Frei Betto
Todos os chamados “candidatos de centro” são, sem exceção, de direita.
Defendem as mesmas pautas de Bolsonaro. Mudam apenas os métodos e a retórica.
Como no mar, toda onda
começa pela sobreposição de gotas empurradas pelo vento. “Uma mentira repetida
mil vezes torna-se verdade”, dizia Goebbels. É o que vimos nas eleições de
2018. Fake news em profusão e as tramoias da Lava-Jato
impediram Lula de ser candidato e ainda suscitaram o moralismo antipetista.
Nessa onda surfou Bolsonaro e arrebatou a faixa presidencial.
Dois anos
de governo foram suficientes para o stablishment se dar conta
de que apostou suas fichas no cavalo errado. Nada neste governo dá certo,
exceto as sucessivas obras de demolição da saúde, da educação, da cultura, dos
direitos humanos, das políticas ambientais e da segurança pública. A pandemia
ganhou no Brasil dimensão genocida; a economia retrocede; a inflação reaparece;
o desemprego cresce; a desigualdade se agrava; e a violência explode.
O Brasil
virou o patinho feio da conjuntura internacional. Alvo de chacotas e desprezo,
a política exterior brasileira se atrelou ao trumpismo e, agora, órfã, está
condenada a se apegar aos próprios fantasmas, da natureza comunista do
coronavírus ao terraplanismo.
De olho
nas eleições presidenciais de 2022, a elite brasileira afixa por toda parte o
cartaz “Procura-se um candidato”. Até agora apenas dois se postulam com
certeza, mas nenhum deles interessa aos donos e beneficiários do cassino
financeiro: Bolsonaro e Ciro Gomes. Busca-se, então, um candidato “de centro”,
para fugir aos “extremismos” do capitão e do peão (Lula).
Súbito, o
centro se inflou de possíveis candidatos: Moro, Huck, Doria, Maia, e sabe-se lá
quantos mais aparecerão para repetir o que, certa vez, me disse um arcebispo:
“Não sou de esquerda nem de direita, sou do alto...”
Ora,
todos os chamados “candidatos de centro” são, sem exceção, de direita. Defendem
as mesmas pautas de Bolsonaro. Mudam apenas os métodos e a retórica. Todos
naturalizam a desigualdade social e rejeitam uma reforma tributária que obrigue
os ricos a pagar mais impostos. Todos defendem os privilégios do capital
privado sobre os direitos coletivos. Todos são favoráveis à criminalização dos
movimentos populares e aprovam a PEC que congelou por 20 anos os orçamentos da
Saúde e da Educação. Todos apoiam políticas sociais paliativas e são contrários
a qualquer reforma estrutural capaz de mudar este país para melhor, como a
reforma agrária.
É hora de
denunciar essa falácia! Para a elite, o ator principal desse governo exagera no
desempenho ao ficar indiferente à pandemia, promover queimadas e desmatamento,
fazer apologia da tortura e do livre comércio de armas. É preciso substituí-lo
por alguém mais comedido, perfumado, dotado de bons modos. Alguém que efetive a
privatização do patrimônio público e tenha mais habilidade na relação com o
nosso maior parceiro comercial, a China.
Enfim, é
preciso trocar o ator para que a encenação prossiga com o mesmo roteiro e
assegure o final feliz do andar de cima, e as desgraças do andar de baixo. Como
diz o personagem de Lampedusa, “é preciso mudar, para que tudo permaneça como
está”.
Frei Betto é escritor, autor de “O diabo na corte –
uma leitura crítica do Brasil atual” (Cortez), entre outros
livros. Livraria virtual: freibetto.org
Frei Betto é autor de 69 livros, editados no Brasil
e no exterior. Você poderá adquiri-los com desconto na Livraria Virtual – www.freibetto.org Ali os
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correio.
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