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quarta-feira, 27 de março de 2013

Páscoa e socialismo



Por MARCELO BARROS

A Páscoa é celebrada tanto pelas comunidades judaicas, como pelas Igrejas cristãs históricas. A origem dessa festa é muito antiga. Marcava o renascer da natureza na primavera. A ela se incorporou a memória da libertação dos escravos hebreus e sua saída do Egito. Os cristãos deram à festa um conteúdo novo ao celebrarem a morte e ressurreição de Jesus, mas essa páscoa de Cristo é protótipo de todo ser humano e inicio de uma sociedade nova e de um mundo restaurado. Então, não substitui e sim inclui e radicaliza ainda mais os conteúdos que a festa tinha na sua história anterior.  
Hoje, celebrar a páscoa da natureza é um desafio não só para judeus e cristãos. É dever de toda a humanidade deter a extinção de dezenas de espécies vivas que a cada dia se acabam. Só se a natureza renascer da destruição provocada pela sociedade vigente, a Páscoa será cósmica, como a Bíblia propõe.  Quanto à sua dimensão social e política, a celebração pascal rememora a ação libertadora de Deus na ressurreição de Jesus e na vocação de todo ser humano para constituir uma sociedade nova, justa e feliz. Na Bíblia, profetas como Ezequiel usaram o termo ressurreição para anunciar a restauração social e política do povo como projeto divino (Ez 36- 37).  Um discípulo de Isaías anunciou o projeto divino de criar um novo céu e nova terra, na qual toda a humanidade terá liberdade, saúde, paz e alegria (Is 65, 17 ss). Baseado nessas profecias, os evangelhos e Paulo falam da páscoa de Jesus como início de uma nova criação e fonte de vida nova para o ser humano e toda a sociedade.
No cristianismo primitivo, os discípulos e discípulas de Jesus se uniram em comunidades de entreajuda e solidariedade. Por isso, tomaram das cidades gregas o nome das assembleias de seus cidadãos (Igrejas) com a novidade de que nas assembleias cristãs, todos eram iguais e procuravam ter tudo em comum (At 2, 32 ss). Celebravam a ceia de Jesus como partilha do alimento e proposta de comunhão como forma de viver. Por isso, o império romano perseguiu judeus e cristãos. O império, tolerante para com as mais diversas religiões, não permitia associações de solidariedade entre os pobres. E as sinagogas e Igrejas eram isso. Só quando a Igreja renunciou à sua dimensão revolucionária, se tornou aceita pelo império e foi por ele absorvida. Hoje, para retomarmos o espírito original da Páscoa e o conteúdo verdadeiramente espiritual da caminhada eclesial temos de refazer a dimensão socialista da fé bíblica.
As características principais do verdadeiro Socialismo (não de um partido que se diz socialista e privatiza hospitais públicos e serviços de saúde) são 1º - a socialização da propriedade nas mãos das classes populares. 2º – o poder nas mãos do povo, o que significa a radicalização da democracia com instrumentos participativos 3º  – o acesso de todos às necessidades básicas da vida, como alimento, saúde, moradia e educação. Evidentemente, não bastam essas três características para que se possa considerar um sistema político como socialista, mas sem esses elementos nenhum regime merece tal nome. A atual social democracia é apenas um disfarce do mesmo mecanismo de exploração e injustiça que faz do ser humano o lobo do outro humano. Só o socialismo ou como, na encíclica Mater et Magistra, João XXIII, o papa bom e santo, chamou de “socialização”, pode criar condições de uma vida justa e feliz. A celebração pascal deve ser sinal e instrumento dessa profecia socialista. A ressurreição de Jesus é o começo da transformação do mundo. Ser verdadeiramente revolucionário é em primeiro lugar um problema de fé e exige de nós uma espiritualidade pascal. Quem crê na ressurreição de Jesus trabalha pela ressurreição social e espiritual de todo o mundo. Testemunha a Deus que diz: “Faço novas todas as coisas” (Ap 21, 5). 
 
Marcelo Barros, monge beneditino e peregrino de Deus

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