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sábado, 9 de março de 2013

Consumir ou ser consumido: dilema cristão pós-moderno



     por MARIA CLARA LUCCHETTI BINGEMER



A diferença entre consumo e consumismo é que no primeiro as pessoas adquirem  somente aquilo que lhes é necessário para sobrevivência. Já no consumismo a  pessoa gasta tudo aquilo que tem em produtos supérfluos. Podem não ser de boa  qualidade nem os mais indicados, porém ela tem curiosidade de experimentar  devido à propaganda e ao apelo dos produtos de marca.
        No entanto, a  definição de necessidade e de supérfluo é algo relativo, já que um produto  considerado supérfluo para alguém pode ser essencial para outra pessoa, de  acordo com as camadas sociais a que a população pertence. Isso pode gerar  violência, pois as pessoas que cometem crimes na maioria das vezes não roubam  ou furtam por necessidade, e sim por vontade de ter aquele produto e não  possuir condições de adquiri-lo. Nesses casos, a necessidade de consumo se  torna uma doença, uma compulsão, que deve ser tratada para evitar maiores  danos à pessoa. Muitas vezes, o consumismo chega a ser uma patologia  comportamental. Pessoas compram compulsivamente coisas que não irão usar ou  que não têm utilidade, apenas para atender à vontade de  comprar.
          A  explicação da compulsão pelo consumo talvez possa se amparar em bases  históricas. O mundo nunca mais foi o mesmo após a Revolução Industrial. A  industrialização agilizou o processo de fabricação, o que não era possível  durante o período artesanal. Trouxe o desenvolvimento num modelo de economia  liberal, que hoje leva ao consumismo alienado de produtos industrializados.  Trouxe também várias consequências negativas por não se ter preocupado com o  meio ambiente.
        A  Revolução Industrial do século XVIII transformou de forma sistemática a  capacidade humana de modificar a natureza, provocou o aumento vertiginoso da  produção, resultando no barateamento dos produtos e dos processos de produção.  Assim, milhares de pessoas puderam comprar produtos antes restritos às classes  mais ricas.
       A sociedade  capitalista da atualidade é marcada por uma necessidade intensa de consumo,  seja por meio dos mercados internos, seja pelos mercados externos. Com o  aumento do consumo há maior necessidade de produção e o excesso de demanda  leva à geração de mais empregos, o que aumenta a renda disponível na economia  e esta acaba sendo revertida para o próprio consumo. Todo este processo leva a  uma intensificação da produção e consequente aumento da extração de  matérias-primas e do consumo de energia, muitas vezes de fontes não  renováveis.
       Às vezes, uma  pessoa compra por influência de outras que também são influenciadas pelas  propagandas, filmes, revistas etc. Ou seja, a sociedade cria um padrão, que  tende a ser seguido pelas pessoas. Algumas mulheres, por exemplo, escolhem um  corte de cabelo, roupas, sapatos e acessórios da moda porque se inspiram em  alguma atriz famosa.
       Em  nossas sociedades houve uma tentativa trágica de reencantar o mundo pelo  consumismo e a diversão. O consumismo promete preencher os desejos,  necessidades e carências com diferentes produtos, mas o faz de tal maneira que  nunca fiquemos satisfeitos e desperte em nós a necessidade, a compulsão de  adquirir novos produtos que o mercado produz sem recesso. O que começa como  uma necessidade converte-se em compulsão ou em vício. Qualquer privação  inesperada, irrita e  frustra.
       A fé cristã e a  Eucaristia contam outra história sobre a fome e o consumo. E essa não começa  com a escassez, mas com um convite à vida, e vida em abundância.  O corpo  e o sangue de Cristo não são bens escassos, a hóstia e o cálice se multiplicam  diariamente em milhares de celebrações eucarísticas em todo o mundo.  O  consumidor do corpo e sangue de Cristo, no entanto, não permanece alheio ao  que consome, mas se torna parte do Corpo. O ato de consumo da Eucaristia não  implica a apropriação de bens para uso privado, mas sim ser assimilado a um  órgão público, o Corpo de Cristo. Ali se comunicam alegria e dor, abundância e  falta, e se destaca a obrigação de os seguidores de Cristo para com os  famintos. Na dinâmica eucarística, famintos e bem-aventurados se integram em  Cristo e inauguram um novo modo de entender o mundo e viver a  realidade.



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