Por Frei Betto
Desde de 5 de outubro, até o próximo dia 19, reúne-se em Roma o Sínodo
Extraordinário sobre a Família. Convocado pelo papa Francisco em outubro de 2013,
esta reunião de bispos do mundo inteiro foi precedida pelo debate em torno de
documento sobre os desafios à Igreja, dentre os quais os novos perfis de
família. O tema será retomado no Sínodo Ordinário de 2015.
Constata o documento: “Hoje perfilam-se problemáticas até há poucos anos
inéditas, desde a difusão dos casais de fato, que não acedem ao matrimônio e,
às vezes, excluem esta própria ideia, até as uniões entre pessoas do mesmo
sexo, às quais não raramente é permitida a adoção de filhos. Entre as numerosas
novas situações que exigem a atenção e o compromisso pastoral da Igreja, será
suficiente recordar: os matrimônios mistos ou interreligiosos; a família
monoparental; a poligamia; os matrimônios combinados, com a consequente
problemática do dote, por vezes entendido como preço de compra da mulher; o
sistema das castas; a cultura do não comprometimento e da presumível
instabilidade do vínculo; as formas de feminismo hostis à Igreja; os fenômenos
migratórios e a reformulação da própria ideia de família; o pluralismo
relativista na noção de matrimônio; a influência dos meios de comunicação sobre
a cultura popular na compreensão do matrimônio e da vida familiar; as
tendências de pensamento subjacentes a propostas legislativas que desvalorizam
a permanência e a fidelidade do pacto matrimonial; a difusão do fenômeno das
mães de substituição (“barriga de aluguel”); e as novas interpretações dos
direitos humanos. Mas, sobretudo, no âmbito mais estritamente eclesial, o
enfraquecimento ou abandono da fé na sacramentalidade do matrimônio e no poder
terapêutico da penitência sacramental.”
Francisco vai direto ao ponto, ao contrário de outros papas que, para não criar
atritos com os conservadores, preferiam deixar às calendas temas candentes que
exigem, com urgência, posicionamento da Igreja, como aborto, sacerdócio de
mulheres, volta ao ministério sacerdotal de padres casados, homossexualidade,
celibato obrigatório etc.
O
documento preparatório explicitou as preocupações do papa, entre as quais como
evangelizar crianças de pais divorciados impedidos de se aproximar dos
sacramentos? Podem os divorciados participar da eucaristia?
O
documento enviou a todas as dioceses do mundo perguntas cujas respostas servem
agora de base ao Sínodo Extraordinário. Entre elas, o tópico “Sobre as uniões
de pessoas do mesmo sexo: a) Existe no vosso país uma lei civil de
reconhecimento das uniões de pessoas do mesmo sexo, equiparadas de alguma forma
ao matrimônio? b) Qual é a atitude das Igrejas particulares e locais, quer
diante do Estado civil promotor de uniões civis entre pessoas do mesmo sexo,
quer perante as pessoas envolvidas neste tipo de união? c) Que atenção pastoral
é possível prestar às pessoas que escolheram viver em conformidade com este
tipo de união? d) No caso de uniões de pessoas do mesmo sexo que adotaram
crianças, como é necessário comportar-se pastoralmente, em vista da transmissão
da fé?”
Não se espere desta reunião decisões que, da noite para o dia, mudem o
comportamento pastoral da Igreja Católica. Instituição bimilenária, seus
avanços são cautelosos.
No
entanto, Francisco tem pressa. Conhece os escândalos no interior da Igreja:
casos gritantes de pedofilia (que ele pune com rigor); congregações religiosas
que se transformaram em grandes empresas famintas por lucros; casais que mantêm
relações sexuais sem intenção de procriar (o que é vetado pela doutrina em
vigor); jovens que perdem a virgindade antes do casamento; relativização da
ideia de pecado etc.
O
fundamento da família é o amor. “Deus é amor” e “quem ama nasceu de Deus”, diz
João no capítulo 4 de sua primeira carta. De que vale uma família desprovida de
amor? E Deus não se faz presente em toda verdadeira relação amorosa, ainda que
fuja ao modelo de família próprio da modernidade?
Sonho com o dia em que um casal de jovens, ao experimentar a primeira paixão,
saiba que faz experiência de Deus!
Frei Betto é escritor, autor do romance “Aldeia do silêncio”
(Rocco), entre outros livros.
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