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domingo, 7 de março de 2021

"FORÇA E FRAQUEZA EM TEMPOS DE CORONAVIRUS"

 FREI ALOÍSIO FRAGOSO


(04/03/2021)

 

     Nestes tempos difíceis que estamos atravessando, vez por outra encontramos pessoas contagiadas por um virus perigosíssimo. Trata-se do sentimento de impotência. Estas pessoas vêem as forças adversas como invencíveis e a si mesmas como "um nada". Sentem-se travando uma batalha de forças desiguais, mas não é um desigual qualquer, é um desigual  semelhante ao do pescoço contra a guilhotina.

        Isso afeta de modo particular muitos que se empenham numa luta sublime, por um outro mundo possível e melhor do que este, por um país igualitário e bem sucedido. Que podem seus gritos de protesto nas ruas contra um Chefe desvairado, que se gaba de anular séculos de direitos humanos com uma simples caneta na mão?

     O sentimento de impotência atrai uma legião de demônios: o desânimo, o isolamento, o ceticismo e a pior das alienações  que é alienação consciente de si mesma.

     A estas pessoas eu diria que não são exceção e não se tornam por isso menos humanas. Deste sentimento não escaparam nem os maiores gênios nem os maiores santos e santas. Na verdade, nunca existiu uma História de "Grandes Homens" e "Grandes Mulheres". A única História real é feita de "pequenos-grandes-homens-e pequenas-grandes-mulheres". Senão vejamos:

     O grande imperador e estadista romano César Augusto, tendo dilatado e consolidado o maior império da terra, tentou moralizar Roma. Como um governante sensato, compreendeu que a queda de todos os impérios começa com a decadência moral. Fracassou redondamente no seu intento. Não adiantou desterrar para uma ilha deserta sua filha Júlia, por causa de escândalos morais; nem valeu a pena banir de Roma sua neta, pelos mesmos motivos. A Roma de todos os vícios não cedeu. Augusto carregou até o fim da vida o desgosto desta sua impotência. Já idoso, ansiava pela morte, que lhe veio aos 76 anos. "Já que desempenhei bem meu papel, batei palmas, mas, no meio dos aplausos, dispensai-me do palco", confidenciou aos amigos nos seus dias finais. Grande pequeno homem!

 

     Maior que César Augusto foi  Leonardo da Vinci, pelo seu legado à posteridade, reconhecido como um dos mais criativos cérebros da História. O excesso de saber foi-lhe motivo de glória e tragédia. Obcecado pela perfeição, concebeu mil projetos e executou somente alguns. "Nunca terminei nenhum trabalho", confessou amargamente no fim da vida. "Quando pensei que estava aprendendo a viver, estava aprendendo a morrer". Seu sepultamento foi acompanhado por um carpidor profissional e alguns poucos fiéis criados. Grande pequeno homem!

    Quem já não ouviu falar de Isack Newton, o famoso físico inglês, criador de leis e princípios usados no estudo da dinâmica dos corpos, que levaram à lei da gravitação universal? Graças à sua fama, foi eleito para o Parlamento da Inglaterra. Enquanto ali esteve, não passou de uma presença inútil. Na tentativa de reeleger-se, foi fragorosamente derrotado. Professor na Universidade, seus alunos retiravam-se da classe, um por um, por não suportar a monotonia das aulas. O homem poderosíssimo em lidar com o Universo, era impotente numa sala de aulas!

     Falemos também dos santos. Sto. Agostinho, gênio do Cristianismo, incomparável teólogo, o pensador mais brilhante do seu século. Depois de sua conversão à Fé cristã (tinha 32 anos), não conseguiu conviver em paz com o seu passado: mandou para longe sua antiga  amante (quem se retira não é o incomodado?) e ficou com o filho. Quando este morreu, ainda jovem, dedicou-lhe páginas de grande beleza. No entanto, quando lemos estas páginas, ficamos em dúvida, se ele chora pela morte do filho que amava ou se está aliviado por não ter que conviver com o que ele chamava "filho do meu pecado". Ele mesmo lhe dera o nome de Deodato (dado por Deus). "Cedo o levaste desta terra, ó Deus, e com a lembrança dele sinto maior segurança do que a teria com a sua vida". "Confissões" IX, 6,14.) Os grandes santos também pagam tributo à sua condição humana de grandeza e pequenez.

     Finalmente eu gostaria de reunir todos estes personagens para um confronto com uma mulher admirável do nosso tempo, que enfrentou o mais temível de todos os sentimentos de impotência. Santa, canonizada pela Igreja e pelo mundo. Na próxima Reflexão a invocaremos pelo nome e com ela iremos até Aquele que nos apontará onde se escondem as armas  eficazes para vencer todo sentimento de impotência. Amém.

Frei Aloísio Fragoso é frade franciscano, coordenador da Tenda da Fé e escritor.

 

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