Por Marcelo Barros
É o tema que a
Igreja Católica no Brasil assumiu para a Campanha da Fraternidade 2015. Essa é
aberta por uma palavra do papa Francisco nessa quarta feira que dá início ao
tempo da Quaresma e à preparação para a celebração da Páscoa. A Campanha da
Fraternidade nos lembra que a verdadeira
espiritualidade passa pelo cuidado com as outras pessoas. A Campanha da Fraternidade desse ano recorda
que há 50 anos, a Igreja Católica encerrava o Concílio Vaticano II. Essa
reunião de todos os bispos católicos do mundo se propunha a renovar
profundamente a vida e a ação das Igrejas cristãs. Para isso, refletiu sobre a
natureza da Igreja, as bases de sua fé e a sua missão no mundo. Produziu 16
documentos que, até hoje, são referência para a ação pastoral. Um dos mais
importantes, publicado em dezembro de 1965 é a Constituição sobre a Igreja no
mundo de hoje (Gaudium et Spes). Tanto através desse documento, como pelo testemunho
dos bispos reunidos no Concílio, a Igreja Católica se propôs a aprofundar o
diálogo amigo e humilde que o papa João XXIII tinha iniciado com a humanidade,
com as pessoas crentes e também as descrentes. Esse diálogo que, nas últimas
décadas, tinha sido interrompido, foi retomado, nos nossos dias, pelo papa
Francisco.
No cinquentenário
do encerramento do Concílio Vaticano II, a Campanha da Fraternidade de 2015
propõe como objetivo geral: “aprofundar, à luz do Evangelho, o diálogo e a
colaboração entre a Igreja e a sociedade, propostos pelo Concílio Vaticano II, como
serviço ao povo brasileiro, para a edificação do povo de Deus” (Texto-base, p.
10). Esse objetivo geral quer se concretizar em algumas metas específicas, como
“atuar profeticamente, à luz da opção pelos pobres, para o desenvolvimento
integral da pessoa e na construção de uma sociedade justa e solidária” (idem,
p. 10).
No documento da CF
2015, a CNBB aponta um retrato bastante complexo da sociedade brasileira. Atualmente,
o Brasil tem mais de 200 milhões de pessoas, das quais mais de 80% concentradas
nas cidades. Essa urbanização por demais rápida não foi acompanhada de
adequadas políticas de moradias. O transporte público é ineficiente. Mais de
50% dos domicílios brasileiros não tem saneamento básico. E os cuidados com a
saúde ainda são insuficientes. A violência não para de crescer, sob todas as
formas e em todos os extratos da sociedade. Os programas sociais do governo
reduziram a pobreza extrema da população de 9, 7% para 4, 3%. E a mortalidade
infantil teve uma baixa importante nesses últimos anos. No entanto, a ascensão
social de uma parte da classe trabalhadora foi importante. Garantiu a muitos
uma necessária e justa segurança alimentar, mas, muitas vezes, possibilitou um
maior acesso ao consumo e não a uma melhor qualidade de vida. Melhorou as
condições de vida, mas não conseguiu mudar as estruturas básicas da sociedade
na direção de um país mais justo. A CNBB assume como sendo expressão do serviço
da Igreja Católica à sociedade brasileira a ação das pastorais sociais e as
diversas campanhas sociais como as que se fazem em favor de um Plebiscito para
a Reforma Política e o Grito dos Excluídos. O texto da CF 2015 deixa claro que ainda
há muito a fazer e que a oportunidade dessa celebração da Quaresma e Páscoa
deveria nos animar a preencher essas lacunas e aprimorar o serviço da Igreja à
sociedade.
Em uma sociedade
muito fragmentada e individualista, é cada vez maior o número de pessoas que
buscam uma espiritualidade profunda que responda à sede de infinito e do
sentido da vida que existe no coração humano. No entanto, é importante que essa
busca espiritual não nos aliene das responsabilidades fundamentais da vida
social, dos deveres da cidadania e da solidariedade com os nossos irmãos e com
a natureza ameaçada. A celebração da Páscoa de Jesus nos recorda que Deus quer
entrar na nossa vida para nos levar a dar um passo (em hebraico: páscoa) de
libertação para nosso povo, para o universo, como também para o interior de
cada um/uma de nós. Uma palavra proclamada até hoje nas sinagogas judaicas
repete a cada ano para o mundo todo: “Quando Deus conduziu o seu povo da
escravidão para a liberdade e o fez passar pelo mar a pé enxuto, foi pensando
em nós, de todas as gerações do mundo, que ele fez essas maravilhas”.
Marcelo Barros, monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades eclesiais de base e de movimentos populares. É coordenador latino-americano da ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45 livros publicados no Brasil e em outros países
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