FREI ALOÍSIO FRAGOSO
O5/02/2120
Foge ao nosso entendimento racional esse
espetáculo de desobediência civil em massa, frente aos decretos de isolamento e
uso de máscaras, em defesa da vida.
Algo maior do que um simples
aventureirismo ou a insanidade deve estar por trás de um tal comportamento.
Para a multidão dos que sobrevivem na
miséria, a distância das fronteiras entre vida e morte é muito curta e vale a
pena correr este risco em troca de uns poucos prazeres. Eles são vítimas
inconscientes da opressão; não adiantou cantar-lhes um velho refrão das
"Comunidades de Base":
"eu acredito que o
mundo será melhor quando o menor que padece acreditar no menor".
No polo oposto, os que acumulam riquezas
não admitem qualquer boicote ao seu propósito de esbanjá-las. Acham-se "imortais".
Se o dinheiro paga tudo, tem que pagar também sua imunidade. Caso haja vítimas
e enterros, fazer o quê? A visão dos mortos não deve impedir seu banquete de
Babete.
Não haverá aí uma indisfarçável filosofia
de vida? Jamais lhes passa pela cabeça a perspectiva de um outro mundo diverso
deste mundo real onde eles se sentem vivos. Em sua visão embotada, este mundo
se assemelha a um objeto de consumo que a gente adquire e abre e descobre um
defeito de fabricação, mas não tem como mudá-lo, pois na embalagem está
escrito: "se abrir não troca".
Então é preciso olhar esta humanidade tal
qual, como a medida de todas as coisas. Nada de se comover com anseios e
direitos dos demais homens e mulheres que constituem esta humanidade. Menos
ainda deixar-se impressionar pela verdade de que vivemos todos sob um modelo de humanidade
imposto pelo Sistema dominante.
O que eles procuram de fato é o prazer
hedonista, é gozar, gozar sem nenhum objetivo, gozar sem medo, sem culpa, sem
oposição, sem ter que dar conta de seus atos.
Por isso não admitem
sequer o contato com outra possibilidade de mundo. Detestam discursos
revolucionários, Projetos políticos que desestabilizam o "status quo"
e homilias que pregam a conversão de vida.
Não é, pois, de esperar que este pequeno
rebanho de gozadores alguma vez se pergunte: "Que mundo é este que
deixaram para a gente"? "Que mundo deixaremos para as gerações
futuras?" Acham-se confinados em um determinado tipo de ser e viver
humanamente, e este é o destino irrevogável de todos, e este é o melhor dos
mundos.
Para governá-lo, ninguém melhor do que
alguém que mais se pareça com um dono de circo ou um tangedor de gado. Alguém
que garanta o conservadorismo, o sectarismo e o moralismo, três máscaras da
hipocrisia, três disfarces do individualismo mais crasso e obtuso. Se ao Chefe
faltar competência, inteligência, moral, sensibilidade, decoro, vergonha, pouco
importa, a máquina funciona, pois ela se move por cifrões inesgotáveis e é
perita em cooptar outros Poderes Constituídos.
Aí chega a pandemia do coronavirus e
ameaça desmontar esse castelo de alucinados. Que fazer? - Negar as evidências!
É hora do Chefe cumprir seu papel . Ele o cumpre bem: "virus? Que virus? A
pandemia não existe, ela não pode existir, ela não deve existir, é preciso que
ela não exista, bla, bla, bla..."
E aí, cristãos de todo o planeta, haverá,
neste mundo, espaços possíveis para pousar nossa Esperança?
Certa vez perguntaram a Buda se ele se
considerava um deus ou só um grande homem. Ele respondeu: "nem um nem
outro; sou apenas alguém que acordou quando todos estavam dormindo"
(Tentaremos encontrar uma resposta na
próxima Reflexão).
Frei Aloísio Fragoso é frade franciscano, coordenador da
Tenda da Fé e escritor.
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