Por Marcelo Barros
A
cada ano, no Brasil, o 21 de janeiro é comemorado como “o dia nacional contra a
intolerância religiosa”. Nos anos 90, o presidente da República instituiu essa
data para que se evitem acontecimentos trágicos e vergonhosos, como a morte de
uma mãe de santo que sofreu um infarto ao ver sua casa invadida e saqueada por
um grupo de fanáticos.
No
Brasil, a Secretaria da Presidência da República para os Direitos Humanos criou
uma comissão especial para zelar pela diversidade religiosa. Além disso, existem
comissões e fóruns que, em diversos estados, velam pelos direitos à liberdade
de expressão de todos os segmentos espirituais. Apesar disso, aqui e ali, ainda
ocorrem atos de discriminação e de violência, principalmente contra religiões e
cultos de matriz africana. Às vezes, a intolerância é clara, outras vezes é
camuflada e aparece sob o pretexto de protesto contra o barulho dos tambores ou
contra o sacrifício de animais.
O
governo e a sociedade civil podem coibir desrespeitos e fazer cumprir a lei, mas,
não podem obrigar ninguém a amar. Isso só pode ocorrer como caminho espiritual
e opção de amor. O Estado pode colaborar e até proporcionar espaços de diálogo,
mas eles só funcionarão se cada grupo religioso aprofundar esse caminho do
diálogo e da comunhão como uma vocação espiritual.
De
fato, todas as religiões pregam amor, compaixão e misericórdia. Entretanto,
quando se tornam dogmáticas e autoritárias, se transformam em instrumentos de
fanatismo e canais de intolerância. Confundem a verdade com uma forma cultural de
expressar a verdade. Assim, absolutizam dogmas e acabam justificando conflitos
e guerras em nome de Deus.
Infelizmente,
no decorrer da história, a religião que mais usou de violência e intolerância
contra “os outros” foi o Cristianismo. Isso em absoluta contradição com o
evangelho e o espírito de Jesus de Nazaré. É terrível constatar que, mesmo em
nossos dias, alguns grupos religiosos ainda vivem a fé como uma ideologia de
conquista guerreira que não admite o direito do outro e do diferente. No
Brasil, ainda existem programas de rádio e televisão, nos quais pastores e mesmo
padres pregam a intolerância e condenam as religiões afrodescendentes.
Em
1965, na declaração sobre as outras religiões, o Concílio Vaticano II proclamava
oficialmente o valor das outras religiões e incentivava os católicos ao
respeito ao diferente e ao diálogo. Também, em 1961, o Conselho Mundial de
Igrejas, que reúne 349 Igrejas evangélicas e ortodoxas, pediu às Igrejas-membros
uma atitude de respeito e diálogo com todas as culturas e colaboração com
outras tradições religiosas.
Atualmente,
no mundo, a diversidade cultural e religiosa é, não somente um fato que,
queiramos ou não, se impõe à humanidade. É principalmente uma graça divina e bênção
para as tradições religiosas. Para que entre as religiões, o diálogo possa ser profundo,
cada grupo tem de reconhecer o que Deus lhe revela, não só a partir da sua
própria tradição, mas do caminho religioso do outro. No tempo do nazismo, de
uma prisão alemã, escrevia o pastor Dietrich Bonhoeffer, teólogo luterano:
“Deus está em mim, mas para me abrir ao outro. Em mim, é uma presença fraca
para mim mesmo e é forte para o outro. Ele está no diferente, mas a sua
presença é para mim. Assim, Deus é amor e se encontra quando encontramos o
outro, o diferente”.
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