Por Leonardo Boff
A presente campanha presidencial em
segundo turno coloca em jogo algo fundamental na história brasileira: a nossa
primeira revolução popular, democrática e pacífica conquistada no voto, com a
chegada de Lula à Presidência. Não ocorreu apenas a alternância do poder mas
uma alternância de classe social. Um representante dos “lascados” e sempre
colocados à mergem chegou ao mais alto cargo da nação como fruto do PT, de
aliados e de grande articulação de movimentos sociais e sindicais e continuado
por Dilma Rousseff.
Como afirmava o notável historiador José
Honório Rodrigues em seu Conciliação e Reforma no Brasil (1965):”os interesses
do povo foram descuidados pela liderança; daí as lutas, as rebeldias, a
história cruenta, o compromisso e a conciliação; revolução no sentido de
transformação da estrutura econômica, do regime de terras, da mudança de
relações sociais, nunca tivemos; o grande sucesso da história do Brasil é o seu
povo e a grande decepção é a sua liderança”. Continua José Honório:”as vitórias
do povo são objetivas e incontestáveis;…o Brasil deve ao povo a unidade
política, a integração territorial, a mestiçagem, a tolerância racial, a
homogeneidade religiosa, a integração psico-social, a sensibilidade nacional
muito viva que exige um abrasileiramento das próprias contribuições
estrangeiras” (p.121-122).
Com Lula e Dilma se inaugurou esta
revolução que é ainda inacabada mas que deve ser consolidada e aprofundada.
Oxalá nessa eleição ela não seja malbaratada pela vitória de quem representa a
velha política oligárquica mais interessada no crescimento econômico, no
mercado e articulada com a macroeconomia globalizada do que no destino daqueles
milhões que foram tirados da pobreza pelas políticas republicanas e foram
feitos sujeitos sociais participativos na sociedade.
Daí ser importante que Dilma vença para
garantir, consolidar e enriquecer com um novo ciclo de transformações essa
revolução inaugural.
Nos primórdios da colonização o cronista
oficial Pero Vaz de Caminha escreveu que aqui “em se plantando tudo dá”. Os
cinco séculos de história ainda à luz do paradigma europeu mostraram o acerto
de tal afirmação. Aqui tudo pode dar e deu para ser a mesa posta para as fomes
do mundo inteiro. Por que não irá dar certo um projeto-Brasil novo,
democrático, social, popular, ecológico, ecumênico e espiritual?
O povo brasileiro se habituou a “enfrentar
a vida” e conseguir tudo “na luta”, quer dizer, com dificuldade e muito
trabalho. Por que não irá “enfrentar” também esse grande e derradeiro desafio
colocado em seu caminho? Como não conquistá-lo “na garra”, com a consciência
solidária, com a organização, com a vontade de empoderar-se para garantir o
poder de estado, já por 12 anos, a fim de dar-lhe o verdadeiro sentido de fazer
as mudanças necessárias, primeiramente para os mais esquecidos e a partir
deles, a todos, conferindo-lhes sustentabilidade e garntindo-lhes um futuro bom
para o país.
Esse caminho já foi traçado, embora falte
muito ainda para ser completado. Por duas vezes o novo chegou lá, no poder
central. Escasseiam cada vez mais os instrumentos com os quais as elites
dominantes querem retornar ao poder com aquele projeto neoliberal que quebrou os
países centrais e que lançou cem milhões no desemprego na Europa e nos USA.
Sentimo-nos representados nos versos do cantador:
“Só é cantador quem traz no peito o cheiro e a cor de sua terra/ a marca de
sangue de seus mortos/ e a certeza de luta de seus vivos”(A saga da Amazônia de
Vital Faria). Essa luta, esperamos, será vitoriosa. O pais florescerá no fulgor
de seu povo multicolorido como nossas paisagens que enchem nossos olhos de
encantamento. Valem as palavras de líderes sindicais nos dias sombrios do
submetimento:
“Podem cortar uma, duas e todas as flores.
Mas não poderão impedir a chegada da primavera”. A primavera já vai avançada.
Junto com o sol primaveril queremos celebrar a vitória da maioria do povo,
reelegendo Dilma Rousseff.
Se não puder ocorrer agora, oxalá ocorra,
fica o desafio para o futuro. O que deve ser, tem força e chegará o dia,
bendito dia, em que irá triunfar.
Leonardo Boff escreveu Hospitalidade: direito e dever de todos, Vozes, Petrópolis 2005.
É
filósofo e teólogo, escritor, assessor do projeto Cultivando Agua Boa
da Itaipu Binacional e um dos co-redatores da Carta da Terra
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