Por Frei Betto
Perguntei
a Fidel Castro, em 1980, quando o conheci em Manágua, por que o Estado cubano
era confessional. Ele levou um susto. “Como confessional? Somos ateus!”
Reagi: “Professar ou negar a existência de Deus é confessionalidade,
Comandante. A modernidade exige partidos e Estados laicos.” Ele afinal
concordou.
Pouco depois, o Estatuto do Partido Comunista de Cuba e a Constituição do país
foram modificados para imprimir caráter laico às duas instituições.
Laico ou leigo é aquele que não atua condicionado por orientação religiosa.
Estado confessional é o que adota oficialmente uma determinada crença, como o
Estado do Vaticano e a Costa Rica, católicos; o Estado de Israel, adepto do
judaísmo; e vários outros do mundo árabe, que professam o islamismo. Também os
países comunistas, com seus Estados oficialmente ateus, eram confessionais.
A
modernidade introduziu o Estado laico, que não abraça uma religião específica e
representa todos os cidadãos, sejam eles desta ou daquela profissão de fé -
crentes, ateus ou agnósticos.
Há
hoje, contudo, segmentos religiosos interessados em impor suas convicções
doutrinárias a todo o conjunto da sociedade. E só há dois modos de fazê-lo:
converter todos os cidadãos a uma crença religiosa (o que é impossível) ou pela
via do poder político. Criam-se bancadas religiosas nos parlamentos para, uma
vez empossados deputados e senadores, aprovarem leis que obriguem todos os
cidadãos a agirem segundo determinados preceitos religiosos.
Exemplos de medidas consideradas válidas para quem segue determinado preceito
religioso, mas abusivas quando impostas ao conjunto da sociedade são: não
ingerir bebidas alcoólicas; autorizar terapeutas a tentar reverter a
homossexualidade; proibir nas escolas o ensino do evolucionismo (os símios são
os nossos antepassados) e propagar o criacionismo (Deus criou o mundo tal como
descrito na Bíblia: descendemos todos de um casal - Adão e Eva).
Em
uma sociedade democrática o direito à manifestação religiosa e instituições
laicas devem conviver em harmonia, sem que um queira se intrometer no outro.
Confessionalizar o Estado é atiçar as chamas do preconceito, da discriminação e
do fundamentalismo. A liberdade religiosa deve ser assegurada, todo preconceito
combatido, toda discriminação punida e todo fundamentalismo desmoralizado.
Nem Deus pretendeu impor a todos os seus filhos e filhas a fé na existência
dele
Frei Betto é escritor,
autor de “Fome de Deus” (Paralela), entre outros livros.
http://www.freibetto.org/>
twitter:@freibetto.
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