Por Maria Clara Bingemer
A palavra “advento” tem origem latina e significa “chegada”, “aproximação”,
“vinda”. No Ano Litúrgico, o Advento é um tempo de preparação para a segunda
maior festa cristã: o Natal do Senhor. Neste tempo, celebramos a grande verdade
da nossa fé, que é o nascimento de Jesus em Belém. Assim, a Igreja
comemora a vinda do Filho de Deus entre os homens (aspecto histórico) e vive a
alegre expectativa de sua segunda vinda d’Ele, em poder e glória, em dia e hora
desconhecidos para nós, mas conhecidos para Deus.
A espiritualidade do Advento é marcada por algumas atitudes básicas: a
preparação para receber Jesus que ad-vém, que se aproxima, a vigilância e a
espera feita de esperança. Será na oração e na vivência da esperança
cristã que essas atitudes poderão ser vividas e cultivadas.
A preparação para receber o Senhor se dá na vivência da conversão e da
ascese. E para isso é necessária a vigilância. É com olhar atento sobre
nós e a realidade que nos cerca que somos convocados a nos empenharmos para
corresponder à ação do Espírito de Deus que quer restaurar todas as coisas.
Assim, nosso relacionamento com nosso corpo e nossos afetos, com
nossos familiares e pessoas íntimas, nossa participação na vida eclesial e
social devem estar no foco de nossa atenção.
Para receber o Deus feito criança é necessária uma renovação interior profunda
e radical, deixando para trás o que foi ficando velho e desgastado em nossa
vida e abrindo-nos para acolher o que é novo e tem cheiro de pão saído do forno,
de livro recém impresso, de bebê saído do banho. Quando a eternidade
invade o tempo, a divindade impregna a humanidade, o infinito perpassa a
finitude, nada mais será como antes, porque tudo se fez novo e tudo é possível.
Para receber o Menino Jesus que vem e chega no Natal é igualmente
necessário ter a atitude da espera. E para isso duas figuras bíblicas
podem ajudar. Uma é João Batista, o profeta de olhos de lince e língua de
fogo, que esperava sem desfalecer a salvação de Deus, mas sabia que para isso
era preciso passar pelo tempo das dores, quando o machado fincado na raiz da
árvore começaria seu trabalho purificador. É o mesmo João que reconhece e
aponta o Cordeiro de Deus e o indica a seus discípulos, João que tinha o
olhar purificado por Deus e sabia reconhecer o advento definitivo que estava
por acontecer ali mesmo, diante de seus olhos.
Assim também João é o que não tem medo de falar do que lhe enche o
coração. Há tanto espera. Espera e crê. E agora vê sua espera
atendida e cumulada, preenchida pelo advento do esperado das nações. Reconhece
o Messias e sua língua de profeta, que denuncia injustiças, também anuncia
aquele que chega e muda o destino de todo o povo e da humanidade em seu
conjunto. João Batista, o vigilante, é figura da vigilância que deve ser
a nossa neste tempo que agora vivemos.
A outra figura é Maria, a jovem de Nazaré que recebe o anúncio do Advento que
começa a acontecer em seu corpo e mudará toda a sua vida. E que
acreditando e dizendo que sim, espera. Espera diligente, não se
comprazendo em sua própria gravidez, mas parte para ajudar a prima, que em sua
velhice concebeu quando já não seria mais possível. Espera atenta que
move no fundo de seu coração as coisas que lhe são ditas da parte do
Senhor. Espera alegre, que crê que aquele do qual seu ventre está repleto
encherá a terra inteira com sua bênção e seu amor infinito.
Maria não se contém e canta. Canta louvando a Deus pelas maravilhas que
nela operou. Canta proclamando que a justiça tão esperada por seu povo já
se encontra presente em seu ventre grávido do menino que se chamará Jesus.
Canta anunciando que toda a espera de Israel finalmente culminou no evento
salvador da vinda do Menino. E alegra-se porque o fruto de seu
ventre será fruto de salvação para o mundo inteiro.
Aquilo que é menor do que tudo que existe, a fragilidade mais absoluta
que se possa imaginar - uma criança que se forma na vulnerabilidade do
corpo de uma mulher - carrega em si a salvação que todos desejam e
esperam. Seu Advento é ocasião de vida em abundância para todos os que
vivem essa espera vigilante e amorosa, essa abertura de corpo e espírito para a
fecundação que Deus realiza com sua graça sobre toda carne.
A teóloga é autora de “Ser cristão hoje"
(Ave Maria).
--
Maria Clara Bingemer é Professora do Departamento de Teologia
da PUC-Rio, teóloga e autora de "O mistério e o mundo" (Editora
Rocco)
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