Por Leonardo Boff
Há vozes de personalidades de
grande respeito que advertem que estamos já dentro de uma Terceira Guerra
Mundial. A mais autorizada é a do Papa Francisco. No dia 13 de setembro deste
ano, ao visitar um cemitério de soldados italianos mortos em Radipuglia perto
da Eslovênia disse:”a Terceira Guerra Mundial pode ter começado, lutada aos
poucos com crimes, massacres e destruições”. O ex-chanceler alemão Helmut
Schmidt em 19/12/2014 com 93 anos adverte acerca de uma possível Terceira
Guerra Mundial, por causa da Ucrânia. Culpa a arrogância e os militares
burocratas da União Européia, submetidos às políticas belicosas dos USA.
George W. Bush chamou a guerra ao
terror, depois dos atentados contra as Torres Gêmea, de “World War III”. Eliot
Cohen, conhecido diretor de Estudos Estragégicos da Johns Hopkins University,
confirma Bush bem como Michael Leeden, historiador, filósofo neoconservador e
antigo consultor do Conselho de Segurança dos USA que prefere falar na Quarta
Guerra Mundial, entendendo a Guerra-Fria com suas guerras regionais como já a
Terceira Guerra Mundial. Recentemente (22/12/2014) conhecido sociólogo e
analista da situação do mundo Boaventura de Souza Santos escreveu um
documentado artigo sobre a Terceira Guerra Mundial (Boletim Carta Maior de
22/12/2014). E outras vozes autorizadas se fazem ouvir aqui e acolá.
A mim me convence mais a análise,
diria profética, pois está se realizando como previu, de Jacques Attali em seu
conhecido livro “Uma breve história do futuro” (Novo Século, SP 2008). Foi
assessor de François Mitterand e atualmente preside a Comissão dos “freios ao
crescimento”. Trabalha com uma equipe multidisciplinar de grande qualidade. Ele
prevê três cenários:
(1) o superimpério composto pelos
USA e seus aliados. Sua força reside em poder destruir toda a humanidade. Mas
está em decadência devido à crise sistêmica da ordem capitalista. Rege-se pela
ideologia do Pentágo do”full spectrum dominance”(dominação do espectro total)
em todo os campos, militar, ideológico, político, econômico e cultural.
Considera-se a nação indispensável, a única que tem interesses globais e se dá
o direito de intervir, em qualquer parte do mundo, caso sejam postos em risco.
Mas foi ultrapassado economicamente pela China e tem dificuldades de submeter
todos à lógica imperial.
(2) O superconflito: com a
decadência lenta do império, dá-se uma balcanização do mundo, como se constata
atualmente com conflitos regionais no norte da Africa, no Oriente Médio, na Africa
e na Ucrânia. Esses conflitos podem conhecer um crescendo com a utilização de
armas de destruição em massa (vide Síria, Iraque), depois de pequenas armas
nucleares (existem hoje milhares no formato de uma mala de executivo) que
destroem pouco mas deixam regiões inteiras por muitos anos inabitáveis devido à
alta radioatividade. Pode-se chegar a um ponto com a utilização generalizada de
armas nucleares, químicas e biológica em que a humanidade se dá conta de que
pode se auto-destruir.
E então surge (3) o cenário
final: a superdemocracia. Para não se destruir a si mesma e grande parte da
biosfera, a humanidade elabora um contrato social mundial, com instâncias
plurais de governabilidade planetária. Com os bens e serviços naturais escassos
devemos garantir a sobrevivência da espécie humana e de toda a comunidade de
vida que também é criada e mantida pela Terra-Gaia.
Se essa fase não surgir, poderá
ocorrer o fim da espécie humana e grande parte da biosfera. Por culpa de nosso
paradigma civilizatório racionalista. Expressou-o bem o economista e humanista
Luiz Gonzaga Belluzzo, recentemente:
“O sonho ocidental de construir o
hábitat humano somente à base da razão, repudiando a tradição e rejeitando toda
a transcendência, chegou a um impasse. A razão ocidental não consegue realizar
concomitantemente os valores dos direitos humanos universais, as ambições do
progresso da técnica e as promessas do bem-estar para todos e para cada
um”(Carta Capital 21/12/2014). Em sua irracionalidade, este tipo de razão,
construi os meios de dar-se um fim a si mesma.
O processo de evolução deverá
possivelmente esperar alguns milhares ou milhões de anos até que surja um ser
suficientemente complexo, capaz de suportar o espírito que, primeiro, está no
universo e somente depois em nós.
Mas pode também irromper uma nova
era que conjuga a razão sensível (do amor e do cuidado) com a razão
instrumental-analítica (a tecnociência). Emergirá, enfim, o que Teilhard de
Chardin chamava ainda em 1933 na China a noosfera: as mentes e os corações unidos
na solidariedade, no amor e no cuidado com a Casa Comum, a Terra.
Escreveu Attali:”quero acreditar,
enfim, que o horror do futuro predito acima, contribuirá para torná-lo
impossível; então se desenhará a promessa de uma Terra hospitaleira para todos
os viajantes da vida (op.cit. p. 219).
E no final nos deixa a nós
brasileiros esse desafio:”Se há um país que se assemelha ao que poderia
tornar-se o mundo, no bem e no mal, esse país é o Brasil”(p. 231).
Leonardo Boff escreveu Hospitalidade: direito e dever de todos, Vozes, Petrópolis 2005.
É
filósofo e teólogo, escritor, assessor do projeto Cultivando Agua Boa
da Itaipu Binacional e um dos co-redatores da Carta da Terra
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