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terça-feira, 17 de novembro de 2015

AS DIFERENÇAS RECONCILIADAS


Por Marcelo Barros

Reconciliar as diferenças é uma proposta ecumênica do Conselho Mundial de Igrejas que reúne 349 Igrejas cristãs no caminho da unidade a partir da plena aceitação da autonomia de cada uma, como também das diferenças que existem entre uma e outra. Conviver com as diferenças e mesmo aprender tcom elas é um desafio não só para as Igrejas cristãs, mas para todas as religiões e para o diálogo entre as culturas. É um problema que atualmente provoca conflitos violentos entre grupos e até entre povos. Por isso, a ONU consagrou 16 de novembro como o dia internacional da tolerância. Propõe que, nessa semana, em todos os continentes, se façam esforços pelo diálogo e compreensão entre grupos e culturas diferentes. De fato, o mundo atual é cada vez mais diversificado e pluralista. A cada momento, através dos meios de comunicação ou da internet ou simplesmente pela convivência cotidiana, pessoas de diferentes culturas e religiões devem conviver entre si. Para viver bem essa realidade, não basta tolerância. A tolerância evita o confronto e a guerra, mas não chega a criar um ambiente positivo de diálogo e compreensão. Normalmente se tolera aquilo que não se pode evitar. Ninguém quer ser apenas tolerado. As pessoas, grupos e culturas merecem ser respeitados e valorizados. Por isso, é importante deixar claro: a ONU usa o termo tolerância no sentido de aceitação, respeito e convivência entre as religiões.

A sociedade atual fala em “tolerância zero” para a corrupção que a corrói por dentro e para crimes contra a vida e a integridade das pessoas, especialmente as mais frágeis. Esse rigor é justo, mas não pode ignorar ou passar por cima a dignidade de toda pessoa humana. Menos ainda, pode ser usado como pretexto para discriminar negros, pobres e migrantes. O problema é que a lei pode impedir a discriminação e a injustiça, mas não pode obrigar ninguém a amar o diferente e a valorizar uma cultura que não é a sua. Isso supõe uma opção “espiritual”, ou seja, abertura amorosa ao diferente, como opção de vida. De fato, as religiões foram criadas para ensinar as pessoas a amar e a fazer do amor uma lente especial com a qual se olha a vida, as pessoas e as culturas. Entretanto, quando se deixam aprisionar pelo autoritarismo e pelo dogmatismo, as religiões interpretam a fé de forma rígida e se tornam fonte de intransigência, intolerância e violência. Na história, todas as religiões, de um modo ou de outro, tiveram momentos de intolerância e combateram-se entre si.

Hoje, o Brasil é um país leigo, mas ainda dominado por uma cultura de Cristandade. Infelizmente, no Congresso nacional e em outras instâncias do poder, existem pessoas ligados a grupos religiosos que creem em um Deus mesquinho, amigo dos seus amigos e discriminador contra todos os que não cabem dentro das leis religiosas que essas pessoas imaginam vir diretamente do céu. Diante desse tipo de postura, muitas pessoas honestas e justas pensam: se Deus é assim, prefiro ser ateu. Um dia, um rapaz declarou ao bispo Dom Pedro Casaldáliga: “eu sou ateu”. Dom Pedro lhe respondeu: “Ateu, de que Deus?”.

A ONU convida Igrejas, religiões e organismos da sociedade civil a unir-se na construção de uma sociedade pluralista e aberta. Toda Igreja cristã, seja qual for sua denominação, é chamada a ser verdadeiramente aberta a tudo o que é humano. Essa atitude testemunha para os outros o amor divino e nos confirma a todos no caminho do evangelho de Jesus Cristo que afirmou: “Muitas pessoas (de diferentes culturas e religiões)  virão do Oriente e do Ocidente e se sentarão à mesa do reino de Deus, enquanto aqueles que se consideravam de dentro ficarão fora” (Mt 8, 11).


Marcelo Barros, monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades eclesiais de base e de movimentos populares. É coordenador latino-americano da ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45 livros publicados no Brasil e em outros países.

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