Por Marcelo Barros
O cuidado com a
saúde é prioritário como ética da vida. É um direito humano consagrado pela ONU
e do qual os governos devem zelar.
Cada ano, a ONU
consagra o 07 de abril, como “dia mundial da saúde”. É a data em que, em 1948,
foi criada a Organização Mundial da Saúde (OMS), com a qual os países membros
da ONU têm compromisso de atuar e colaborar. Não é uma data festiva, até porque
não há muitas conquistas a comemorar. Em um mundo no qual mais de um bilhão de
pessoas sofre de extrema pobreza, agravada desde o início deste século XXI, em
diversos continentes, a fome ainda parece uma epidemia e a saúde um bem quase
inalcançável.
Nas últimas
décadas, a maioria dos governos diminuiu os encargos do Estado com a saúde.
Nisso, quase todos seguem as diretivas do Banco Mundial. Esse defende que os
investimentos na saúde têm dois tipos de serviço: os competitivos, passiveis de
financiamento (por exemplo, campanhas de vacinação) e os discricionários,
oferecidos à sociedade, de acordo com a capacidade de aquisição das pessoas.
Isso significa que, no dia a dia, a atenção à saúde tem de ser comprada no
mercado. De fato, na maior parte dos países, se multiplicam os planos privados
e se vende saúde, como se fosse Coca-Cola.
A Constituição Brasileira
estabelece que “saúde é direito de todos e dever do Estado”. Depois de uma
longa luta dos movimentos populares, a implantação do Sistema Único de Saúde
(SUS), no início da década de 90, foi uma grande e maravilhosa conquista da
sociedade brasileira. No entanto, poucos anos depois, os governos, mesmo os que
se dizem contra a privatização, inventaram formas de terceirização que mascaram
o processo de privatização, tanto de hospitais públicos, como do atendimento
das clínicas tipo UPA. Entregam a organizações privadas a administração de
hospitais e equipamentos de saúde do Estado. Assim, o Estado investe e gasta,
mas é o setor privado que administra e lucra. Isso não tem garantido um bom
atendimento da saúde do povo porque o sistema privado só cuida daquilo que lhe
dá lucro e benefícios. Sua forma de atuar é a exploração da doença, a
multiplicação de remédios e de tudo o que possa dar dinheiro. É tudo contrário
ao verdadeiro cuidado com a saúde.
A Organização
Mundial da Saúde (OMS), define a saúde como “o estado de completo bem-estar
físico, psíquico, mental e social”. Consiste não apenas em não estar doente,
mas em alcançar um equilíbrio de vida sadia. De acordo com esse critério,
ninguém tem saúde completa. Começamos a adoecer e morre desde a hora em que
nascemos. Durante toda a vida, estamos sempre lutando para vencer alguma fragilidade
do corpo ou do espírito que atenta contra a saúde. E isso não é só uma luta
individual, mas é comunitária e social. Quando alguém adoece, toda a família da
pessoa e os seus mais próximos sofrem e se sentem mais frágeis. Mesmo se a
doença não é contagiosa em termos físicos, ela passa um clima que atinge a todo
ambiente em redor. Por isso, também, a saúde deve ser buscada tanto no nível
pessoal, como para todos ao nosso redor. Ou estamos todos com saúde ou a
energia da doença nos aprisiona a todos. Lutar pela saúde é buscar viver de
modo sadio, desenvolver hábitos saudáveis, alimentar-se de forma correta, mas
principalmente abrir sempre o próprio eu para sair de si e viver uma
amorosidade que nos proteja de todo pessimismo e autofechamento.
As religiões
antigas chamavam essa energia positiva de salvação
e de divinização do ser humano. A salvação não é só a libertação das culpas
ou de alguma condenação, mas é uma qualidade de vida e de graça que transforma
as nossas vidas. A diferença entre uma pessoa santa e uma pessoa sana (sadia) é
apenas um t.
Nesse quadro, as antigas
tradições espirituais têm como finalidade o cuidado com a saúde plena de todo
ser humano. As novas Constituições cidadãs, de países como a Venezuela, a Bolívia
e o Equador resgatam isso quando legislam que o objetivo do Estado é aquilo que
os povos andinos chamam de sumak kwasay, ou o “bom viver” (Constituição do
Equador, artigo 14). É o equivalente à saúde no sentido de equilíbrio de vida e
de paz. Saúde pública não pode ser mercadoria. Em ano de campanha eleitoral, é
bom lembrar disso e votar não apenas por esse ou aquele candidato e sim por um
projeto mais humano e justo de país e de mundo. O compromisso com a saúde
pública é uma questão social, política, ética e também espiritual. Curar os
doentes foi o modo principal pelo qual Jesus manifestou o amor divino por todo
mundo.
Marcelo
Barros, monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e
assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades
eclesiais de base e de movimentos populares. É coordenador latino-americano da
ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45
livros publicados no Brasil e em outros países.
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