Por Frei Betto
Há 25 anos assassinaram
Chico Mendes (1944-1988). Pagou com a vida a defesa da Amazônia, a integração
entre o homem e a natureza, a criação de reservas extrativistas que, hoje,
evitam que a floresta reine como santuário intocável ou sofra derrubadas vítima
da ambição do capital.
Por enquanto, da parte do
governo federal e dos mbientalistas,não há sinal de nenhuma homenagem ou
comemoração (=fazer memória) do martírio de Chico Mendes.
Para celebrar a data,
retornei ao Acre na última semana de outubro. Conheci Chico Mendes no início da
década de 1980, quandoainda a esquerda encarava a questão ecológica com
preconceito, sem compreender sua ilimitada força política, na medida em que
supera partidarismos e agrega pessoas de todas as classes sociais, inclusive crianças.
Estive em seu velório em Xapuri, na véspera do Natal de 1988.
Acompanhei de perto o
surgimento da luta da nova geração deacreanos, como Chico Mendes, Marina Silva
e os irmãos Jorge e Tião Viana, para livrar o estado do latifúndio, dos
pistoleiros, das madeireiras irresponsáveis, da caça predatória, da rota do narcotráfico.
Em meados da década de 1970, ali estive com frequência, a convite do bispo
Moacyr Grecchi, para assessorar as Comunidades Eclesiais de Base, sementeiras
de movimentos sociais que, transformados em força política, modificaram o
perfil do estado.
Nesta visita recente,
conversei com o governador Tião Viana,proferi palestras na universidade federal
e, no dia seguinte, para o secretariado dos governos estadual e municipal, e
visitei, em Xapuri, o memorial de Chico Mendes e o Seringal Cachoeira.
Com área de 164.221 km2,
o Acre abriga 4,2% da Amazônia brasileira e conta, hoje, com quase 800 mil
habitantes (350 mil na capital, Rio Branco). As terras indígenas compreendem
16% do território, onde vivem 15 diferentes etnias com cerca de 13 mil pessoas.
São consideradas Áreas
Protegidas 32% das terras do estado,embora o desmatamento afete 13% da área
total do Acre, devido sobretudo à abertura de pasto para o gado.
O IDH (Índice de
Desenvolvimento Humano) do Acre, calculado em 0,559 (2010), cresceu 218% nos
últimos 10 anos. Já não é o estado dominado por máfias, como a do ex-deputado
federal Hildebrando Pascoal, que mandava retalhar seus inimigos com serra elétrica,
nem por pistoleiros a serviço de grileiros, como os que assassinaram Chico Mendes.
Enquanto a média nacional
de crianças de 6 a 14 anos na escola é de 84,1% (2011), no Acre chega a 92,2%,
embora falte ampliar o regime de tempo integral.
A taxa de mortalidade
infantil caiu de 31.3 (2000) em cada mil nascidos vivos para 13.9 (2011),
aproximando-se da média nacional (13.5).
O Acre é um estado com
potencial de riquezas pouco exploradas pelo Brasil. Além de produzir o mais
resistente látex (utilizado, em especial, na fabricação de preservativos), e
também castanha, madeira certificada e múltiplas frutas, como o açaí, hoje
consumido em larga escala pelos europeus, o estado possui ampla possibilidade
de turismo ambiental, que não é devidamente incentivado, ao contrário do que
faz a Costa Rica. Em nosso país, o turismo ainda engatinha atrelado ao carnaval
e ao litoral.
O
Acre permanece isolado do resto do Brasil. Seus produtos, para saírem por
nossos portos, precisam viajar 3.500 km até o Atlântico. Cuidasse melhor o
governo da BR-317, a rodovia transoceânica, também conhecida como Rodovia do
Pacífico, que liga os dois oceanos que
banham a América do Sul, a distância entre Rio Branco e o litoral peruano seria
encurtada para 1.500 km.
Em tempos de expansão de
pastos Amazônia adentro, com a derrubada de árvores seculares, e a atividade
predatória de mineradoras e garimpeiros, ressaltar a vida e os ideais de Chico Mendes
deveria ser um dever cívico obrigatório em todas as nossas escolas.
Frei Betto é escritor, autor, em parceria com Marcelo Barros,
de “O amor fecunda o Universo – ecologia e espiritualidade” (Agir), entre outros
livros.
http://www.freibetto.org/>
twitter:@freibetto.
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