O Jornal On Line O PORTA-VOZ surgiu para ser o espaço onde qualquer pessoa possa publicar seu texto, independentemente de ser escritor, jornalista ou poeta profissional. É o espaço dos famosos e dos anônimos. É o espaço de quem tem alguma coisa a dizer.

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Francisco: o Papa das surpresas



Por MARIA CLARA LUCCHETTI BINGEMER
            Como  diz Maurizio Chierici, no jornal Il Fatto Quotidiano: “É difícil  remar contra quem comove o mundo.” Sem dúvida, este é o caso do Papa  Francisco: ele comove o mundo com suas atitudes, seus gestos, suas escolhas.  Ou como diz o grande teólogo galego Andrés Torres Queiruga, é impossível não  sentir, com o atual Papa, o sopro do Concílio refrescando o rosto.

            Talvez  não haja instituição no mundo mais estável do que a Igreja Católica, com dois  mil anos de idade. E, no entanto, desde o último mês de abril, a mesma Igreja  tem apresentado várias surpresas ao mundo na pessoa do Papa Francisco.  Surpresas que vão sobretudo na contramão da face vetusta e previsível da  Igreja Católica Romana. A começar pela saudação inicial quando de sua eleição,  totalmente diferente das habituais, Francisco tem surpreendido e desconcertado  o  mundo.

            Não  é habitual um Papa, que é também chefe de Estado, voltar ao hotel para pagar  sua conta; usar apenas as vestes brancas e uma cruz simples; celebrar a  liturgia com simplicidade e despojamento, dando mais atenção ao calor humano  com os fiéis que às rubricas; fazer pronunciamentos cheios de bom senso e em  linguagem coloquial e prática que todos entendem. Deveria ser a regra geral,  mas não é.  Revestiu-se o Papado e os líderes religiosos, durante muito  tempo, de uma solenidade além da medida que muitas vezes afastou os fiéis.   O Concílio chamou a atenção para isso.  Parecia que esta diretriz  se havia perdido no horizonte.  Agora Francisco traz esse “novo” de volta  com suas informalidades que desconcertam cerimoniais e jornalistas.

            A  próxima semana traz a presença de Francisco direto ao Rio de Janeiro, sob  nossos olhos. E certamente durante sua passagem o pontífice nos reserva muitas  surpresas.  Começou recusando o papa móvel e pedindo um jipe aberto para  estar mais ao alcance dos sentidos dos fiéis.  A segurança grunhe e se  queixa, todos ficam perplexos e não entendem.  É preciso saber ler a  mensagem: quer ser visto mais como pastor que como chefe de Estado.  Um  pastor tem que estar próximo aos seus fiéis, diferente do chefe de Estado, que  se protege com vidros blindados e um exército de seguranças.

            Seguiu  adiante recusando a cama no avião que o trará, argumentando que a poltrona de  primeira classe é mais do que suficiente para repousar durante o voo.   Com isso, dá coerente continuidade à sua postura de recusar luxos e  adereços que não condizem com seu estilo austero e simples.  Nova  surpresa da mídia, da segurança e de várias instâncias.

            Em  Roma, Francisco promove importantes reformas: financeira, administrativa,  moral.  Em todas elas tem mostrado que não pretende tratar com leveza ou  ligeireza questões sérias.  A pena para os padres e religiosos pedófilos  endureceu e se intensificou. A reforma da cúria parece avançar com firmeza.   O monsenhor que trazia da Suíça vários milhões de euros está preso e não  obteve indulto por sua condição de sacerdote.

            Francisco  deve passar pela rua São Clemente.  Talvez se detenha – e parece que o  fará – na igreja do colégio Santo Inácio para rezar diante da imagem do  fundador da ordem religiosa à qual sempre pertenceu e pela qual foi formado.  Certamente outras surpresas estarão a nós reservadas com sua passagem pelo  Rio.

            Oxalá  possamos aprender de Francisco esta capacidade de a todos surpreender com as  surpresas do Espírito, que é o eterno artífice da novidade maior da presença  de Deus no mundo. Tomara que estejamos abertos para assimilar o que ele dirá  aos jovens, mas a todos nós igualmente -  adultos, idosos ou jovens há  mais tempo – sobre a necessidade de despojar-se do que é supérfluo e acessório  e concentrar-se apenas no que é essencial: buscar e encontrar a vontade de  Deus e fazê-la acontecer neste mundo dos homens e mulheres que buscam sentido  para suas vidas.

            Que  possamos aprender com sua alegre coragem que pelo simples fato de existir e se  visibilizar neste mundo tão consumista e  mercantilista, a simplicidade é  eloquente como um grito de alerta e convoca mais que mil enfadonhos discursos.   Porque tem a força do testemunho.  Continue a surpreender-nos  Francisco!  E que Deus o inspire e ilumine.  Amém.

Maria Clara Lucchetti Bingemer,  professora do Departamento de Teologia da PUC-Rio.  A   teóloga é autora de “O  mistério e o mundo – Paixão por  Deus em tempo de descrença”, Editora Rocco.

Copyright 2013 – MARIA CLARA LUCCHETTI BINGEMER – Não é permitida a reprodução deste artigo em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização. Contato – MHPAL – Agência Literária (mhpal@terra.com.br)

Nenhum comentário:

Postar um comentário