Por Marcelo
Barros
Essa semana
começou por um feriado comum a toda a América Latina. Nos países de língua
hispânica, o 12 de outubro recorda a chegada dos colonizadores espanhóis ao
continente e o começo da colonização. Os impérios chamaram esse fato “o
encontro de dois mundos”. Para os povos indígenas, invadidos e escravizados
pelos colonizadores, foi mais um violento atentado a todos os direitos humanos
do que uma descoberta ou integração. Fez parte da astúcia dos conquistadores dividir
para melhor governar. Eles colocaram os povos do continente uns contra os
outros e criaram fronteiras para melhor dominá-los. Sempre que surgiu algum
movimento de libertação dos povos explorados, seus líderes compreenderam: o
primeiro passo para isso é a integração e a unidade de todo o continente. Nesse
sentido, no começo do século XIX, Simon Bolívar, o libertador, chamava o
continente: “Nuestra América” e
algumas décadas mais tarde, José Marti, pensador e líder independentista
cubano, a chamava de “Pátria grande”. Apesar de todas as tentativas de
integração, até aqui a ideologia dos impérios e a ambição da elite de cada país
foram mais fortes. Ainda hoje, países do continente disputam linhas de
fronteiras. Há divisões sobre o direito ao
acesso da Bolívia ao mar.
Nesses
dias, a Venezuela enfrenta conflitos dolorosos com vizinhos mais ligados aos
interesses do império do que à preocupação com a unidade continental.
Atualmente,
no Brasil, os movimentos sociais sabem que, além das questões nacionais que dividem
partidários do governo e a oposição ligada aos grandes meios de comunicação,
existe para a direita organizada o fantasma do que eles chamam de bolivarianismo, mesmo sem saber bem do
que estão falando. O governo brasileiro, mesmo nos bons tempos do PT, nunca
assumiu de modo claro, os pressupostos do processo bolivariano que levou a
Bolívia, o Equador e a Venezuela a um novo patamar de distribuição social de
renda, reforma agrária e participação de todos os cidadãos no destino do país.
No entanto, mesmo sem se engajar profundamente no processo, colaborou com os
esforços de integração do comandante Hugo Chávez. Não precisou da mediação do
papa Francisco para entrar em diálogo com o governo cubano e colaborar de
várias maneiras para pôr fim ao bloqueio assassino que isolou Cuba do resto da
“pátria grande”. Por causa dessa política externa, hoje, temos a ALBA (Aliança
Bolivariana dos Povos da América) no lugar dos tratados de livre comércio
impostos pelos Estados Unidos. E a CELAC (Comunidade de Estados Latino-americanos
e Caribenhos) tem mais força e credibilidade do que a velha OEA, ainda dominada
pelos interesses do império. Por tudo isso, o Império norte-americano não
perdoa e paga seus funcionários para desacreditar os governos progressistas
latino-americanos e mesmo os que timidamente como fez o governo brasileiro
ousou sair de sua proteção opressora.
Há 25 anos,
um pequeno mas eficiente instrumento da integração cultural dos povos do
continente tem sido a Agenda Latino-americana. É um livro publicado em forma de
agenda porque relembra o que se comemora a cada dia do ano e deixa um espaço
para que cada pessoa ou grupo planeje sua atividade naquele dia, semana ou mês.
No entanto, a Latino-americana é mais do que uma agenda comum. Ela propõe um
tema para cada ano e convida intelectuais e militantes do mundo inteiro
ligados/as à América Latina para tratar desse assunto a partir de diversos
enfoques e sempre na linha do “ver, julgar e agir”.
A Agenda
Latino-americana se tornou mundial. Sem deixar de ser pensada a partir da
América Latina, procura olhar o seu tema em uma perspectiva que une o
continente e o mundo. Nesse ano, a Latino-americana 2016 tem como tema geral
“Desigualdade e Propriedade”. Como sempre começa por uma carta introdutória,
assinada por Dom Pedro Casaldáliga e José Maria Vigil. E nos apresenta 50
textos de autores/as diferentes que nos fazem refletir e nos convidam a assumir
propostas de esperança e transformação do mundo. Uma novidade é integrar entre
os autores as propostas do papa Francisco, proclamadas no seu 2o
encontro com os/as representantes de movimentos sociais na Bolívia. No Brasil,
a Agenda Latino-americana é editada pela Comissão Dominicana de Justiça e Paz
do Brasil que tem sede em Goiânia.
Agenda
significa um programa para o próximo ano. O das pessoas que seguem uma
espiritualidade ligada à realidade é discernir, em meio a todos os torvelinhos
da política e as tempestades do dia a dia, como testemunhar e colaborar com a
agenda de Deus (paz, justiça e cuidado com a Terra) a se realizar no mundo e
nas nossas vidas.
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