por Frei Betto
Essas duas interrogações movimentam os grupos de oração que assessoro. Diante
da depressão cívica que assola o Brasil, há que recorrer à lâmpada de Diógenes
e buscar luz no fim do túnel.
Utopia significa quimera, o que não se pode alcançar. Eduardo Galeano a
comparou ao horizonte: quanto mais se caminha rumo a ele, mais ele se afasta.
No entanto, ele norteia os nossos passos. O termo foi cunhado por Thomas Morus,
santo católico, no livro de mesmo título publicado na Inglaterra, em 1516.
“Que fazer?” é o titulo do livro de Lênin, editado em 1902 para motivar os
comunistas russos à revolução vitoriosa em 1917.
As duas indagações nos interpelam hoje. Responder à primeira não é difícil:
queremos outros mundos possíveis, onde não haja injustiça e no qual sejam
partilhados os frutos da Terra e do trabalho humano. Só à poderosa minoria que
desfruta da desigualdade social não interessa o colapso do capitalismo
neoliberal.
Os cristãos, em decorrência de sua fé, têm a obrigação moral de não se
conformar com esse mundo. Devemos centrar a esperança no Reino de Deus que,
para Jesus, não era apenas uma instância pós-morte, mas um projeto a se
realizar no futuro histórico.
Por isso, Jesus foi condenado como prisioneiro político. Pregou, sob o reino de
César, outro reino...
Porém, “que fazer?” É mais fácil listar o que “não fazer”: compactuar com a
opressão e a corrupção; aceitar discriminações; sobrepor a competitividade à
solidariedade; ferir a ética e contrariar os direitos humanos etc.
Quanto ao fazer, cabe a cada um, dentro de seu contexto e segundo suas
possibilidades, dar respostas efetivas. Considero tarefa imediata organizar a
esperança. Reforçar movimentos sociais que defendem os direitos dos mais
pobres, animar jovens a abraçar a utopia, fomentar educação popular na formação
de novos protagonistas sociais.
É preciso resistir à tentação de descartar o partido político como mediador
entre sociedade civil e Estado. Para equacionar problemas de convivência
social, o ser humano ainda não inventou outro recurso melhor do que a política.
Quem tem nojo da política é governado por quem não tem. E tudo que os políticos
safados esperam é que tenhamos bastante nojo da política.
Para mediar a relação sociedade civil e Estado também não se criou outra instância
melhor fora dos partidos. São eles que sistematizam nossos anseios de cidadania
em programas e projetos a serem administrados e realizados pelo Estado.
Se um partido desce ladeira abaixo após perder a identidade que o diferenciava,
para melhor, dos demais partidos, não haverá quem acione a luta interna para
que o partido retorne a seus princípios originários?
Os novos partidos serão capazes de evitar os erros cometidos pelos que trocaram
o projeto de Brasil pela ambição de poder?
Repito: é hora de deixar o pessimismo para dias melhores. O mistério pascal
ensina que a vida sempre prevalece sobre a morte, ainda que as aparências
indiquem o contrário.
Frei Betto é escritor,
autor do romance policial “Hotel Brasil” (Rocco), entre outros livros.
http://www.freibetto.org/>
twitter:@freibetto.
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