O Jornal On Line O PORTA-VOZ surgiu para ser o espaço onde qualquer pessoa possa publicar seu texto, independentemente de ser escritor, jornalista ou poeta profissional. É o espaço dos famosos e dos anônimos. É o espaço de quem tem alguma coisa a dizer.

terça-feira, 27 de janeiro de 2015

PARA O MUNDO VIVER EM PAZ



Por Marcelo Barros



Há menos de um mês desejávamos uns aos outros um ano novo de paz. No entanto, do início de janeiro até hoje, o mundo continua imerso em um mar de violência. Nos Estados Unidos, policiais mataram mais um jovem negro. Na França, terroristas mataram profissionais da imprensa. Na Síria, a cada dia, execuções e mortes fazem parte do cotidiano de um país devastado. Na Nigéria, o grupo terrorista Boko Haran massacrou recentemente 3000 pessoas, entre homens, mulheres e crianças. Em todo o mundo, ninguém fez nenhuma passeata de protesto por causa disso, já que esses crimes ocorrem na África  e não na França.

No Brasil, não temos guerra declarada, mas nas periferias das nossas cidades, o tráfico não perdoa. Mata. A cada dia, o tráfico ou milícias particulares e, em alguns casos, membros da própria polícia exterminam rapazes da periferia e de preferência negros. Esse extermínio de jovens, com requintes de crueldade, lança sobre o futuro o veneno da desesperança. E os vilões não são extraterrestres. São pessoas comuns, dessas que encontramos a cada dia, na padaria ou na fila de ônibus. Matam porque vivem em uma cultura da violência, na qual, a cada dia, os meios de comunicação social transmitem a ideia de que a pena de morte é a única solução para os problemas do Brasil.  

Nessa semana, na Índia, milhões de pessoas visitam o túmulo do Mahatma Gandhi, em Nova Dehli. Reverenciam o profeta da paz e da não violência, assassinado por um fanático religioso hindu, no dia 30 de janeiro de 1948. Ele ensinava que o único remédio para a violência é não entrar na mesma lógica. Insistia na resistência da não violência ativa e no caminho da verdade. Quase 70 anos depois, a humanidade ainda não aprendeu. Nos Estados Unidos, o pastor Martin-Luther King perdeu a vida, mas, através do método da não violência ativa, venceu a luta contra a discriminação racial. No Brasil, Dom Helder Camara consagrou sua vida à luta pacífica pela justiça e pela paz.

A CNBB quis consagrar esse ano de 2015 como um ano da paz. Certamente, não está se referindo apenas à superação de guerras, mas ao estabelecimento da paz na nossa forma de organizar a sociedade.

No livro “Pedagogia do Oprimido”, Paulo Freire afirma que estamos mal porque seguimos um mau modelo de sociedade e não nos damos conta de que é um caminho equivocado.  As pessoas são orientadas a competir. Vencer na vida passa a significar exercer um domínio sobre outros. A cada dia, a Mãe Terra, explorada e ameaçada, grita de dor. E a humanidade segue sua luta por paz. No entanto, como imaginar que pode ter paz um mundo no qual um pequeno grupo de pessoas privilegiadas possui 90% dos bens disponíveis para todos e o resto, 80% da população da terra tem de viver com 10% ou, segundo a ONU, um pouco mais? No mundo, vários países estão em uma profunda crise social e econômica, mas tentam ainda superar o mal com o próprio veneno que provocou a doença. Como uma iniquidade dessas dimensões, responsável pela morte de muitas pessoas e pela infelicidade de povos inteiros, não se faz impunemente, o sistema se protege com um cifras astronômicas gastas em armamentos. Ainda não se deu conta de que a única coisa que geraria verdadeira segurança seria a igualdade social. No momento atual, nenhum país em crise busca alternativas para esse modelo de organização social. Só poucos países latino-americanos, como Venezuela, Bolívia e Equador, sem poder romper com o sistema social vigente, tentam consertar ou controlar a selvageria capitalista.

É preciso entre as classes mais pobres reorganizar uma educação que crie uma tomada de consciência sobre a realidade. Sem uma educação crítica e uma verdadeira conscientização social, já nos anos 70, afirmava Paulo Freire, nenhuma transformação será possível. Nesse plano, as Igrejas têm uma missão importante. Elas anunciam o evangelho. Ele contém o programa que Deus tem para o mundo todo (o que os evangelhos chamam de “reino de Deus”). Infelizmente, durante séculos, o Cristianismo separou material e espiritual e pregava um céu para depois da morte. Jesus deu sinais do reino ao curar doentes, reconciliar pessoas excluídas com a comunidade e anunciar a libertação de toda pessoa humana. E afirmou: “Quando essas coisas começarem a acontecer, levantem a cabeça porque se aproxima a libertação de vocês”. (Lc 21, 28).
 


 Marcelo Barros, monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades eclesiais de base e de movimentos populares. É coordenador latino-americano da ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45 livros publicados no Brasil e em outros países


Nenhum comentário:

Postar um comentário