por Frei Betto
João, santo cuja festa se celebra a 24 de junho, era primo de Jesus, filho de
Zacarias, sacerdote do Templo de Jerusalém, e de Isabel, prima de Maria. Como o
nascimento de Jesus se comemora a 25 de dezembro, por ter nascido seis meses
depois de seu primo, João tem a sua festa natalícia a 24 de junho.
De fato, as duas festas decorrem das festividades pagãs, apropriadas pela
Igreja, dos solstícios de verão e inverno no hemisfério norte. Solstício vem do
latimsol + sistere, “que não se mexe”. É quando o sol, medida a sua
latitude a partir da linha do equador, se encontra em sua maior declinação em
relação à Terra. Então, neste dia, no hemisfério norte o dia é o mais longo do
ano e, a noite, a mais curta. No hemisfério sul ocorre o contrário.
Os solstícios não ocorrem sempre no mesmo dia. Variam conforme o ano. Mas quase
sempre entre os dias 20 e 25 de junho e dezembro. Por isso, os dias 21 de junho
e 21 de dezembro marcam as mudanças de estações. No hemisfério sul, do outono
para o inverno, em junho; e da primavera para o verão, em dezembro.
Há indícios de que João, decidido a não seguir a carreira sacerdotal do pai no
Templo de Jerusalém, preferiu unir-se aos monges essênios de Qumran, junto ao
Mar Morto. Talvez por discordar do elitismo espiritual dos essênios, que se
consideravam os prediletos de Deus, João trocou a vida monástica pela pregação
ambulante às margens do rio Jordão. Ali formou a sua própria comunidade, selada
pelo batismo cuja espiritualidade se centrava na prática da justiça. Daí passou
a ser conhecido como João Batista (aquele que batiza). Jesus aderiu à
comunidade de seu primo e foi por ele batizado nas águas do Jordão.
João denunciou a vida corrupta e devassa do governador da Galileia, Herodes
Antipas, que se juntara à mulher de seu irmão, Felipe. Preso, foi degolado a
pedido de Salomé, enteada do governador, orientada pelo ódio vingativo de sua
mãe, Herodíades. Em plena festa palaciana, a cabeça de João foi exibida em uma
bandeja.
A atuação de Jesus só teve início após o martírio de João. É como se o primo
firmasse posição para demonstrar a Herodes Antipas, a quem chamava de “raposa”,
que a luta continua... Seus primeiros discípulos, André e Simão, o cananeu,
vieram do grupo de João.
Da comunidade dos doze apóstolos, o mais jovem também se chamava João, autor do
quarto evangelho. Ele abre o seu relato em homenagem ao xará, a quem chama de
“enviado de Deus para ser testemunha da luz.”
A festa de São João é marcada, no hemisfério sul, pela fogueira e os fogos de
artifício, que simbolizam a “luz do mundo” e o fato de a luz (Jesus) vencer as
trevas (da noite mais longa do ano).
Desde o século XVIII, a festa é comemorada no Brasil com adereços que os
portugueses trouxeram da Ásia, especialmente da China, como balões,
bandeirinhas e fogos de artifício. Já a dança da quadrilha (quadrille, dança de
quatro casais), aqui em trajes caipiras, veio da Holanda e recebeu influências
portuguesa e francesa. A marcação, hoje abrasileirada, lembra foneticamente o francês:
anarriê (en arièrre, retornar); anavantu (tout em avance, todos
para frente).
Neste ano, todos nós, devotos de São João, devemos pedir muita luz para o
Brasil, onde muitas cabeças vêm sendo degoladas pela corrupção e os desmandos
administrativos.
Frei Betto é escritor,
autor de “Fidel e a religião” (Fontanar, 2016), entre outros livros.
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