Por Maria Clara Lucchetti Bingemer
A história do novo
cardeal do Rio, Dom Orani João Tempesta, em sua entrega a Deus tem raízes
distantes, mas fundamentais na configuração de seu perfil. Há que
buscá-las em sua vocação contemplativa que o fez um dia, ainda bem jovem, bater
às portas do mosteiro cisterciense para servir a Deus na oração contemplativa,
na liturgia comunitária e no louvor incessante.
As necessidades eclesiais que demandavam um pastor o fizeram sair do mosteiro para ser bispo. É assim que antes de vir para o Rio de Janeiro, Dom Orani teve uma passagem importante por Belém do Pará, que marcou seu coração para sempre a ponto de dizer, em sua despedida: “Vou para o Rio, mas levo comigo Belém, o Pará, o calor desse Estado e a simpatia desse povo”.
Entre os inúmeros
admiradores que deixou na capital paraense, Dom Orani conta com o afeto da grande intérprete Fafá de
Belém, que já cantou em várias ocasiões na festa do Círio de Nazaré quando ele
governava a diocese.
Uma vez bispo, ocupou, com
sucesso e eficiência, a coordenação do setor de comunicação da CNBB. Este
interesse e valorização da comunicação permitiram que, uma vez nomeado
arcebispo do Rio, tenha sabido capitalizar para a cidade onde se encontra sua
diocese uma série de eventos importantes, que muito valorizaram a presença do
Rio na Igreja do Brasil.
Ao chegar à Cidade
Maravilhosa, encontrou uma situação delicada. O Rio era o estado menos católico do Brasil, perdia
fiéis de forma acelerada para as igrejas pentecostais. Os meios que pôs em
prática para enfrentar este problema foram eficazes e criativos: apostou e
investiu em uma assessoria de boa qualidade, motivando muito a adesão e o
voluntariado jovem, usando seus dotes para a comunicação.
É assim que, hoje, os católicos do Rio de Janeiro veem sua pastoral transformada. A Igreja local fervilha de iniciativas positivas, que integram e valorizam o privilegiado quadro natural de beleza no qual está situada. Dom Orani potencializou ainda mais o Cristo Redentor – principal monumento da cidade - que durante seu governo foi declarado Maravilha do mundo. Ali botou um padre responsável pelo santuário e são frequentes as celebrações que naquele lugar acontecem.
Alguns encontros que tive com ele reforçam este perfil que sempre demonstrou a mim, de uma simplicidade profunda unida a uma prática ancorada em uma intensa espiritualidade. O primeiro foi na PUC do Rio, da qual é grão chanceler. Quando foi nomeado arcebispo da diocese, o reitor da Universidade queria organizar uma visita oficial do novo bispo a fim de apresentá-lo à comunidade acadêmica. A agenda do novo arcebispo estava cheia e a data marcada ficava um tanto longínqua. Não havendo outra possibilidade, foi confirmada.
Muito antes daquele dia, fui
convidada pelo Departamento de Comunicação Social a assistir aos filmes que
concorriam à Margarida de Prata, prêmio da CNBB ao filme brasileiro que mais
defende os direitos humanos. Encaminhei-me à sala de projeção, que já se
encontrava de luz apagada. Vislumbrei outra pessoa na sala, já sentada e
atenta ao filme que começava. Qual não foi minha surpresa ao ver que era
Dom Orani.
Discretamente, entrou na universidade muito antes da data oficial
marcada para sua “primeira” visita e passou pelo campus como um de tantos, sem
anunciar sua presença. Celebrei com ele assistindo filmes essa sua
primeira visita extra oficial à nossa universidade.
De outra vez, eu estava fora do Rio, em Petrópolis, quando meu celular tocou às 7h da manhã. Surpreendi-me com a voz do outro lado, que se identificou simplesmente: É Dom Orani. Assustei-me, devo confessar.
Àquela hora, o bispo ligar
para minha casa... O que podia ter acontecido? Pensei que era uma notícia ruim.
Ele riu e disse que era uma coisa boa. E efetivamente, passou o
aparelho a Monsenhor Scoti, presidente da Associação Josef Ratzinger, que me
convidou a apresentar o livro do Papa Bento XVI sobre a Infância de Jesus em
Roma. Emocionada, aceitei. Quando fui agradecer a Dom Orani, me
disse que depois contasse minha experiência. Foi o que fiz em um evento
organizado então pela própria diocese sobre o livro em questão.
Esta é minha experiência com
Dom Orani: um homem profundo e simples, direto e próximo. Uma presença
apostólica forte e uma visão larga e positiva à frente da Igreja do Rio de Janeiro.
E agora, essa mesma Igreja do Rio celebra alegremente sua recente nomeação como cardeal pelo Papa Francisco. Já estiveram juntos no grande sucesso que foi a Jornada Mundial da Juventude. Agora trabalharão mais próximos ainda. Enquanto a Igreja Universal vive como um sopro de esperança o pontificado de Francisco, a Igreja da Cidade Maravilhosa cumprimenta feliz seu novo arcebispo, agora cardeal. Que o Espírito Santo fecunde abundantemente sua missão, é o que desejamos todos!
Maria Clara Lucchetti Bingemer é professora do Departamento de Teologia da PUC-Rio. A teóloga é
autora de “O mistério e o mundo – paixão por Deus em tempo de
descrença” (Editora Rocco).
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