Por Marcelo Barros
Nessa quarta feira, o
mundo celebra mais um aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos,
emitido no 10 de dezembro de 1948. Comumente, a sociedade dominante apresenta os
Direitos Humanos apenas como campo de inviolabilidade individual. Nele se
destacam os direitos liberais de ir, vir, comprar e consumir.
Nas últimas décadas, quem
mais invoca a Declaração dos Direitos Humanos são os impérios ocidentais. Eles
insistem nesses direitos individuais, mas para tê-los o passaporte necessário é
o dinheiro. Nesse tipo de sociedade, a pessoa só é cidadã se puder ganhar e
consumir. Ao mesmo tempo que prega direitos individuais para ganhar mais
dinheiro, o governo dos Estados Unidos e seus aliados têm invadido países,
torturado e assassinado pessoas e destruído civilizações e culturas humanas.
Mesmo nos países que eles não invadem, violam a justiça internacional e
patrocinam golpes e financiam os piores partidos políticos, sempre à sombra dos
direitos humanos e até do nome de civilização cristã.
As antigas civilizações da
Ásia, Oceania e África, assim como as comunidades índias e afrodescendentes da
América insistem que os direitos não são apenas individuais e sim comunitários
e coletivos. Também não isolam direitos humanos do cuidado com a mãe-terra, dos
animais e de todos os seres vivos que se tornam assim, de alguma forma,
sujeitos de direitos. É uma outra concepção de direitos humanos. É dever das pessoas
de bem, das comunidades e organizações sociais incorporar em seu trabalho essas
concepções contra hegemônicas e alternativas dos Direitos Humanos. O amor
incondicional e solidário nos leva a assumir a responsabilidade ética pelos
mais frágeis e marginalizados por essa sociedade cruel. No entanto, além de solidarizar-se
à luta dos lavradores, índios, negros, mulheres oprimidas e todas as categorias
de alguma forma vítimas da sociedade excludente, essa solidariedade nos leva a
um novo modo de pensar e viver a relação com a Terra, a água, a natureza, os
animais e todo ser vivo. Também, a
Terra, as águas, os animais e as plantas precisam ser cuidados e defendidos.
Não podemos tratá-los como se fossem meras mercadorias. Conosco eles formam uma
grande teia de relação que é como uma comunidade: a comunhão da vida.
Esse modo de viver e
compreender a vida e os direitos humanos faz parte de uma cultura amorosa que
compreende e pratica a Espiritualidade como forma de viver plenamente humana e
humanizadora. As tradições religiosas têm como missão ajudar as pessoas a aprofundar
esse sentido mais profundo da vida. Infelizmente, ainda há muita gente que
confunde Espiritualidade com Espiritualismo e trata a fé como se se tratasse de
um assunto meramente íntimo da relação livre do fiel com uma divindade. A
mística francesa Simone Weil afirmava: “Eu reconheço quem é de Deus não quando
me fala de Deus, mas pelo seu modo de tratar as outras pessoas”.
Todas as religiões, de uma
forma ou de outra, reconhecem: o divino só pode ser encontrado realmente no
humano. A espiritualidade, religiosa ou não, faz da defesa dos direitos do ser
humano e da natureza um método de intimidade com o Divino, presente no mundo. No
século II, Irineu, pastor da Igreja de Lyon, ensinava: “Como você poderá
divinizar-se se ainda nem se tornou humano? Antes de tudo, garanta a condição
de ser humano e, assim, poderá participar da glória divina”.
Marcelo
Barros, monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e
assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades
eclesiais de base e de movimentos populares. É coordenador latino-americano da
ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45
livros publicados no Brasil e em outros países.
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