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sábado, 29 de maio de 2021

SANIDADE E LOUCURA, EM TEMPOS DE CORONAVIRUS

 FREI ALOÍSIO FRAGOSO


(28/05/2021)

 

     Poucas palavras são tão polivalentes como a palavra loucura em nossa língua pátria. Se alguém nos chamar de louco, precisamos decifrar a sua intenção no olhar ou no tom da voz, pois podemos estar  sendo alvo de repreensão ou de consternação ou de admiração. Há loucos de hospício, loucos de paixão, loucos de Deus e até loucos de "faz de conta".

     Entre os antigos latinos, dizia-se proverbialmente "quando os deuses querem destruir alguém, primeiro o enlouquece". No entanto, S.Paulo escreve aos coríntios: "por causa de vocês, procuro ser prudente, mas, por Deus, cometo loucuras" 2Cor 5,13. Para a grande mística Sta.Teresa D'Ávila, "sem o tempero da loucura, todo amor é insípido". E o mais universal dos santos, S. Francisco de Assis, definia-se como um louco por inspiração divina: "O Senhor me chamou a ser um novo louco no mundo". Por conseguinte, de perturbação mental à mais elevada mística, a loucura percorre todo o escalão do comportamento humano.

 

     Às vezes temos a impressão de que tornar-se louco, vez por outra, é uma necessidade básica para permanecer são neste vasto campo de insanidades em que se converteu nosso mundo atual. É uma forma de tornar a realidade suportável. No campo das relações cotidianas,  não é nada agradável conviver com gente sem humor, sem sal, sem graça, sem verve, sem o tempero da loucura. Talvez se encontre mais gente deprimida por excesso de normalidade do que por eventuais loucuras. Outras horas temos dúvidas se este mundo merece nossa lucidez, se não seria mais sadio estirar-lhe a língua, como no famoso retrato de Einstein. De qualquer forma, uma vida sensata não tira o direito à loucura. "Há tantos loucos felizes!", exclama a poetisa portuguesa Florbela Spanca.

     No Evangelho, Jesus apresenta um critério simples e sábio, capaz de discernir os diversos estados de loucura e assim livrar-nos dos psicopatas, "pelos seus frutos os conhecereis" Mt. 7,16.

    Os impulsos loucos de Paulo, de Teresa D'Ávila, de Francisco de Assis, redundaram em santidade, não de uma hora, de um dia, mas da vida inteira, culminando com a mais convincente de todas as loucuras: eles deram a vida por amor.

       Nas últimas décadas tivemos oportunidade de conhecer algumas figuras que se projetaram na política por discursos inflamados, em tom de "loucura". Em pouco tempo desapareceram no meio das sombras. Seu discurso não tinha consistência prática. Era mera retórica. De eminentes candidatos a Presidente do país, regrediram à condição de candidatos não eleitos para a Câmara de vereadores em sua terra natal.

 

     Em negrito queremos destacar alguns heróis e heroínas, que foram tomados da "loucura profissional", nem por isso menos santa, de por em risco suas vidas pela saúde de outros. O coronavirus pôs às claras estes exemplos de muitos profissionais da saúde.

 

     Toda esta variedade de significados nos deixa atônitos pela seguinte questão: é possível que loucos insanos assumam o comando de uma nação? E toda a população fique à mercê de suas insanidades? - sem dúvida, a História o comprova com frequência. Como discerni-los? "Pelos seus frutos os conhecereis".

 

     Veja-se a real condição da vida do povo. Avalie-se o clamor mudo e impotente dos pobres. Observe-se o ar de desdém de pequenos grupos dominantes. E compreenda-se uma coisa: silenciar é tornar mais poderosa a voz dos loucos.

 

     O caminho de solução se abre à vista de quem tem olhos para ver: o exercício da cidadania, o grito da indignação, o convite para as ruas e praças, o convencimento porta à porta, o tiro certeiro do voto, o poder da Fé no Deus da Justiça.

 

    Um dia Jesus foi colocado diante deste impasse e não vacilou em declarar: "não vim ao mundo trazer a paz e sim a espada" Mt.10,34. Decerto Ele não se refere à espada que derrama sangue irmão, mas à espada inquebrável de quem teima, avança, persevera, sacrifica-se, não se cansa, porque "sabe em quem pôs a sua confiança" 2 Tim.1 12.

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