por Juracy Andrade
Quando ocorre
uma catástrofe como a que acaba de atingir o Nepal, pequenino e pacífico país
espremido entre a Índia e a China, há geralmente uma grande mobilização de
ajuda de países abastados. É como se dissessem: a gente ajuda vocês desde que
não saiam daí nem queiram invadir nossos paraísos. Depois de anos de tragédias
no Mediterrâneo, com barcos precários traficando milhares de migrantes do
Oriente Médio e da África para a Europa, somente agora os governos da União
Europeia começam a tomar conhecimento do grave problema. E só depois que o papa
Francisco visitou a ilha de Lampedusa e exigiu soluções para tanta
desumanidade. Foi um pontifício esporro.
Tragédia e
catástrofe por todo o mundo é o que não falta. Durante anos, na época de
chamada guerra fria, os “democratas” e os governos do “mundo livre” ciscaram e
reclamaram contra o Muro de Berlim. Era visto por essa gente como o símbolo
máximo dos males do comunismo. Até hoje, mais de 20 anos depois, tem quem fale
emocionado da derrubada do tal muro. Só não se lembram de tantos muros
espalhados aí pelo “mundo livre”. Onde mais há é entre Israel e a Palestina;
pior, dentro do que restou da própria Palestina, na qual o governo sionista
espalha colônias judias. É muro pra lá, muro pra cá. Entre regiões do México e
os Estados Unidos também há possantes muros. Mas como há, para o governo de
Washington, ditaduras do bem e do mal, também há muros do bem e do mal. Os que
cercam os palestinos e impedem mexicanos pobres e mestiços de terem acesso ao
mercado de trabalho estadunidense seriam os “muros do bem”.
Cinismo é isso. Um
exemplo: em 1993, Yitzhak Rabin e Yasser Arafat, líderes de Israel e da
Palestina, assinaram os Acordos de Oslo, um excelente guia para uma paz justa e
definitiva entre os dois povos. Do lado de Israel, tudo indica que era só para
Rabin ganhar o Prêmio Nobel junto com Arafat. Um ano depois, ele foi
assassinado por um fanático judeu e teve início a gloriosa (!?) Era Natanyahu.
Estou tratando
de um assunto eminentemente político. Mas também profundamente religioso, o que
não me afasta da temática deste Porta-Voz. Os cristãos primitivos e o próprio
Jesus Cristo eram judeus. Há controvérsias sobre se havia uma intenção de criar
uma nova religião, tanto o cristianismo mergulha na religião e na cultura
judaicas. O certo é que Paulo, após brigar com Pedro, foi pregar o Evangelho no
mundo greco-romano e, de equívoco em equívoco (não esquecer a adoção do
cristianismo como religião oficial do Império; uma heresia abençoada por Roma),
judeus e cristãos foram se afastando cada vez mais uns dos outros. Há facções
cristãs que se dizem sionistas cristãos. E o soi-disant bispo Edir Macedo
ergueu, em São Paulo, uma réplica suntuosa do Templo de Salomão.
Há, na questão
Palestina-Israel, uma grande mistificação que é preciso derrubar para se poder
chegar a uma plena unidade. Creio que já me referi, neste espaço, ao livro The ethnic cleansing of Palestine (que
li em tradução francesa), do historiador Ilan Pappe, que é judeu e cidadão
israelense. Ele diz e prova como a criação do Estado de Israel obedeceu a um
projeto sionista fundamentalista, que incluía e continua incluindo a limpeza
étnica dos antigos habitantes da chamada Terra Santa. Definida a partilha do
território submetido anteriormente a mandato britânico, judeus treinados e
apoiados inclusive pelos líderes do Partido Trabalhista (tido como de esquerda)
partiram para destruir centenas de vilas palestinas delas expulsando seus
proprietários e habitantes, que até hoje não podem para ali retornar.
Sob lideranças
incompetentes, o que sobrou para os palestinos foi sendo comido pelas beiradas
em sucessivas guerras movidas pelo Egito, Jordânia, Síria. E mais recentemente
por colônias judias que fazem da Palestina uma colcha de retalhos. Tudo
ilegalmente, mas com a proteção e apoio dos Estados Unidos e tolerância acovardada
da ONU. O Líbano, que não fez nenhuma guerra e era a Suíça do Oriente Médio,
foi completamente desmantelado por Israel, que se julgou no direito de
invadi-lo para caçar refugiados palestinos, aproveitando para destruir as
estruturas e a credibilidade do país. De quebra, acabaram também com a
tolerância religiosa entre muçulmanos e cristãos que era sua marca.
Ano passado, foi
publicado, por professores da Universidae do Havaí (EUA) um excerto de artigos
da revista Biography, daquela
universidade, sob o título Life in
occupied Palestine. Nele diz a professora Cynthia Franklin: “A ocupação
militar israelense e a colonização da Palestina são ilegais e imorais”. Pronto.
Ponto. Do ponto de vista político, os sionistas querem vingar o Holocausto nas
costas dos palestinos. Do ponto de vista religioso, as ações do Estado judaico
afastam cada vez mais o Evangelho da Torá.
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Juracy Andrade é
jornalista com formação em filosofia e teologia
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