Aeroportos
superlotados e estradas cheias de veículos mostram que, para as festas de
Natal, muitas pessoas viajam, muitos para reencontrar a família ou amigos,
outros para aproveitar as merecidas férias de final de ano. Esse caminho do
Natal que aproxima as pessoas é bom, mesmo se não tem relação com a origem
religiosa da festa. Conforme os
evangelhos, o caminho do Natal foi trilhado pela primeira vez por pastores de
ovelhas que, durante a noite, tiveram a experiência de ver um mensageiro de
Deus e ouvir a notícia do nascimento de Jesus. O relato conta que, assim que os
anjos se foram, os pastores correram para ver o que de fato acontecera. Os
anjos haviam dado um sinal: “vocês encontrarão um menino recém-nascido deitado
em uma manjedoura”. E eles encontraram tudo conforme lhes fora anunciado.
A
primeira coisa que chama a atenção no caminho do Natal é a enorme contradição
entre o esplendor do anúncio dos anjos e a pobreza do que os pastores
encontraram: uma manjedoura e, nela depositado, uma criança pobre. Hoje, o
comércio nos diz que o caminho do Natal é o dos shoppings, das festas de
comilança e consumo. O Evangelho nos convida a retomarmos o caminho dos
pastores e procurar a presença divina no que há de mais humano e, principalmente,
na realidade das pessoas feridas pela pobreza, pela injustiça e pela
marginalidade. Ao insistir que Jesus nasceu como migrante, em uma Belém “onde
não havia lugar para eles na hospedaria”, a tradição não quer apenas sublinhar
que Deus está presente junto aos empobrecidos, mas que está para lutar a seu
favor contra as injustiças do mundo.
Os
antigos pastores da Igreja ensinavam que a cruz de Jesus foi feita com a mesma
madeira do presépio de Belém. Era o seu modo de dizer que, ao deitar na manjedoura,
Jesus já estava assumindo sua condição de pobre, marginal e condenado pelo
poder do mundo. Assim como a cruz, também o presépio não era apenas, como em
nossas casas, apenas um enfeite piedoso. O presépio é um sinal da solidariedade
de Deus conosco; um modo de dizer a toda pessoa injustamente marginalizada:
Deus está do seu lado e vem lutar junto com você por sua libertação.
Essa festa de Natal não é uma repetição da
história de Belém. Os cristãos fazem memória do nascimento de Jesus para
proclamar que a presença divina se manifesta na realidade humana e nos chama a
sermos testemunhas do projeto divino em meio aos conflitos e sofrimentos dos
empobrecidos no mundo atual. Nem todo mundo que ornamenta suas casas com
enfeites de Natal e põem na sala imagens de um presépio fazem verdadeiramente o
caminho do Natal. Não adianta cantar “Noite feliz” e desejar Feliz Natal se sua
ação é contrária à vontade de Deus que é justiça e vida para todos.
Quem
dificulta e embarga a demarcação de terras indígenas, essenciais para a vida e
a sobrevivência das comunidades, deve saber que o seu Natal não é o mesmo do
caminho dos pastores de Belém. Ao ferir a justiça e optar pela ambição humana,
essas pessoas seguem o projeto do rei Herodes, responsável pela morte das
crianças pobres de Belém e não o caminho dos pastores. Hoje, os anjos que nos
anunciam que a Palavra Divina se faz carne e se manifesta em nossa realidade
humana e social são pastores como Dom Pedro Casaldáliga e Dom Tomás Balduíno
que, mesmo com o peso da idade e a saúde frágil, continuam seu cuidado amoroso
e profético em favor dos pequeninos, objeto da predileção divina.
Cada
um/uma de nós tem em sua vida pessoal aspectos que parecem menos nobres e
apresentáveis. Esse lado de nossa vida pode tornar-se como uma manjedoura na
qual a presença divina vem se manifestar solidária e amorosa. Hoje, Jesus
repousa nas palhas de nossa vida para nos conduzir a uma mudança de vida e à transformação
do mundo. Esse é o caminho novo do Natal.
MARCELO BARROS é monge beneditino e escritor. Tem 44 livros publicados, dos
quais “O Espírito vem pelas Águas",
Ed. Rede da Paz e Loyola. Email: irmarcelobarros@uol.com.br
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