Por
MARCELO BARROS
Quando os cristaos afirmam que Deus é
comunhao, atestam que o diàlogo é a forma de comunicaçao mais profunda que a
humanidade tem para caminhar para a unidade. Em sua primeira carta enciclica, o
papa Paulo VI dizia que o diàlogo é um ato divino porque foi Deus que iniciou o
diàlogo com a humanidade. Quando nos colocamos em uma postura de acolhimento e
diàlogo com alguém diferente de nòs, estamos fazendo algo que recebemos como
vocaçao do proprio Criador.
Durante a sua historia, as Igrejas sempre
tiveram dificuldade de conjugar a convicçao de terem a revelaçao divina com a
abertura necessaria ao pensamento e modo de crer dos outros grupos e pessoas. Francisco,
o novo bispo de Roma e primaz das Igrejas em comunhao com a Igreja Catolica
Romana, chama a atençao do mundo pela sua forma simples de se comunicar. Ele
parece retomar um dialogo da hierarquia da Igreja com a humanidade que, no
inicio dos anos 60, o papa Joao XXIII iniciou. Nessa semana, o mundo recorda
que, hà exatamente 50 anos, no dia 03 de junho de 1963, Joao XXIII partia para
Deus. O mundo o chamou de “o papa bom”. Era um homem interiormente livre e
evangélico. Fazia questao de se apresentar assim. Conhecia bem a estrutura
historica do Vaticano com a qual devia sempre lidar.
Quando anunciou ao mundo que Deus lhe
inspirara a ideia de convocar todos os bispos do mundo para um concilio
ecumenico, seus auxiliares diretos nao compreenderam e manifestaram sua
estranheza. O papa insistiu que queria renovar a Igreja Catolica e prepara-la
melhor para a unidade com as outras Igrejas. Precisou mais de tres anos (de
janeiro de 1959 a outubro de 1962) para ver se realizar o seu sonho. Quando o
Concilio começou, dirigiu a primeira sessao do Concilio e alguns meses depois
partiu, deixando-nos uma herança maravilhosa que nem sempre foi bem valorizada.
Foi o primeiro papa a receber no Vaticano
o primeiro ministro da Uniao Soviética comunista e atuou como mediador de paz
entre Estados Unidos e Russia na crise dos misseis nucleares. Em 2012 passava a
ser o unico papa na historia a ganhar o premio Nobel da Paz.
Graças a Deus, Paulo VI, o papa que o
sucedeu, compreendeu o seu espirito. Embora fosse um homem timido e com outro
temperamento e sensibilidade diferente de Joao XXIII, soube prosseguir o
trabalho e continuar o concilio iniciado. Afirmou que a epoca das condenacoes e
do dogmatismo tinha acabado. A missao da Igreja deve ser sempre dialogar e
conviver com a diversidade sem se impor. Para o diàlogo ser sincero e profundo,
cada parte do diàlogo deve assumir sua identidade propria e tem toda liberdade
de expressar seus pontos de vista, desde que aceite escutar a outra parte e o
diàlogo possibilite uma evoluçao de todas as partes na direçao de um ponto
comum e de descoberta sempre mais ampla da verdade. Ha uma agenda imensa para o
dialogo entre as hierarquias religiosas e a sociedade civil: a relaçao da fé
com ciencia, as novas questoes da bioética, a abertura pastoral às situaçoes
concretas da ética sexual, o compromisso da fé com uma politica justa e
comprometida com a transformaçao do mundo e assim por diante.
O aniversario da partida de Joao XXIII nos
recorda: durante a sua longa agonia, o papa bom revelou que desejava oferecer a
Deus os seus sofrimentos e sua propria vida pela unidade dos cristaos. Agora,
50 anos depois, apesar de que as Igrejas historicas fizeram um bom caminho,
ainda falta muito para chegarmos à plena unidade visivel das Igrejas. Essa
uniao na diversidade pode ser muito fortalecida pelo diàlogo fraterno. Pode ser
que, nesse diàlogo, a Igreja nao tenha resposta para muitos problemas, mas ela
pode sim ajudar a humanidade a abrir-se mais à diversidade das culturas, a
tornar o mundo mais humano e a aprofundar a vocaçao humana para uma amorizaçao
sempre maior que em nòs é conduzida e feita pelo Espirito de Deus.
Marcelo Barros é
monge benedito e peregrino de Deus.
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