Por Frei Betto
A fé é a adesão da inteligência ao mistério, a algo ou alguém que se pode sentir sem,
no entanto, provar. Não é irracional, é suprarracional.
Em toda relação amorosa a fé é o vínculo que une. Não há equação que convença
João de que seu amor por Maria é cientificamente equivocado. Ou vice-versa. Um
confia (com fé) no outro.
Marx, Freud e tantos pensadores tentaram nos convencer de que a fé é uma ilusão
ou alienação. Projeta-se no Céu o que se desejaria desfrutar na Terra. Nenhum
dos dois conheceu a fé libertadora manifestada, hoje, pelo papa Francisco.
O Iluminismo confinou as convicções na razão e, assim, desencantou o mundo,
como frisou Max Weber. “A razão é a imperfeição da inteligência”, proclamava
meu confrade Tomás de Aquino.
Há muitas qualidades de fé. Paulo Patarra, militante comunista e meu chefe na
revista Realidade, se queixava de que Deus não o havia provido de fé. Professava
o salmo às avessas.
Alberto Schweitzer, ao duvidar da divindade de Jesus, abraçou radicalmente a
ética do Nazareno e abandonou a filosofia, a teologia e a música para cuidar,
na África, de doentes pobres.
Jung, na contramão de Freud, afirmava “não preciso acreditar. Eu sei.” Ecoou a
profissão de fé de Jó, o mais enigmático crente de toda a Bíblia: “Antes
eu só te conhecia de ouvir falar, mas agora meus olhos te viram.”
Jó foi desafiado a mostrar sua fé em um Deus que o privava do que ele mais
amava. Mergulhou na “noite escura”, mais tarde cantada por João da Cruz. E
confiou (com fé), até que a aurora irrompeu.
O amálgama entre Ocidente e Cristianismo banalizou a opção de fé. Rara a Igreja
que proporciona a seus fiéis educação da fé conforme as idades infantil, jovem
e adulta. Muitos cristãos adultos vestem a calça curta da fé. Guardam a mesma
fé da catequese infantil.
Outros abdicam do senso crítico para aderir, como cordeiros a serem tosquiados,
à palavra do bispo ou pastor. Confundem autoridade e verdade.
É triste constatar que muitos políticos corruptos, e profissionais indiferentes
aos direitos dos pobres, são ex-alunos de colégios e Universidades católicos. É
de se perguntar: escolas confessionais ou meras empresas de formação de mão de
obra qualificada para o mercado? Qual a qualidade da evangelização feita por
instituições cristãs?
Fé em Jesus é fácil. Embora poucos se interessem em estudar os Evangelhos e o
contexto em que viveu Jesus para melhor entender a sua proposta.
O desafio é ter a fé de Jesus. Fé que identificava Deus como Pai amoroso, reconhecia-O
na face dos pobres, denunciava fundamentalistas e opressores, centralizava-se
na justiça e no amor.
Será que nós, cristãos, cremos no mesmo Deus de Jesus?
Frei Betto é escritor,
autor de “Um Deus muito humano – um novo olhar sobre Jesus” (Fontanar), entre
outros livros.
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twitter:@freibetto.
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