha

Com "o sol da liberdade".

 

Dom Casaldáliga,

Temido e ameaçado,

Difamado, perseguido,

Jamais atemorizado.

Não foge à luta,

Não recua, não se cansa,

Vê no sangue derramado

"O pendão da esperança".

 

Grande poeta,

Da beleza ele desfruta,

Fez da luta poesia,

Fez da poesia, luta.

Grande profeta,

Não quer honras nem grandeza,

Mas na luta é um "gigante

Pela própria natureza".

 

Foi convidado

Em nome da falsa paz,

A sair da luta aberta,

Deixar tudo para trás.

Mas respondeu:

A justiça é minha lei,

Seja bispo ou seja padre,

Ou seja leigo, ficarei.

 

E foi ficando,

Foi fazendo a nossa história,

Devolvendo aos humilhados

Seus direitos, sua glória.

Pastor querido

Te tornaste amigo nosso,

Sem perder tua ternura,

És "impávido colosso".

 

És brasileiro,

És latino-americano,

És zumbi, és guarani,

Nosso guia, nosso mano.

Tua bravura,

Utopias, lutas mil,

Serão "sol de um novo mundo

No horizonte do Brasil".

(Frei Aloísio Fragoso)

 

Frei Aloísio Fragoso é frade franciscano, coordenador da Tenda da Fé e escritor.

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