Por Leonardo Boff
Nestes dias, de 30 de novembro a 11 de dezembro de
2015, está se celebrando mais uma Convenção das Mudanças Climáticas (COP 21) em
Paris. Todas as realizadas até hoje chegaram a convergências pífias, muito
distantes das exigências que o problema global exige. Há uma razão intrínseca
ao atual sistema socioeconômico mundializado que impede alcançar objetivos
comuns e adequados. É a obsessão pelo crescimento continuado da economia no
nível nacional e internacional que implica uma relação de exploração dos bens e
serviços naturais, muitos deles hoje em alto grau de erosão e exaustão. É
semelhante a um trem que corre sobre trilhos. Ele está condicionado ao rumo que
os trilhos traçam sem outra alternativa.
A metáfora vale para o atual sistema global. A obsessão pelo
crescimento é medido pelo aumento do PIB. Fala-se em desenvolvimento, mas na
verdade, o que se busca é o crescimento material. O crescimento pertence aos
processos vitais. Mas sempre dentro de limites. Uma árvore não cresce
ilimitadamente para cima nem nós crescemos fisicamente de forma indefinida.
Chega um ponto em que o crescimento cessa e outras funções tomam o seu lugar.
Ocorre que um planeta limitado e escasso de bens e serviços
como o nosso, não tolera um crescimento ilimitado. Já nos demos conta de seus
limites intransponíveis. Mas o sistema não toma tal fato em consideração com a
devida seriedade que ele exige.
Disse-o com grande lucidez o co-fundador do ecosocialismo, o
franco-brasileiro Michael Löwy: “Todos os faróis estão no vermelho: é evidente
que a corrida louca atrás do lucro, a lógica produtivista e mercantil da
civilização capitalista/industrial nos leva a um desastre ecológico de
proporções incalculáveis; a dinâmica do crescimento infinito, induzido pela
expansão capitalista, ameaça destruir os fundamentos da vida humana no
planeta”(Ecologia e socialismo 2005, 42).
A questão central não está, como viu o Papa Francisco em sua
encíclica sobre O cuidado da Casa Comum, na relação entre
crescimento e natureza. Mas entre ser humano e natureza. Este não se sente
parte da natureza, mas seu dono que pode dispor dela como bem quiser. É o
detestável antropocentrismo. Não cuida dela nem se responsabiliza pelos danos
da voracidade de um crescimento infinito com o consumo ilimitado que o
acompanha. Assim caminha célere rumo a um abismo, talvez num percurso sem
volta.
Entre as muitas consequências desta lógica perversa é o
aquecimento global que não cessa de crescer. Desconsiderando os negacionistas,
há dois dados seguros, estabelecidos pela melhor pesquisa mundial: primeiro:
o aquecimento é inequívoco; não dá para negá-lo, basta olharmos em volta e
constatarmos os eventos extremos que ocorrem em todo o planeta; o sinal
comprobatório inegável é o acelerado degelo das calotas polares; segundo:
para além da geofísica da própria Terra que conhece fases de aquecimento e de
esfriamento, este aquecimento é antrópico, vale dizer, resultado, na
ordem de 95% de certeza, da ininterrupta intervenção humana nos processos
naturais. O aquecimento que seria normal vem fortemente intensificado,
especialmente nos últimos decênios, pelos gases de efeito estufa: o vapor
d’água, o dióxido de carbono, o metano, o óxido nitroso e o ozônio. Esses gases
funcionam como uma estufa que segura o calor aqui em baixo, impedindo que se disperse
para o alto, aquecendo em consequência o planeta.
Toda luta é limitarmo-nos à média de dois graus Celsius (em
alguns lugares pode chegar a 4 até 7 graus C ou noutros sobrevem um frio
inesperado). Mas a média global se estabilizaria em torno de 2 graus Celsius.
Tal medida permitiria um gerenciamento razoável de adaptação e
de mitigação. Para mantermo-nos nestes limites, dizem-nos os cientistas,
deveríamos reduzir a emissão dos gases em 80% até 2100; alguns o antecipam para
2050. A maioria acha isso inalcançável.
Se no entanto, por descuido humano, a temperatura chegar
entre 4-6 graus Celsius, por volta desta data, como previu a comunidade
científica norte-americana, a vida que conhecemos corre risco de desaparecer e
atingir grande parte da espécie humana.
O Secretário da ONU Ban Ki Moon advertiu recentemente:“As
tendências atuais estão nos levando cada vez mais perto de potenciais pontos de
ruptura, que reduziriam de maneira catastrófica a capacidade dos ecossistemas
de prestarem seus serviços essenciais”. François Hollande, primeiro- ministro
francês, em seu pronunciamento na abertura dos trabalhos em Paris no dia 30 de
novembro falou que agora nos é oferecida a última chance. Se não chegarmos a
uma decisão coletiva, entraríamos na zona de alto risco.
A consequência não pode ser outra: temos que mudar de
rumo ou conheceremos a escuridão. Há que estabelecer uma nova relação para
com a Terra; há que se produzir para atender as demandas humanas e da
comunidade de vida mas dentro dos limites de sua biocapacidade, respeitando
seus ciclos e limites. Fundamental é sentirmo-nos parte dela, cuidá-la para
garantir-lhe a sustentabilidade necessária para nos dar aquilo que sempre nos
deu. Deveremos aprender a ser mais com menos e a assumir uma sobriedade
compartida em comunhão com a biodiversidadade, da qual depende, em grande
parte, a nossa vida sobre este planeta.
Ou faremos esta “conversão ecológica”(Papa Francisco) ou
estará comprometida nossa trajetória sobre esse pequeno e belo planeta.
Leonardo Boff é articulista do JB on line, ecoteólogo,
filósofo e escritor
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