Por
Marcelo Barros
Atualmente,
diante da crise ecológica que fere o planeta, ninguém estranha que o cuidado
com a mãe Terra seja prioritário e mereça que a ONU consagre o 22 de abril como
“dia internacional de cuidado com a Terra”. É importante convencer os governos
imperiais que a maior ameaça que o mundo enfrenta não é o terrorismo, por mais
grave que ele seja. É a destruição ecológica que pode tornar a Terra um planeta
desértico e sem vida. As mudanças climáticas que em outras eras geológicas
vinham de mutações atmosféricas, agora são provocadas irresponsavelmente pela
própria sociedade humana, especificamente pelo sistema social e econômico
dominante que transforma a terra em mercadoria e se preocupa apenas com o seu
lucro. Ao contrário, as organizações e grupos sociais do mundo inteiro,
reunidos no 15o Fórum Social Mundial, em março, na Tunísia,
consideraram que o mais urgente e maior desafio no mundo atual é transformar o
modo como as sociedades se relacionam com o planeta. É urgente estabelecer um
jeito novo do ser humano se inserir na comunidade de todos os seres vivos que
habitam o planeta. Como afirmou o físico e pensador Fritjop Kapra, é preciso
mudar o sistema de valores subjacente à economia global para torná-la compatível
com a dignidade humana e com a sustentabilidade ecológica. O problema não é
tecnológico. É cultural, social e político. Por isso, é importante tomarmos
consciência da gravidade da situação, aprofundarmos os caminhos de sua
superação e nos comprometermos em vivermos um modo novo de nos relacionarmos
com a Terra, a água e o conjunto da natureza.
Atualmente,
ninguém mais pode negar que quase dois terços das grandes florestas do mundo
estão destruídas ou em ameaça de destruição. A emissão de dióxido de carbono e
outros gases que causam o efeito estufa na atmosfera só tem aumentado. Na
última década, o Oceano Atlântico teve aumento de um grau na sua temperatura. O
buraco de ozônio que protege a atmosfera terrestre aumentou e ameaça a vida de
populações inteiras e de muitas espécies animais. A extinção da fauna e da
flora em toda a superfície do planeta continua a tal ponto que se calculam em
50 mil espécies vivas que, a cada ano, desaparecem da Terra. Diariamente, se
lançam no ar, na terra e na água novos produtos químicos que envenenam os processos da vida. Ainda por
muitos anos depois de lançados, continuam causando morte. E tudo isso, para saciar
a ambição de uma pequena elite da humanidade que desfruta dos benefícios desse
sistema. Os organismos da ONU atestam que a desigualdade social aumenta em todo
mundo, menos nos países da América Latina que seguem o processo bolivariano
(Venezuela, Equador e Bolívia). Países como o Brasil, Argentina e Uruguai,
conseguiram reduzir a extrema pobreza. No entanto, como não fizeram nenhuma
reforma estrutural, a desigualdade social não diminuiu e a destruição da Terra
continua intensa.
Essa
realidade é muito grave, mas não nos deve levar à desesperança. No Fórum Social
Mundial de Túnis (março de 2015), grupos e organizações sociais do mundo
inteiro se comprometeram em realizar eventos e assembleias em todos os
continentes e regiões do mundo para conscientizar as populações. Na ocasião da
21a Cúpula da ONU sobre mudanças climáticas (Paris, dezembro de
2015), se organizarão peregrinações e caminhadas de todos os continentes a
Paris e ali se fará um fórum de cidadãos
do mundo e amantes do planeta, paralelo à Cúpula da ONU. Nesse encontro, as
organizações sociais querem, não apenas aprofundar ideias, mas mostrar experiências
concretas e bem sucedidas de como, no mundo inteiro, já existem comunidades e
grupos que fazem agricultura ecológica, exploram fontes de energia limpa e até
cidades são administradas de modo ecológico.
Nesse
caminho, as religiões e tradições espirituais têm uma responsabilidade imensa. No
mundo inteiro, a humanidade redescobre a atualidade dos cultos indígenas e
afrodescendentes que aprofundam a intimidade com Deus na relação com a Terra, a
água e os elementos do universo. Mesmo religiões inspiradas em livros como a
Bíblia refazem um caminho de contemplação do Mistério Divino presente na Terra
e em todos os seres vivos. No início dos anos 90, o Conselho Mundial de Igrejas
que reúne 349 Igrejas cristãs fez sua assembleia geral em Camberra, na Austrália.
Ali, o próprio tema geral era “Vem, Espírito Santo, renova toda a criação”. Um
dos documentos finais assevera: “Toda a criação parece ferida, violada e
golpeada pela humanidade que habita um planeta que tem cerca de 4, 5 milhões de
anos e, em menos de dois séculos, o está saqueando. A destruição da Terra e do
ambiente pede em altos brados que nos convertamos e, quanto antes, nos
arrependamos”.
É
preciso incentivar e praticar a agricultura ecológica, rever o modelo de
sociedade tecnológica baseada no petróleo e combustíveis fósseis. Para salvar a
vida na Terra, precisamos retomar um estilo de vida mais sóbrio e comunitário.
O documento do Conselho de Igrejas conclui: “Diante de Deus, somos responsáveis
pela comunidade da vida. .. Tudo isso requer de nós atitudes de compaixão e
humildade e, em nome de Deus, respeito e reverência com a nossa mãe Terra”.
Marcelo Barros, monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades eclesiais de base e de movimentos populares. É coordenador latino-americano da ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45 livros publicados no Brasil e em outros países
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