O Jornal On Line O PORTA-VOZ surgiu para ser o espaço onde qualquer pessoa possa publicar seu texto, independentemente de ser escritor, jornalista ou poeta profissional. É o espaço dos famosos e dos anônimos. É o espaço de quem tem alguma coisa a dizer.

sábado, 22 de janeiro de 2022

A religião e o futebol são o ópio do povo

 


Prof. Martinho Condini


 

A Copa São Paulo de Futebol Júnior, conhecida como "Copinha", é a maior competição de futebol júnior do Brasil, disputada por clubes juniores de todo o país. Ela começou em 1969, e só não foi realizada em 2021 por causa da pandemia.  Organizada pela Federação Paulista de Futebol, este ano é 52ª edição. Ela disputada em cidades do Estado de São Paulo e a final acontece sempre na capital paulista no dia 25 de janeiro, data de aniversário da cidade de São Paulo.

Ao ler uma reportagem da Folha de São Paulo, sobre a “Copinha”, fiquei sabendo que este ano participa um time da cidade de Irecê, no interior da Bahia, o Canaã Esporte Clube, que possui um centro de treinamento, construído a beira da BA-052, Estrada do Feijão.

Lá, os atletas têm escola, cinco refeições, são acompanhados de nutricionistas, há cinco campos de treinamento à disposição e departamento de fisioterapia. Uma estrutura compatível aos grandes clubes do Brasil. Sem sombra de dúvida uma estrutura que possibilita esses jovens se alimentarem, estudarem e quem sabe galgar a tão sonhada profissionalização como jogador num grande time do futebol do Brasil. O Canaã Esporte Clube está integrado a um projeto social que oferece educação e assistência social para cerca de 600 crianças em Irecê.

Entretanto, essa equipe e toda essa estrutura está ligada à Igreja Universal do Reino de Deus. O presidente Sérgio Correa e o diretor de futebol Mauricio Amaral, ambos são bispos da Igreja. Mas oficialmente não se confirma qualquer participação ou convênio entre o clube e a Universal.

Até aí nenhum problema, até porque vários clubes brasileiros têm por de traz de suas estruturas uma empresa também. E os jogadores desses clubes tem liberdade religiosa, política, de gênero e de se vestir como bem entenderem e usar seus cabelos como quiserem, raspado, pintado ou cumprido.

Toda via, no Canaã Esporte Clube, a banda toca de outra maneira, são estabelecidas regras rígidas, isto é, doutrinação na pior concepção da palavra. Se é que doutrinação pode ter alguma concepção positiva.

Em campo os palavrões são proibidos. No início da partida, os 11 jogadores do Canaã se ajoelham e erguem as mãos para o alto, em oração. Após o jogo, o “Pai Nosso” é rezado em uma só voz por todos os jogadores que afirmam “se Jesus é meu amigo, contra mim ninguém será. ”

Mas alguém pode dizer, fazem isso de livre e espontânea vontade. Mas é o time inteiro!?

 Além disso os atletas não podem pintar o cabelo, ter cortes considerados diferentes, usar brinco ou usar boné. Alguns carregam uma Bíblia ao sair do vestiário. Segundo jogadores e integrantes da comissão técnica, todos são convidados a frequentar os cultos evangélicos, mas não são obrigados. Há exigência de ser cristão.

Então, um jovem que frequenta o Candomblé, a Umbanda, o judaísmo, o islamismo ou nenhuma religião e é ateu não poderá fazer parte do time do Canaã Esporte Clube, é isso?

Afinal de contas, o Canaã está à procura de goleiros, zagueiros e centroavantes ou de obreiros, pastores e bispos para o seu time de fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus no interior da Bahia?

Quando as religiões são utilizadas para ludibriar as pessoas, elas simplesmente perdem todo o sentido da sua existência, se é que elas têm algum sentido. Aí me remeto a Marx que dizia que a “religião é o ópio do povo”.

Em relação a essa afirmação de Marx, lembro-me do grande Dom Helder Camara, que um dia afirmou “Se Marx tivesse conhecido as comunidades eclesiais de base, não diria que a religião é o ópio do povo” e acrescento, também a Teologia da Libertação.

E há também os que dizem que o futebol é o ópio do povo. Essa afirmação pode ser confirmada com pelo menos dois fatos. Na Copa do Mundo de Futebol no México em 1970, a vergonhosa Ditadura Militar no Brasil, utilizou a conquista do tri campeonato mundial para esconder o que estava acontecendo nos porões da ditadura, as torturas e mortes, para a grande maioria da população brasileira. Em relação a postura dos jogadores e comissão técnica daquele elenco naquele período sem comentários. Poderiam ter falado para o mundo o que se passava nesse Brasil do “Ame ou deixe-o”, mas simplesmente se calaram.

O mesmo ocorreu na Argentina no período da ditadura militar, quando em 1978 realizou a Copa do Mundo de Futebol em seu território, e não só esconderam as mazelas do regime opressor, como também manipularam resultado para chegar à final e se tornarem campeões mundiais. E nem uma palavra dos vencedores sobre o que ocorria com os hermanos argentinos.

Enfim, não sei até onde o Canaã Esporte Clube vai chegar nessa “Copinha”, nem é isso que interessa. O mais importante é que esses jovens com tantos sonhos, não deixem que suas vontades, e principalmente que suas liberdades sejam castradas ou por instituições religiosas ou times de futebol inescrupulosos.

Que os “Deuses do Futebol” olhem para esses meninos afim de orientá-los para que possam ser livres em suas atitudes, escolhas e pensamento. Nada é mais precioso que a liberdade.

 O Prof. Martinho Condini é historiador, mestre em Ciências da Religião e doutor em Educação. Pesquisador da vida e obra de Dom Helder Camara e Paulo Freire. Publicou pela Paulus Editora os livros 'Dom Helder Camara um modelo de esperança', 'Helder Camara, um nordestino cidadão do mundo', 'Fundamentos para uma Educação Libertadora: Dom Helder Camara e Paulo Freire' e o DVD ' Educar como Prática da Liberdade: Dom Helder Camara e Paulo Freire. Pela Pablo Editorial publicou o livro 'Monsenhor Helder Camara um ejemplo de esperanza'. Contato profcondini@gmail.com

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário