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terça-feira, 27 de agosto de 2013

Por um novo pacto das catacumbas




Por Marcelo Barros


A recente visita do papa Francisco ao Brasil recordou à Igreja Católica a sua missão de dialogar com a humanidade, oferecer às pessoas o testemunho de que Deus é amor e inclusão e não um senhor todo poderoso, frio e amigo apenas dos seus amigos. Nessa semana, no Brasil, as comunidades cristãs e as pessoas que buscam a justiça lembram com saudade de três bispos que exerceram sua missão de modo profético e nos deixaram no mês de agosto. No dia 27, celebramos o aniversário da partida de Dom Hélder Câmara (1999). Também, no mesmo dia, partiu Dom Luciano Mendes de Almeida (2006). Poucos dias antes, lembrávamos Dom Antônio Fragoso, outro profeta que nos deixou em agosto (12/08/2006). A esses bispos, não teria sido necessário o papa Francisco pedir que fossem à periferia e tornassem a Igreja pobre e dos pobres. Eles já viviam isso por convicção de fé e por terem sido confirmados nesse caminho pelo Concílio Vaticano II. 

Dom Luciano se tornou bispo depois do Concílio, mas Dom Hélder e Dom Fragoso lideraram um grupo de mais de 40 bispos que, no dia 16 de novembro de 1965, se reuniu em Roma e assinou um compromisso de viver como pobres e ajudar a Igreja a se inserir no meio dos pobres como uma Igreja serva, pobre e missionária. Como a reunião foi nas Catacumbas de Domitila, esse documento se chamou “Pacto das Catacumbas”. Nesses dias, pastores e fiéis da Itália retomaram esse texto e o assinaram, como proposta a bispos, padres, religiosos/as e fieis que se guiem por esse caminho da simplicidade e comunhão com os mais empobrecidos.  No Brasil, três bispos eméritos, Dom Tomás Balduíno, Dom José Maria Pires e Dom Pedro Casaldáliga, escreveram uma carta aberta a todos os bispos brasileiros recordando os princípios fundamentais da renovação eclesial do Concílio Vaticano II: o caráter próprio e de Igreja de cada diocese, a responsabilidade de todos os bispos junto com o papa pela Igreja Universal e a necessidade da Igreja retomar o diálogo amoroso com a humanidade, que o papa João XXIII iniciou.  

De fato, em 1965, os bispos assinaram o pacto das catacumbas para ajudar a Igreja a se converter e se transformar em uma Igreja pobre e servidora de todos. Mais tarde, na América Latina, a Teologia da Libertação nos ajudou a ir além disso. No nosso continente, como na África, a Igreja tem uma dívida histórica, já que chegou ao continente através dos conquistadores e, apesar da resistência de muitos missionários, foi conivente com a escravidão e corresponsável da perseguição e condenação às culturas indígenas e afrodescendentes. 

Então, é ótimo que, como pede o pacto das catacumbas, bispos e padres renunciem a todo sinal de pompa e poder e se tornem pobres com os pobres. Entretanto, é preciso ir além: precisamos estar junto dos pobres contra a pobreza injusta que não é do agrado de Deus e é responsável por muitas mortes e muitos sofrimentos na humanidade. Isso significa um passo que pastores como Dom Hélder Câmara e muitos bispos do seu tempo deram: superar preconceitos e dialogar com a parte da humanidade que procura a transformação social e tem fome e sede de justiça e de um mundo mais igualitário e livre. 

No passado, muitas vezes, a ideia de revolução esteve ligada com ódio, violência e luta armada. Hoje, precisamos resgatar a meta de uma revolução social e política baseada em valores humanos e em uma nova ética. Essa revolução radicaliza a democracia, toma a educação como tarefa prioritária para transformar o mundo e valoriza as culturas indígenas e negras. Na América Latina, essa é a proposta do novo bolivarianismo. Para quem é cristão, lembra o que escreveu Paulo aos romanos: “Não se conformem com esse mundo, mas o transformem pela renovação de suas mentes” (Rm 12, 1).


 Marcelo Barros , monge beneditino, teólogo e escritor. Tem 44 livros publicados.
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