Por Frei Betto
Em outubro, Francisco acolheu, no Vaticano, dirigentes de movimentos populares
de vários países, entre os quais o Brasil.
Disse ao recebê-los: “Os pobres não só padecem a injustiça, mas também lutam
contra ela! Não se contentam com promessas ilusórias, desculpas ou pretextos.
Também não estão esperando de braços cruzados a ajuda de ONGs, planos
assistenciais ou soluções que nunca chegam ou, se chegam, chegam de maneira que
vão em uma direção ou de anestesiar ou de domesticar. Isso é meio perigoso.
Vocês sentem que os pobres já não esperam e querem ser protagonistas, se
organizam, estudam, trabalham, reivindicam e, sobretudo, praticam essa
solidariedade tão especial que existe entre os que sofrem, entre os pobres.”
Em linguagem coloquial, Francisco frisou que solidariedade significa algo mais
do que atos de generosidade esporádicos: “É pensar e agir em termos de
comunidade, de prioridade de vida de todos sobre a apropriação dos bens por
parte de alguns. Também é lutar contra as causas estruturais da pobreza, a
desigualdade, a falta de trabalho, de terra e de moradia, a negação dos
direitos sociais e trabalhistas. É enfrentar os destrutivos efeitos do Império
do dinheiro.”
Ao
destoar da retórica dos políticos que temem o protagonismo popular, Francisco
acentuou: “Não é possível abordar o escândalo da pobreza promovendo estratégias
de contenção que, unicamente, tranquilizem e convertam os pobres em seres
domesticados e inofensivos. Como é triste ver quando, por trás de supostas
obras altruístas, se reduz o outro à passividade, se nega ele ou, pior, se
escondem negócios e ambições pessoais: Jesus lhes chamaria de hipócritas.”
Ao lembrar que, hoje, a maioria dos seres humanos não dispõe de terra, teto e
trabalho, o papa ironizou: “É estranho, mas, se falo disso para alguns,
significa que o papa é comunista. Não se entende que o amor pelos pobres está
no centro do Evangelho. Terra, teto e trabalho – isso pelo qual vocês lutam –
são direitos sagrados.”
Sobre terra, disse Francisco: “A apropriação de terras, o desmatamento, a
apropriação da água, os agrotóxicos inadequados são alguns dos males que
arrancam o homem da sua terra natal.”
Quanto à fome, alertou o papa: “Quando a especulação financeira condiciona o
preço dos alimentos, tratando-os como qualquer mercadoria, milhões de pessoas
sofrem e morrem de fome. Por outro lado, descartam-se toneladas de alimentos.
Isso é um verdadeiro escândalo. (...) Sei que alguns de vocês reivindicam uma
reforma agrária para solucionar alguns desses problemas, e deixem-me dizer-lhes
que, em certos países, e aqui cito o Compêndio da Doutrina Social da
Igreja, "a reforma agrária é, além de uma necessidade política, uma
obrigação moral."
E quanto ao teto, Francisco lançou o apelo: “Uma casa para cada família. (...)
Hoje há tantas famílias sem moradia, ou porque nunca a tiveram, ou porque a
perderam por diferentes motivos. Família e moradia andam de mãos dadas.”
Frei Betto é escritor,
autor de “Fome de Deus” (Paralela), entre outros livros.
http://www.freibetto.org/>
twitter:@freibetto.
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