por Frei Betto
No domingo de Páscoa, 10 de abril de 1955, há 60 anos, em
Nova York, o jesuíta Pierre Teilhard de Chardin, 73, levantou-se da cadeira
para servir-se de chá. Não chegou à mesa. Um ataque cardíaco pôs fim à sua
vida. No enterro não havia mais de três pessoas.
Para muitos, sua morte representou um alívio. Cessara o
movimento daquele cérebro poderoso. Como tantos que ousam pensar pela própria
cabeça e se recusam a acreditar que a verdade é filha da autoridade, Teilhard
teve um final solitário.
Aquela cabeça fora capaz de conceber uma das mais abrangentes visões do
Universo, na qual todos os elementos se integram, das micropartículas
subatômicas à atração de toda a matéria pelo Ponto Ômega, que coroaria o
processo de evolução da natureza.
Essa grandiosa síntese foi registrada em livros e artigos que, durante sua
vida, seus superiores nunca permitiram que fossem publicados, com receio de um
novo caso Galileu.
Editada após a sua morte, a obra de Teilhard alcançou, na década de 1960,
repercussão inesperada. Figurou meses nas listas de best sellers da
Europa e dos EUA.
Em 1962, introduzi Teilhard no Brasil, graças às traduções de Conrad Detrez. Os
resumos em apostilas mimeografadas, vendidos à porta de faculdades do Rio, estão
hoje no livro “Sinfonia universal – a cosmovisão de Teilhard de Chardin”
(Vozes). Mais tarde, graças a Teilhard, aprofundei a relação entre
espiritualidade e física quântica em “A obra do artista – uma visão holística
do Universo” (José Olympio).
Nascido na França, Teilhard era filho de uma neta de Voltaire, pensador que
introduziu em seu país as teorias de Isaac Newton e combateu toda espécie de
superstição e intolerância.
Aos 11 anos, aluno de colégio jesuíta, Teilhard demonstrava interesse por
matéria que não constava do currículo, a geologia. Teve a sorte de encontrar um
mestre que o convenceu de que o melhor serviço a Deus pode ser o amor às
pedras...
Em 1913, aos 32 anos, descobriu o amor a uma mulher. “Estando desde a infância”
– escreve ele em “O coração da matéria” – “à procura do coração da matéria, era
inevitável que, um dia, eu me encontrasse face a face com o Feminino. [...]
Parece-me indiscutível que ao homem – mesmo a serviço de uma causa ou de Deus –
não é possível nenhum acesso à maturidade e à plenitude espirituais fora de
qualquer influência sentimental que venha nele sensibilizar a inteligência e
suscitar, pelo menos inicialmente, as potências de amar.”
Doutorou-se em ciência em 1922, na Sorbonne e, em 1923, fez sua primeira viagem
à China. Participou da descoberta da primeira prova da existência do homem
pré-histórico. Escreveu, então, uma de suas mais belas obras, A missa
sobre o mundo.
De volta a Paris, em 1924, seus trabalhos científicos adquiriram
fama, a ponto de lotar os auditórios em que proferia conferências. Seus
superiores, preocupados com suas ideias pouco ortodoxas, o forçaram a abandonar
a cadeira do Instituto Católico de Paris e a retornar à China, numa espécie de
exílio involuntário.
Em Tien-Tsin, escreveu “O meio divino”. Em 1929, participou da descoberta de
Sinantropo, e passou a se preocupar com a origem da espécie humana. Começou a
redigir sua obra mais famosa, “O fenômeno humano”.
Retornou
a Paris em 1946. O Colégio da França lhe ofereceu uma cadeira. Ele pediu a Roma
permissão de aceitá-la, bem como de publicar “O fenômeno humano”. Não
conseguiu. No ano anterior havia escrito “O coração da matéria”, autobiografia
intelectual e espiritual.
Teilhard buscou a verdade nas pedras das montanhas e nos esqueletos dos
ancestrais da espécie humana, confiante de que a evidência da verdade é filha
do tempo. Censurado, calado, exilado, não abandonou suas pesquisas e escreveu
convencido de que a posteridade lhe daria razão, tendo tido o cuidado de
confiar os originais a parentes e amigos com liberdade de divulgar sua obra.
Frei
Betto é escritor e assessor de movimentos sociais, autor de “Reinventar a vida”
(Vozes), entre outros livros.
http://www.freibetto.org/>
twitter:@freibetto.
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Maria
Helena Guimarães Pereira
MHP
Agente Literária - Assessoria
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