Por MARIA CLARA LUCCHETTI BINGEMER
Entre
as lindas cenas que pontilham a passagem do Papa Francisco pelo Rio de Janeiro
para a Jornada Mundial da Juventude está seu gesto de beijar crianças.
Com isso ele visibiliza e torna presente novamente o gesto de Jesus de
Nazaré que os acolheu com amor, quando os apóstolos queriam afastar os pequenos.
No tempo de Jesus, a criança não era prestigiada
ou valorizada como nas sociedades ocidentais de hoje. Há mais de uma passagem
evangélica onde as multidões que seguiam Jesus eram descritas mencionando a
quantidade de homens e acrescentando: “sem contar as mulheres e as crianças”.
A
falta de cidadania das crianças, frágeis e indefesas, comove o coração
compassivo do Mestre e o faz pronunciar as palavras que hoje são repetidas em
todo lugar onde se anuncia o Evangelho: “ Deixai vir a mim os pequeninos porque
deles é o Reino dos céus.”
Este
anúncio, o Papa Francisco o tem feito com seu gesto alegre e carinhoso,
beijando e acariciando todas e cada uma das crianças que lhe são apresentadas
em suas aparições públicas. E assim anuncia que a vida frágil, pequena e
desprotegida da criança encontra abrigo junto a Deus, que é Pai de todos e
cuida do que é pequeno, desprezado e frágil com redobrado amor.
Em
sua chegada ao Rio de Janeiro, enquanto o veículo aberto do Papa Francisco
desfilava pelo centro da cidade, Francisco repetiu esse gesto várias vezes com
várias crianças. Mas uma foi especial. Tratava-se de uma menina de um ano
e oito meses, de nome Isadora, filha da evangélica Thais Albuquerque
Ramos, que acompanhava uma amiga católica na visita pontifical.
Thais
vive um momento difícil, com um casamento que não vai bem, e mora com a filha
na casa do pai. Ao caminhar perto do papamóvel foi surpreendida com o
pedido do papa para segurar a menina. Francisco apontou a criança e os
seguranças a levaram até ele. A mãe emocionou-se ao ver a filha nos
braços do Papa, sentindo-se trêmula e invadida por uma sensação inexplicável.
O
fato de ser filha de uma evangélica, mulher pobre e simples, da Zona Norte do
Rio, marca o gesto do Papa de um selo diferente. Thais é de uma confissão
cristã diferente da de Francisco, e declarou que o gesto do Papa, apesar de
toda a emoção e energia positiva para ela e sua filha, não vai fazê-la mudar de
religião ou influenciar na escolha religiosa da filha. Mas seguramente é
algo de que nunca vai esquecer.
Abraçando
e beijando essa criança brasileira, evangélica e humilde, Francisco não só
repete o gesto de Jesus de Nazaré, de acolher aquilo que é frágil, pequeno e
vulnerável, como também e não menos mostra que o evangelho do amor e da
acolhida sem discriminação é universal.
O
anúncio de que Deus é amor, amor real e concreto, independentemente de raça,
cor, sexo, condição social, pertença religiosa, está registrado para sempre no
gesto de Francisco de abraçar e beijar uma criança evangélica.
A
pequena Isadora, da mesma linhagem da mulher siro-fenícia, da Cananéia, da
samaritana, de todos os representantes de outras religiões que se aproximaram
de Jesus e foram atingidos por seu amor, é hoje sinal visível – sacramento – do
que a Igreja Católica, na pessoa do bispo de Roma, o Papa Francisco quer dizer.
Não há o menor sentido em separações entre pessoas que professam credos
diferentes. Sobretudo entre aqueles que recebem o mesmo Batismo e rezam o
mesmo Credo. O Espírito Santo, artífice da comunhão universal, inspirou
Francisco ao beijar na pequena Isadora todas as outras igrejas cristãs
com as quais a Igreja Católica deseja estar em unidade e comunhão.
Maria Clara Lucchetti Bingemer é professora
do departamento de teologia da PUC-Rio . A teóloga é autora de “O
mistério e o mundo – Paixão por Deus em tempo de descrença”,
Editora Rocco.
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